Tuesday, July 31, 2007

Caos

FOI LANÇADO no final da semana passada o Movimento Cívico pelo Direito dos Brasileiros, liderado pela Ordem dos Advogados do Brasil - Seccional São Paulo e com a participação de diversas entidades e lideranças da sociedade civil e chamado de "Cansei". Foi inicialmente motivado pela indignação em relação ao acidente aéreo em Congonhas e tomou forma de um protesto contra alguns aspectos do caos atual: balas perdidas, impostos, empresários corruptores.
O movimento, segundo seus organizadores, é "em prol da cidadania" e sem "cunho político". Um movimento "em prol da cidadania" pode ser até apartidário, mas é sempre um movimento político. A começar pelos aspectos que escolhe. Não se diz, por exemplo, "cansei de ver cidadãs e cidadãos morrendo de fome nas ruas do meu país". Indignação é um sentimento fundamental para tornar viva a crítica a todo tipo de injustiça. Mas é preciso ir além do mero sentimento e enfrentar o duro fato de quem critica também colabora para manter a injustiça, também é parte do próprio problema.
Mais que isso, falar em cidadania junto com "civismo" não tem nada de neutro. Inclui um conjunto de valores muito determinado. Em entrevista ao jornal "O Estado de S. Paulo", o empresário Alencar Burti, presidente da Associação Comercial de São Paulo e um dos idealizadores do movimento, declarou: "Há um desencanto, uma tristeza grande, e quando isso prevalece sempre pode surgir um aventureiro para levar o país a um destino muito ruim, sem rumo". E explicitou o "rumo" em termos do tempo em que era jovem, em um bairro da cidade de São Paulo: "Era um tempo em que não se prescindia da honra. Aquele que assumia uma conduta incompatível a nossa rua excluía prontamente. Temos que recuperar esses valores, do contrato de honra, o tempo saudável do olho no olho que caiu em desuso". Lidar com o caos atual não é fácil.
E agir politicamente contra essa situação é urgente. Mas fazer isso com recurso a um conjunto de valores que explicitamente exclui condutas consideradas incompatíveis com a "nossa rua" não colabora para a promoção da cidadania. Reagir ao caos exige aprofundar a democracia. Exige mais e mais respeito e reconhecimento a todas as formas de vida. Não é com valores e civismo que se vai conseguir isso. Uma volta a valores tradicionais, a uma "ordem" que teria sido perdida só vai substituir o caos pela repressão e pela coerção contra quem não compartilha dessa maneira de viver e de pensar. Quanto maior o caos, maior tem de ser a tolerância e a lucidez das reações para superá-lo.

MARCOS NOBRE escreve às terças-feiras nesta coluna. Folha - Opinião

Durante o terceiro dia de Fashion Rio, a cantora Kelly Key fez sua adesão ao Movimento Quero Mais Brasil. O Movimento, criado há dez meses e que já conta com mais de um milhão de adesões e 321 entidades associadas, é organizado pela sociedade civil com o objetivo de cobrar dos governos mais transparência na gestão e na prestação de contas dos gastos públicos.

Kelly Key fez sua adesão ao Movimento no lounge da ABIT no Fashion Rio. A cantora é mais uma artista que decidiu apoiar o Quero Mais Brasil. Ela se junta a Elba Ramalho, Sandy, Junior Lima, Daniela Mercury, Carlinhos Brown, entre outros, na busca pela mobilização da sociedade para o desenvolvimento do país.

Cansei de "basta!"
O ODOR EXALADO pelo movimento "Cansei", ainda que nem todos os seus fundadores tenham propósitos precisamente iguais, é típico do golpismo que sempre foi a vocação política mais à vista na riqueza, não importa se cansada ou não. A fonte de onde surge não lhe nega a natureza pressentida: um escritório de negócios em São Paulo, tal como se identificaria nos primórdios de todos os golpes e tentativas de golpe desde 1944/1945, pelo menos.
Também denominada "Movimento Cívico pelo Direito dos Brasileiros" -batismo que os padrinhos relegaram, por considerarem o apelido "Cansei" mais representativo dos seus propósitos- o que a iniciativa sugere, de fato, é uma interrogação.
O que mais deseja a riqueza brasileira, além das condições inigualáveis que o governo Lula lhe proporcionou? O fim da inflação, o emudecimento do sindicalismo e das reivindicações sociais; concessões transgênicas para todos os tipos de grandes empresas e negócios, Bolsa farta e imposto baixinho ou a zero; e, sobretudo, a transferência gratuita de um oceano de dinheiro dos cofres públicos para os da riqueza privada, por intermédio dos juros recordistas concedidos pelo próprio governo aos títulos de sua emissão. Ainda não basta?
O que deseja a riqueza não pode ser a correção das deformidades socioeconômicas, institucionais e políticas que refreiam o Brasil, enquanto países do seu aparente status desenvolvem-se a níveis exuberantes. É da não-correção que vem grande parte das facilidades pelas quais a riqueza se multiplica sem cessar: a fraqueza ética do Congresso, a corrupção administrativa que só tem o corrupto e não o corruptor, as eleições movidas a marketing endinheirado, e por aí.
Além disso, nunca se viu a riqueza movendo-se, de fato, por correções e reformas a serviço do interesse do país. Os seus lobbies e outros meios só se movem, historicamente, por alterações que privilegiem os interesses da própria riqueza privada. Assim é a história parlamentar e administrativa do Brasil, para dizer o mínimo, do último meio século.
O governo Lula deu e dá à riqueza privada a situação que a ela deu o "milagre econômico" da ditadura, porém, agora sem os inconvenientes produzidos pela força. A quem vive no Brasil em nível de primeiríssimo mundo, conviria, portanto, demonstrar um pouco mais de compostura. Se não para aparentar recato que lhe falte, por um grão a mais de esperteza.
"Cansei" -e daí? Vai fazer ou, pelo menos, propõe o quê, de objetivo, prático e necessário? Disse um dos "cansados": "Queremos despertar em cada indivíduo o que ele pode fazer para mudar o país". Pois façam isso no seu próprio movimento. Sem que, para tanto, o seu alegado cansaço exale sentidos que, intencionais ou não, negados ou não, vão até onde não devem.

JANIO DE FREITAS - Folha de São Paulo

Contra "Cansei", CUT lança "Cansamos"

Como o Palácio do Planalto desejava, começaram a aparecer reações "espontâneas" contra o Movimento Cívico pelo Direito dos Brasileiros, o já conhecido "Cansei", -que se uniu a outros grupos no em ato de protesto no último fim de semana, em São Paulo. Ontem, o presidente da CUT (Central Única dos Trabalhadores), Artur Henrique, disparou e-mail para várias centrais sindicais propondo a realização da campanha "Cansamos!". É uma reação direta ao "Cansei".
O "Cansei" se diz apolítico, mas seus idealizadores são identificados com o PSDB. Já a CUT é a mais tradicional central sindical petista. O "Cansamos!" também pretende ser apartidário, mas usará claramente o mote dos adversários. "A campanha será veiculada em nossas páginas de internet, em jornais impressos e programas de rádio de que dispomos", diz Artur Henrique no e-mail.
O "Cansei" está na pauta da reunião de hoje da Executiva Nacional do PT. "Temos que ter tranqüilidade, não aceitar esse tipo de provocação e nem alavancar esse movimento cujo patrono deve ser a Haddock Lobo ou a Oscar Freire", diz Ricardo Berzoini, presidente do PT, referindo-se a ruas de bairro nobre da capital paulista. Luiz Flávio Borges D'Urso, presidente da OAB-SP, que oficialmente lidera o "Cansei", disse não crer num movimento contrário da CUT. "Não vejo quem não se oponha à corrupção, bala perdida, imposto alto, criança na rua. Só se for a favor de tudo isso. Como não acredito nessa hipótese, eles vêm engrossar a fileira, comungar dos nossos ideais a favor do Brasil."
Não há consenso entre as centrais contatadas pela CUT a respeito de levar a estratégia adiante. A Folha recebeu cópia do e-mail de um sindicalista contrário à proposta. Os reticentes acreditam que o "Cansamos!" pode dar fôlego ao "Cansei"- que, na avaliação de algumas entidades, não terá força para continuar, pois suas bases na sociedade seriam difusas e desorganizadas.
No e-mail do presidente da CUT, o texto começa com "CANSAMOS!" em letras maiúsculas, seguido de complementos como: "do trabalho escravo", "da sonegação de impostos", "da mídia que não aborda os movimentos sociais" e "da mídia que criminaliza as lutas populares". Ao final, uma conclusão: "Apesar de tantas razões, não temos tempo para sentir cansaço. Continuaremos lutando. Precisamos de sua participação. Filie-se ao seu sindicato!". Artur Henrique espera a adesão de outras centrais para saber "se a campanha vai mesmo para a rua".

FERNANDO RODRIGUES - DA SUCURSAL DE BRASÍLIA - Folha de São Paulo.

Esta semana foi lançado o projeto "Quero + Brasil", projeto que visa obter apoio popular para exigir dos políticos algumas das reformas de que o nosso país precisa.
Os meios de comunicação estão dispostos a apoiar este movimento, e pressão dos mesmos sobre os políticos (que só se fará se nós nos manifestarmos).
Para "contabilizar" estas manifestações, foram oferecidos 3 meios:

(a) um número de telefone local : 4002-8988;

(b) um site *www.queromaisbrasil.com.br* e

(c) assinaturas nas lojas do grande varejo que começarão em breve.

Se este movimento ganhar força, teremos uma ótima chance de fazer uma pressão organizada por mudanças.
Apoiam o movimento 150 entidades das mais variadas (como OAB, FIESP, Força SIndical,etc.) e o conselho é formado por pessoas como Bernardinho, Viviane Senna, Jorge Gerdau, etc.
No entanto, todo o trabalho feito até agora, e todo o apoio que a mídia se comprometeu a dar, só será transformado em pressão positiva se o povo participar. Por isto, peço a você que:

1. Se manifeste AGORA (ligue para 4002-8988 ou acesse o site:

www.queromaisbrasil.com.br < http://www.queromaisbrasil.com.br> e deixe sua mensagem AGORA;

2. Envie este email para pelo menos 10 amigos seus e peça que eles façam o mesmo AGORA.

Se tivermos milhões de manifestações vai dar certo. Faça isto agora. Você não perde nada e aumenta as chances deste movimento dar certo.

Vamos nos dar as mãos para passar este país a limpo. Tem gente séria por trás, e a sua participação é importante .

Por e-mail em 31/07/2007

Monday, July 30, 2007

Creio que em cada época se chega a momentos de crise, como as descritas por Nietzsche na Segunda consideração extemporânea, sobre os malefícios dos estudos históricos. O passado nos condiciona, nos oprime, nos ameaça. A vanguarda histórica (mas aqui eu entenderia vanguarda também como categoria meta-histórica) procura ajustar contas com o passado. "Abaixo o luar", slogan futurista é um programa típico de toda vanguarda, basta colocar outra coisa no lugar de luar. A vanguarda destrói o passado, desfigura-o: as Demoiselles d'Avignon representam o gesto típico da vanguarda; depois, a vanguarda vai mais além, destrói a figura e, em seguida, a anula, chegando ao abstrato, ao informal, à tela branca, à tela rasgada, à tela queimada [...].
Mas chega um momento em que a vanguarda [...] não pode ir mais além, porque já produziu uma metalinguagem que fala de seus textos impossíveis (a arte conceptual). A resposta [...] consiste em reconhecer que o passado, já que não pode ser destruído porque sua destruição leva ao silêncio, deve ser revisitado: com ironia, de maneira não inocente. Penso [nesta] atitude como a de um homem que ama uma mulher muito culta e sabe que não pode dizer-lhe "eu te amo desesperadamente" porque sabe que ela sabe (e ela sabe que ele sabe) que esta frase já foi escrita por Liala.
Entretanto, existe uma solução. Ele poderá dizer: "Como diria Liala, eu te amo, desesperadamente". A essa altura, tendo evitado a falsa inocência, tendo dito claramente que não se pode mais falar de maneira inocente, ele terá dito à mulher o que queria dizer: que a ama, mas que a ama em uma época de inocência perdida. Se a mulher entrar no jogo, terá igualmente recebido uma declaração de amor. Nenhum dos dois interlocutores se sentirá inocente, ambos terão aceito o desafio do passado, do já dito que não se pode eliminar, ambos jogarão conscientemente e com prazer o jogo da ironia... Mas ambos terão conseguido mais uma vez falar de amor.

Pós-escrito a O Nome da Rosa. 1984.

Visita ao museu

UMA DAS vantagens de não ser crítico ou historiador de arte é poder retornar inocentemente, por puro prazer, a museus como o Metropolitan de Nova York. O não-especialista pode, ao contrário do profissional, ir direto a uma tela favorita de Van Eyck, visitar em seguida o pátio espanhol ou o templo egípcio, deter-se diante de vitrais medievais, admirar armamentos renascentistas e assim por diante, sem ter que dar satisfação a ninguém, nem à sua consciência. Ou seja, para um leigo como eu, museus são antes um espaço de liberdade e prazer.

É claro que, quanto mais se saiba a respeito das obras a serem vistas, mais intenso e concentrado é o prazer que elas nos oferecem. É por isso que, depois de visitar longamente alguma instituição assim, eu novamente prometo pôr em dia minha leitura acerca, digamos, do maneirismo ou do impressionismo e juro que, tão logo volte para casa, vou também terminar os livros do Gombrich, do Panofsky, ou mergulhar na biografia do Goya publicada recentemente pelo Robert Hughes.

E tudo mais ou menos em vão. Pois distante da força gravitacional das obras, outras leituras, aparentemente mais urgentes, se interpõem, exigindo minha atenção. O acordo ao qual acabo chegando comigo mesmo é o de deixar os textos acima para serem lidos um ou dois meses antes da próxima viagem. Mas, por um período semelhante depois de ter percorrido um acervo como o de cima, o fascínio que esse exerce ainda é o bastante para que eu leia uma boa meia dúzia de ensaios pertinentes e vá aos poucos agregando na mente outros tantos miligramas de informação que, um dia, talvez me sejam úteis (e, se não forem, já me entretêm agora).

Quando jovem e arrogante, eu dividia o público de museus em duas categorias: uma minoria de estetas que estava lá porque gostava sinceramente de arte e a massa de turistas que só estavam batendo ponto, fosse por orientação do "Michelin" ou do "Fodor's", fosse por medo de, voltando à terra natal, serem considerados sacoleiros incultos. Tal divisão já não me satisfaz. Se não a maioria, pelo menos boa parte das pessoas que passeavam pelo Metropolitan parecia ser gente local, jovens, adultos e idosos que o visitavam sozinhos e, ao que tudo indicava, nem pela primeira, nem pela última vez.

É igualmente uma boa aposta a de que, em geral, essa gente não tem doutoramento em artes plásticas ou estética, não passa o restante de seu tempo debruçada sobre tratados eruditos, não saberia discorrer sobre as técnicas utilizadas na elaboração daquela estátua de bronze, nem conseguiria explicitar as linhas de força que ligam esta escola às demais. Algo, porém, os, ou melhor, nos leva até lá. Como a "beleza" é um conceito que, há mais de um século, ninguém minimamente prudente manuseia sem pinças e luvas de borracha, convém vasculhar o vocabulário em busca de outros. "Accomplishment" (algo como: "nível de realização") é um termo capaz de indicar o que é que torna compulsivamente atraente uma criação humana. E, no caso das artes plásticas, tal "accomplishment" se torna não raro particularmente visível (é óbvio), ainda que o observador não consiga formular no que é que isso consiste.

Se há algo que, hoje em dia, torna necessária a visualização de "accomplishments" similares, é o fato de que, sendo produto de ciências e técnicas especializadas, a natureza das realizações do mundo atual permanece invisível para quase todos. Desfrutamos dos resultados, mas não entrevemos nem vestígio das "pinceladas" que os tornaram factíveis, e isso por várias razões, entre as quais a de que a verdadeira realização não se encontra onde muitos a buscam. O que aponta para o nível mais alto de realização do Ocidente, a pequena maravilha (inclusive de design) que é o iPod ou a barulheira confusa e repetitiva com a qual os ouvintes lhe preenchem a memória?

O vínculo entre intenção, concepção e resultado que até um vaso grego do período arcaico ou a escrivaninha de um aristocrata francês do século 18 exibem é o que reassegura aos freqüentadores de museus que o que chamamos de civilização não é conseqüência nem do acaso, nem da magia negra, mas, sim, de inteligência, talento e suor. E há, para completar ou coroar essa experiência ou constatação, a dimensão temporal. A perspectiva criada pela justaposição de obras e objetos provenientes de distintas culturas e épocas é o que, inconscientemente, às vezes, permite que nos situemos em relação a tudo que nos cerca. A profundidade resultante não é uma ilusão de ótica, mas a autêntica materialização epifânica da história viva que somos.

Nelson Ascher


Sunday, July 29, 2007

eu ia saindo, ela estava ali
no portão da frente
ia até o bar, ela quis ir junto
"tudo bem", eu disse
ela ficou super contente
falava bastante,
o que não faltava era assunto
sempre ao meu lado,
não se afastava um segundo
uma companheira que ia fundo

onde eu ia, ela ia
onde olhava, ela estava
quando eu ria, ela ria
não falhava

no dia seguinte ela estava ali
no portão da frente
ia trabalhar, ela quis ir junto
avisei que lá o pessoal
era muito exigente
ela nem se abalou
"o que eu não souber eu pergunto"
e lançou na hora
mais um argumento profundo:
que iria comigo
até o fim do mundo

me esperava no portão
me encontrava, dava a mão
me chateava, sim ou não?
não

de repente a vida ganhou sentido
companheira assim nunca tinha tido
o que pinta sempre
é uma coisa estranha
é companheira que não acompanha

isso pra mim é felicidade
achar alguém assim na cidade
como uma letra pra melodia
fica do lado, faz companhia

pensava nisso quando ela ali
no portão da frente
me viu pensando, quis pensar junto
"pensar é um ato
tão particular do indivíduo"
e ela, na hora "particular, é?
duvido"
e como de fato eu não tinha
lá muita certeza
entrei na dela, senti firmeza

eu pensava até um ponto
ela entrava sem confronto
eu fazia o contraponto
e pronto

pensar assim virou uma arte
uma canção feita em parceria
primeira parte, segunda parte
volta o refrão e acabou a teoria

pensamos muito por toda a tarde
eu começava, ela prosseguia
chegamos mesmo, modéstia à parte,
a uma pequena filosofia

foi nessa noite que bem ali
no portão da frente
eu fiquei triste, ela ficou junto
e a melancolia
foi tomando conta da gente
desintegrados,
éramos nada em conjunto
quem nos olhava
só via dois vagabundos
andando assim meio moribundos

eu tombava numa esquina
ela caía por cima
um coitado e uma dama
dois na lama

mas durou pouco, foi só uma noite
e, felizmente,
eu sarei logo, ela sarou junto
e a euforia bateu em cheio na gente
sentíamos ter
toda felicidade do mundo
olhava a cidade
e achava a coisa mais linda
e ela achava mais linda ainda

eu fazia uma poesia
ela lia, declamava
qualquer coisa que eu escrevia
ela amava

isso também durou só um dia
chegou a noite, acabou a alegria
voltou a fria realidade
aquela coisa bem na metade

mas nunca a metade foi tão inteira
uma medida que se supera
metade ela era companheira
outra metade, era eu que era

nunca a metade foi tão inteira
uma medida que se supera
metade ela era companheira
outra metade, era eu que era

Luiz Tatit; A Companheira

O que não temos, o que não somos, o que nos falta, eis os objetos do desejo e do amor.
Se o amor ama beleza e bondade, isso significa que elas lhe faltam. Como poderia ele ser um deus? Nem por isso é ruim ou feio, mas intermediário entre esses dois extremos, como entre o mortal e o imortal, o humano e o divino: o amor é um demônio, isto é (sem nada de diabólico, ao contrário), um mediador entre os deuses e os homens.

André Comte-Spoville; Pequeno Tratado das Grandes Virtudes

Baixei os olhos para Sohrab. Um dos cantos da sua boca tinha se curvado um tantinho para cima.
Um sorriso.
De um lado só.
Que mal se notava.
Mas que estava ali.
Atrás de nós, crianças saíam correndo em disparada e um monte daqueles caçadores perseguia aos gritos a pipa solta que continuava voando acima das árvores. Foi só eu piscar os olhos e o sorriso tinha desaparecido. Mas existiu. Eu vi.
- Quer que tente apanhar essa pipa para você?
O seu pomo-de-adão subiu e desceu quando engoliu. O vento agitou o seu cabelo. Pensei ter visto ele fazer que sim com a cabeça.
- Por você, faria isso mil vezes! - me ouvi dizendo.
Virei, então, e saí correndo.
Tinha sido apenas um sorriso, e nada mais. As coisas não iam se ajeitar por causa disso. Aliá, nada ia se ajeitar por causa disso. Só um sorriso. Um sorriso minúsculo. Uma folhinha em um bosque, balançando com o movimento de um pássaro que alça vôo.
Mas me agarrei àquilo. Com os braços bem abertos. Porque, quando chega a primavera, a neve vai derretendo floco a floco, e talvez eu tivesse simplesmente testemunhado o primeiro floco que se derretia.

Khaled Hosseini; O Caçador de Pipas

Friday, July 27, 2007

Músicos devem imitar software livre, diz Gil, Felipe Zmoginski, do Plantão INFO - SÃO PAULO - Os músicos e gravadoras deveriam imitar o modelo de distribuição usado pelas comunidades Linux. [...]

Monday, July 23, 2007

Mais que um calendário, os Maias possuiam um sistema de calendários circular cujo ciclo completo era de 52 anos solares e que sincronizava dois outros a saber: o calendário Tzol'kin de 260 dias e o calendário Haab de 365 dias e 1/5. O Calendário Maia prevê o final do ciclo atual no ano de 2012, quando tudo se extinguirá para o início de uma nova era.

http://pt.wikipedia.org/wiki/Calend%C3%A1rio_maia

E aí, Marta, gozou? | Acabo de chegar da ante-sala do pesadelo 08:30 "Julio, Joao Roberto Brito, executivo do SBT falecido no acidente da TAM, estava entre meus mais próximos e melhores amigos. Éramos parte de uma geraçao que colocou TV por assinatura de pé no Brasil. Ele, oriundo da RBS, e eu vindo de comunicaçao e varejo, fomos nos conhecer diretores na Net em 1986. De lá para cá tive o privilégio de compartilhar 11 anos de profunda amizade, nutrida por admiraçao, respeito, debate, inteligência, competência, generosidade e grandeza. Brito conseguia ser um bem sucedido executivo, extremamente competente e focado, sem perder a humanidade. Casado com Ana Paula, formavam um daqueles casais de cinema. Lindos, articulados e afetivos. Vi as filhas dele nascerem, gêmeas, sapecas sorridentes. Vao fazer 3 anos agora". 19/07 Fernando Coelho


"Estou chegando do Aeroporto de Congonhas, onde fomos (amigos) acompanhar o processo legista para começar a identificaçao de corpos. Nao vai ser fácil. O ambiente carregado de um misto indescritível de dor e perplexidade. Era a ante-sala do pesadelo, enquanto os nomes eram chamados para a entrevista legista com o pesadelo em si... Como era ele? Tinha cicatrizes? Tatuagem? Vc tem a arcada dentária?... Olha, a temperatura chegou a 1500ºC... Até pinos ortopédicos fundem nessa temperatura... Talvez precise do DNA... Dias? Meses? etc, etc". 19/07 Fernando Coelho

"Brito havia me telefonado no começo do fatídico dia para dizer que viria a SP para uma reuniao no SBT, e que se desse jeito a gente jantava juntos antes dele voltar. Ironicamente nao precisava ter vindo no vôo que o levou embora. Mas, tomou essa decisao e optou por se antecipar, justamente para evitar os atrasos do caos aéreo, caso tentasse o vôo do dia seguinte, direto para a reuniao". 19/07 Fernando Coelho

"Este meu relato, escrito dentro do mais profundo pesar, pretende tangibilizar a qualidade dessa perda. Exibir a humanidade que é criminosamente desperdiçada (assassinada) nessa cadeia de incompetência a qual estamos submetidos. Nao importa para que time você torce. Essa ou aquela visao política. A operaçao de um aeroporto é em qualquer sistema ideológico uma operaçao técnica, com padroes. Gostaria de ver a Policia Federal exibir agora a mesma coragem (covardia?) com a qual indiciou o jovem controlador do caso da GOL (Sargento Jomarcelo Fernandes dos Santos) por homicídio doloso (com intençao premeditada), fazer o mesmo com a cadeia alimentar, que, debaixo para cima segue - Infraero, ANAC, Aeronáutica, etc etc. Fica aqui a frase final, circulando na internet, que sintetiza o descalabro público completo no qual vivemos - 'E aí, Marta? Gozou?'. Canalhas..." 19/07 Fernando Coelho

http://www.bluebus.com.br/


Saturday, July 21, 2007

Tuesday, July 17, 2007

Fomos para a cama e Soraya adormeceu com a cabeça apoiada no meu peito. No escuro do nosso quarto, fiquei acordado, mais uma vez com insônia. Acordado. E sozinho, com os meus próprios demônios.

Lá pelas tantas, no meio da noite, levantei para ir até o quarto de Sohrab. Fiquei parado junto da cama, olhando para ele, e vi alguma coisa aparecendo por debaixo do travesseiro. Peguei para ver. Era a foto Polaroid tirada por Rahim Khan, aquela que eu tinha lhe dado na noite em que estávamos sentados perto da mesquita Shah Faisal. Aquela em que Hassan e Sohrab estão parados, um ao lado do outro, apertando os olhos por causa do sol, e sorrindo como se o mundo fosse um lugar bom e justo. Perguntei com meus botões quanto tempo Sohrab teria ficado deitado na cama fitando aquela foto, virando-a e revirando-a nas mãos.

Olhei para o retrato. "Seu pai era um homem dividido entre duas pessoas", dizia Rahim Khan na sua carta. Eu era a metade autorizada, a metade legitimada e socialmente aceita, a encarnação involuntária da culpa de baba. Olhei para Hassan, com o sol lhe batendo no rosto e revelando aquela falha de dois dentes da frente. A outra metade de baba. A que não era autorizada, não era privilegiada. A metade que herdou o que havia de mais nobre e puro em baba. A metade que, talvez, lá no fundo do coração, baba considerasse o seu verdadeiro filho.

Botei a foto de volta no lugar de onde a tirei. E foi então que me dei conta de algo: que essa última idéia que me passou pela cabeça não tinha provocado nenhuma dor. Ao fechar a porta do quarto de Sohrab, fiquei imaginando se era assim que brotava o perdão, não com as fanfarras da epifania, mas com a dor juntando as suas coisas, fazendo as suas trouxas e indo embora sorrateira, no meio da noite.

Khaled Hosseini; O Caçador de Pipas.


Monday, July 09, 2007

Live Earth emitiu 31,5 mil t de CO2, calcula cientista

Os shows em defesa da causa ecológica realizados anteontem em nove cidades do mundo emitiram 31,5 mil toneladas de dióxido de carbono, segundo estimativa do cientista John Buckley, do site carbonfootprint.com. O cálculo, a pedido do jornal inglês "The Observer", considerou deslocamento de artistas e público e consumo de energia no Live Earth. O total equivale, em média, ao que 4.000 latino-americanos lançam na atmosfera em um ano.

Folha de São Paulo

O "Pânico" está oferecendo camisetas como prêmio para quem mandar fita ao programa fazendo a "Dança do Siri" atrás das câmeras da Globo, enquanto jornalistas fazem reportagens ao vivo na rua. Já apareceu gente dançando durante o "Jornal Nacional", no "SPTV" e no "Jornal Hoje". A Globo pretende processar o "Pânico". A emissora nega o estresse e diz que não existe a possibilidade de procurar a Justiça.

Zapping - Folha Online

Monday, July 02, 2007