14 de novembro de 2018
A defesa do 'retorno' do PT às bases precisa necessariamente explicitar a que 'bases' se refere.
Em 1989 o partido tinha como eleitor 'padrão' o trabalhador especializado dos grandes centros urbanos. Metalúrgicos e bancários, por exemplo. CUT e MST, tinham, respectivamente, 6 e 5 anos de existência, eram recém-nascidos. Existiam e atuavam, também, na época as Comunidades Eclesiais de Base, que não eram petistas em sentido estrito. Acrescente-se aí as juventudes estudantis e os intelectuais formadores de opinião. Era esse perfil complexo que puxava os proverbiais 30% de fidelizados cada vez que se abriam as urnas.
Na virada do século XXI os Fóruns Mundiais acrescentaram ao PT marcas importantes que associariam sua imagem à dos chamados movimentos populares que ganharam força a partir da Constituição de 1988 e da chegada do Terceiro Setor. Claro que essa configuração fez crescer ainda mais o PT, que também teve tempo para ganhar e administrar importantes capitais. Ao mesmo tempo, CUT e MST evoluíam a passos largos.
Todos esses grupos de militância estiveram presentes na fabulosa festa da posse de Lula em janeiro de 2003. Mas, antes disso, o PT havia sido derrotado por Fernando Collor e duas vezes por Fernando Henrique Cardoso (em primeiro turno).
Foi preciso a 'Carta aos Brasileiros' para que o projeto dito 'de esquerda' durante duas décadas fosse aceito majoritariamente pelos brasileiros em disputas presidenciais. Antes disso, estava claro, as bases não eram suficientes para levar Lula, nem o PT, ao Planalto.
Lula, como se sabe, foi reeleito com certa folga e saiu da presidência com mais de 80% de aprovação. Seu 'poste', Dilma Rousseff, nadou de braçada todo o primeiro mandato. Na crista de uma onda benfazeja na economia? Sem dúvida. Mas também operacionalizando um largo arco de alianças que, fundamentalmente, consistia em garantir os votos do eleitorado conservador liberal, o chamado 'centro' do espectro. A conta é simples. 30% dos eleitores são fiéis ao PT, 30% querem ver o PT e todos os petistas pendurados pelo pescoço e 30% formam um grupo a ser permanentemente disputado.
Não há trabalho de base a ser feito em relação a esse último pedaço do eleitorado. Trata-se de cidadãos de perfil conservador e que já têm seus referenciais políticos e sociais definidos. Esse grupo vai à Igreja. Mas não necessariamente 'obedece' ao pastor. Pode votar no PT, mas se identifica mais com o PSDB. Ao articular alianças de amplo alcance, Lula tirou votos dos tucanos que, vendo-se em queda acelerada, abraçaram a Direita. O resultado é que foram tragados por ela ao pretenderem dirigir um golpe para o qual não tiveram coragem de dar o rosto.
Se, 'voltar às bases' significa fortalecer os movimentos sociais e implementar ações que remetem às Comunidades Eclesiais de Base para atuar num campo de oposição que entende a disputa democrática para além das eleições (como propõe, por exemplo, o professor Luiz Felipe Miguel), a ideia de 'retorno' se aplica e pode ser muito oportuna.
Se o assunto for ganhar a presidência em 2022, estaremos falando de uma base que sempre deu consistência ao projeto do partido, mas que não decide eleição. A articulação que levou Lula e Dilma quatro vezes sucessivas ao governo dava prioridade a concorrer em condições de vitória e, para isso, precisava se congregar com forças sociais e eleitorais que podem ser, e muitas vezes são, estranhas à ideologia do PT.
O que há, e isso parece ainda não estar claro nas análises pós-tsunami bolsonarista, é uma nova base, essa sim, eleitoral, e não ideológica, surgida nos estados beneficiados pelas políticas de valorização dos salários, distribuição de renda e investimentos no setor produtivo e na infra-estrutura. Não se trata de 'retornar' e sim de consolidar essa base. E também não tem nada a ver com 'educação política'. A vida dessas populações se transformou no período Lula e Dilma. Essa transformação já resultou em vitórias acachapantes dos candidatos do campo democrático e popular. O assunto, no caso, é: o que será preciso fazer para que esse ciclo virtuoso não se interrompa? Ou em outras palavras, quem, eleito, pode se colocar a favor dessa nova realidade que o reacionarismo brasileiro quer destruir?
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