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Monday, October 15, 2012

O Fim de um Ciclo Político

Luis Nassif

Coluna Econômica

Semanas atrás escrevi sobre o fim da geração das diretas, o grupo que, a partir de São Paulo, dominou a cena política nacional, através do PSDB e do PT.

Do lado tucano, Covas, Fernando Henrique, Sérgio Motta, entre outros; do lado petista, Lula, Dirceu, Mercadante, Suplicy, Martha. Do lado dos peemedebistas históricos, Ulisses e Tancredo.

De certo modo, foram desbravadores da democracia brasileira, conseguindo definir um padrão de governabilidade que permitiu ao ornitorrinco voar.


Saía-se da ditadura praticamente sem sociedade civil. Os partidos políticos dividiam-se entre posições muito simplórias: contra ou a favor do regime anterior. Não havia maiores definições programáticas. E o equilíbrio do Executivo era constantemente bombardeado pela instabilidade econômica e por dois tipos de demanda: a do Congresso e a da mídia.

Não era tarefa fácil equilibrar a estabilidade democrática em meio a ventos tão implacáveis.

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De Sarney até FHC, o único instrumento de pacificação política foram os pacotes econômicos, mirabolantes, mas que, de tempos em tempos, conferiam algum fôlego político aos governantes. Foi assim com os sucessivos planos econômicos do governo Sarney, Collor, até o derradeiro, o Plano Real.

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A partir daí, consolidava-se a dualidade PSDB-PT paulistas, comandados pelos personagens das diretas-já. E, em cada partido, conviveram dois personagens: o líder (simbólico ou real) e o que botava a mão na massa.

Um conjunto de circunstâncias jogou o PSDB nas mãos de FHC, o líder simbólico, e de Sérgio Motta, o que botava a mão na massa. Figura generosa, impulsiva, Motta era o motor do partido, o que sujava as mãos (como no caso da votação da reeleição), acolhia os desabrigados, mantinha a chama acesa - ao lado do governador Mário Covas, em São Paulo.

Pouco antes de morrer, conhecendo o caráter de FHC, Motta deixou o bilhete histórico, pedindo que não se apequenasse. Apequenou-se. Tornou-se refém dos financistas do partido, abraçou o neoliberalismo mais desbragado, abandonou o discurso social-democrata e deslumbrou-se definitivamente com os salões.

Com isso, escancarou uma rodovia para que entrasse o discurso social do PT.

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Do mesmo modo que no PSDB, no PT havia o líder, Lula, e o que botava a mão na massa, José Dirceu.

Coube a Dirceu o papel fundamental de consolidar o arquipélago de tendências do PT, muitas vezes com uma objetividade dura que deixou ressentimentos, mas que liberou Lula para montar as estratégias maiores do partido.

Eleito Lula, Dirceu teve papel central na transição. Comandou intenso processo de negociação com o governo que saía, incluindo um pacto de não agressão que varreu para baixo do tapete inúmeros episódios obscuros do governo anterior.

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Tentou, depois, absorver toda a tecnologia de governabilidade do governo que saía, incluindo operadores, lobistas e tudo isso em um momento em que, com os principais quadros do partido indo para o governo, o PT viu-se meio acéfalo.

Mas não foi seguida a principal lição de FHC - aliar-se a um grande partido ônibus, como o PMDB, assim como o PSDB se aliou ao DEM.

O desafio de administrar o varejo acabou resultando no mensalão.

O "mensalão" foi um divisor de águas. E é interessante entender como se comportaram os atores políticos depois dele.

O pós-mensalão e Lula - 1

No início do governo, Lula teve que enfrentar uma enorme crise de mercado, com o dólar explodindo, o aumento da inflação e a inexperiência do novo partido com o poder. Foi nesse período que o trabalho de José Dirceu, junto ao meio político, e Antonio Palocci, junto ao mercado, foi fundamental para garantir a governabilidade. Passada a crise, o poder de Dirceu acabou sendo incômodo para o próprio Lula.

O pós-mensalão e Lula - 2

O "mensalão" acabou provocando a saída de Dirceu e dos demais companheiros que haviam carregado o piano do jogo pesado inicial. A luta pela sobrevivência política exigiu tudo de Lula. E aí apareceu o político fulgurante em sua plenitude. De um lado, passou a colher os frutos das políticas sociais do início do governo. De outro, precisou dar um impulso gerencial sem precedentes ao seu governo.

O pós-mensalão e Lula - 3

Finalmente, o enorme desgaste produzido pelo episódio impulsionou a renovação do PT. A cara do partido não podia ser mais a dos pioneiros, os que ajudaram no trabalho hercúleo de criar um partido nacional. É nesse contexto que a intuição política de Lula leva à indicação de Dilma Rousseff para presidente e de Fernando Haddad para concorrer à prefeitura de São Paulo. Além da aproximação com Eduardo Campos.

O pós-mensalão e FHC - 1

Caminho inverso percorreu FHC. Sem Mário Covas, tornou-se a única referência do PSDB. Sua falta de vontade de governar, a falta de visão de futuro (ao não perceber o tempo social sucedendo o tempo da estabilização), a escassez de ideias (que o levou a adotar acriticamente o receituário neoliberal), e o neodeslumbramento da mídia (para caracterizá-lo como o antiLula)  cobraram sua conta.

O pós-mensalão e FHC - 2

Mais e mais, FHC imbuiu-se do discurso moralizante, de uma retórica que, embora não tão grosseira quanto a de José Serra, empurrava para o conflito. Nas palestras e, principalmente, nos artigos para o Estadão e o Globo, não conseguia desenvolver mais do que bordões soltos, sem nenhuma profundidade. Mais que isso, não preparou o partido para a renovação, para o aparecimento de novos quadros.

O pós-mensalão e FHC - 3

Chega-se, ao final do longo processo político, que vem da redemocratização até os dias atuais, com os resultados conhecidos. No campo das lideranças, Lula conseguiu não apenas reeleger o sucessor como reestruturar o partido; já FHC  saiu derrotado do governo e deixa um partido em ruínas. Mas a história há de se lembrar dos construtores, os que colocaram a mão na massa e pagaram por isso: Sérgio Motta e José Dirceu.

PS - Quando me refiro ao "mensalão", obviamente falo do episódio político. O que não significa nenhum endosso às teses do STF de mesada ou de montagem de coligação para a ditadura - como mencionou um Ministro desinformado.

Sunday, October 14, 2012

OMBUDSMAN

Endurecer Sim, mas Sem Perder a Razão

Em dias especiais, a "Primeira Página" precisa mudar para mostrar que tem notícia importante. Subir o tom sem cair na histeria é um desafio que a Folha não venceu na quarta-feira passada.

A capa com a condenação de José Dirceu no Supremo Tribunal Federal lembrava jornal sensacionalista no dia seguinte à prisão de um assassino conhecido.

A fotografia enorme no alto mostra um Dirceu "fantasmagórico", na definição de um leitor que gostou da capa. A luz vinda por baixo ilumina apenas o rosto do ex-ministro, em uma imagem obtida no domingo passado, quando ele foi votar.

As letras da manchete cresceram muito: de corpo 80 para 174, um aumento de 117%. Em vez de título, apenas uma palavra: "culpados" - e não "condenados", que seria a reprodução fiel do que havia sido decidido no STF e não carregaria um juízo moral.

A composição parecia refletir um clima de comemoração. "Dava para ouvir os fogos de artifício estourando ao fundo", disse outro leitor, este ofendido com a capa.

Quando houve o impeachment de Fernando Collor, fato histórico mais importante que o mensalão, a "Primeira Página" também "falou mais alto" e até deixou transparecer a satisfação com o ocorrido na tarja "vitória da democracia".

O contexto era outro, havia mobilização de rua e a Folha torcia explicitamente pelo impeachment. Mesmo assim, o foco não estava no presidente deposto. A foto principal nem é a de Collor, mas a da festa dos deputados na Câmara.

Usados os mesmos parâmetros da quarta-feira passada, a capa de 30 de setembro de 1992 teria uma daquelas fotos em que Collor parece diabólico e apenas uma palavra em letras gigantescas: "Expulso".

Resumir o escândalo do mensalão às figuras de Dirceu, José Genoino, Delúbio Soares e Marcos Valério é reduzir a importância do caso. O fundamental do julgamento no Supremo não é a punição de "fulano", mas ter deixado uma mácula histórica no governo Lula. Seria melhor uma manchete que dissesse "José Dirceu, homem forte do governo Lula, é condenado por corrupção".

A Secretaria de Redação diz que "a importância histórica do julgamento justifica o espaço dado à manchete". "É a condenação por corrupção de políticos de mais alta patente já realizada pelo Judiciário brasileiro, que terá enorme repercussão em decisões futuras."

Foi uma pena o jornal ter derrapado bem no ápice do julgamento, porque houve, durante a cobertura, um esforço de manter a neutralidade, diferenciando-se de outros jornais e revistas que embarcaram em uma campanha condenatória.

Mas, apesar de desastrada, a capa de quarta-feira não prova, como querem muitos, que a Folha persegue o PT. Quem espalha essa tese esquece que o jornal bateu forte no governo Fernando Henrique Cardoso, como se pode aferir revendo as reportagens sobre a denúncia de compra de votos da emenda da reeleição (1997) e sobre o escândalo do leilão da Telebrás (1999).

Nesses 20 anos, o jornal não abriu mão do apartidarismo, mas parece ter se esquecido como ser eloquente sem perder a elegância.

SUZANA SINGER ombudsman@uol.com.br @folha_ombudsman

JANIO DE FREITAS

A Mesada e o Mensalão

A mentira foi a geradora de todas as verdades, meias verdades, indícios desprezados e indícios manipulados que deram a dimensão do escândalo e o espírito do julgamento do "mensalão".

Por ora, o paradoxo irônico está soterrado no clima odiento que, das manifestações antidemocráticas de jornalistas e leitores às agressões verbais no Supremo, restringe a busca de elucidação de todo o episódio. Pode ser que mais tarde contribua para compreenderem o nosso tempo de brasileiros.

Estava lá, na primeira página de celebração das condenações de José Dirceu e José Genoino, a reprodução da primeira página da Folha em 6 de junho de 2005. Primeiro passo para a recente manchete editorializada - CULPADOS -, a estonteante denúncia colhida pela jornalista Renata Lo Prete: "PT dava mesada de R$ 30 mil a parlamentares, diz Jefferson". O leitor não tinha ideia de que Jefferson era esse.

Era mentira a mesada de R$ 30 mil. Nem indício apareceu desse pagamento de montante regular e mensal, apesar da minúcia com que as investigações o procuraram. Passados sete anos, ainda não se sabe quanto houve de mentira, além da mensalidade, na denúncia inicial de Roberto Jefferson. A tão citada conversa com Lula a respeito de mesada é um exemplo da ficção continuada.

A mentira central deu origem ao nome -mensalão- que não se adapta à trama hoje conhecida. Torna-se, por isso, ele também uma mentira. E, como apropriado, o deputado Miro Teixeira diz ser mentira a sua autoria do batismo, cujo jeito lembra mesmo o do próprio Jefferson.

Nada leva, porém, à velha ideia de alguém que atirou no que viu e acertou no que não viu. A mentira da denúncia de Roberto Jefferson era de quem sabia haver dinheiro, mas dinheiro grosso: ele o recebera. E não há sinal de que o tenha repassado ao PTB, em nome do qual colheu mais de R$ 4 milhões e, admitiria mais tarde, esperava ainda R$ 15 milhões. A mentira de modestos R$ 30 mil era prudente e útil.

Prudente por acobertar, eventualmente até para companheiros petebistas, a correnteza dos milhões que também o inundava. E útil por bastar para a vingança ou chantagem pela falta dos R$ 15 milhões, paralela à demissão de gente sua por corrupção no Correio. Como diria mais tarde, Jefferson supôs que o flagrante de corrupção, exibido nas TVs, fosse coisa de José Dirceu para atingi-lo. O que soa como outra mentira, porque presidia o PTB e o governo não hostilizaria um partido necessário à sua base na Câmara.

Da mentira vieram as verdades, as meias verdades e nem isso. Mas a condenação de Roberto Jefferson, por corrupção passiva, ainda não é a verdade que aparenta. Nem é provável que venha a sê-lo.

MAIS DEDUÇÃO

Em sua mais recente dedução para voto condenatório, o presidente do Supremo, Ayres Britto, deu como certo que as ações em julgamento visaram a "continuísmo governamental ".

"Golpe, portanto, nesse conteúdo da democracia que é o republicanismo, que postula renovação dos quadros de dirigentes".

Desde sua criação e no mundo todo, alcançar o poder, e, se alcançado, nele permanecer o máximo possível, é a razão de ser dos partidos políticos. Os que não se organizem por tal razão, são contrafações, fraudes admitidas, não são partidos políticos.

Sergio Motta, que esteve politicamente para Fernando Henrique como José Dirceu para Lula, informou ao país que o projeto do PSDB era continuar no poder por 20 anos.

Não há por que supor que, nesse caso, o ministro Ayres Britto tenha deduzido haver golpe ou plano golpista. Nem mesmo depois que o projeto se iniciou com a compra de deputados para aprovar a reeleição.

ELIO GASPARI

O Desconforto da Nação Petista

Os argumentos do desconforto de comissários, intelectuais e políticos da nação petista diante das sentenças do Supremo Tribunal Federal colocam-nos na situação do sujeito que usa livre-arbítrio para acreditar que a rua Barata Ribeiro é uma transversal da avenida Atlântica. Pode acreditar nisso, mas nunca mais será capaz de achar um endereço em Copacabana.

Oito dos 11 ministros da corte foram nomeados por Lula e Dilma Rousseff. Ao sustentar que esses juízes formaram um tribunal de exceção, os companheiros deslustram o mérito das indicações dos governantes petistas.

Salvo os doutores Toffoli e Lewandowski, a corte teria cedido a uma pressão dos meios de comunicação. Se essa influência fosse infalível, como explicar que a mesma corte, por unanimidade, reconheceu a constitucionalidade das cotas para as vagas nas universidades públicas? Contra elas estava a unanimidade dos grandes meios de comunicação, ressalvada a autonomia assegurada a alguns articulistas.

Dois condenados (José Dirceu e José Genoino), ergueram em suas defesas passados de militância durante a ditadura. Tanto um como outro defenderam projetos políticos que transformariam o Brasil num Cubão (Dirceu) ou numa Albaniona (Genoino).

Felizmente, a luta de políticos como Ulysses Guimarães, Tancredo Neves e Paulo Brossard trouxe esses militantes perseguidos para a convivência democrática, e não o contrário. Se tivessem prevalecido as plataformas do PC do B ou do Molipo, Ulysses, Tancredo e Brossard teriam vida difícil.

A teoria da conspiração contra guerrilheiros heroicos estimula construções antidemocráticas de denúncia da justiça e da imprensa a serviço de uma elite. Nos anos 60, muita gente achou que a luta contra a "democracia burguesa" passava pela radicalização e até pelos trabucos. Deu no que deu.

Ficaria tudo mais fácil se os companheiros entendessem que fizeram o que não deviam e foram condenados. Endossaram a teoria da impunidade do caixa dois eleitoral porque acharam que ela os protegeria. O melhor a fazer seria reerguer a bandeira abandonada da moralidade. Assim poderão batalhar pela condenação de mensaleiros de outros partidos e apresentar-se aos eleitores com um projeto livre de capilés.

CARLOS HEITOR CONY

Projeto de Poder

Depois do golpe de 1964, os generais eram candidatos compulsórios a ocupar a Presidência da República, que passou a ser o cargo máximo da carreira. Na hora da sucessão, a briga era decidida pelo maior número de tropas, tanques, canhões e demais apetrechos da caserna.

Um general tinha a 4ª Região a favor, mas a Escola Superior de Guerra tinha outro pretendente. A Vila Militar preferia outro nome. Da contabilidade bélica, surgia o escolhido.

A ditadura caiu - custou, mas caiu. Tanques e canhões foram recolhidos aos quartéis - e que lá fiquem. Em substituição, voltamos a buscar aquilo que santo Agostinho chamou de "excremento do demônio", aquele "metal" que costumam chamar de "vil": o dinheiro.

No atual julgamento do mensalão, gostei da intervenção do presidente do STF, ministro Ayres Britto, que não culpou o governo em si, mas referiu-se ao "projeto de poder" do PT. Projeto formulado, timidamente, a partir do primeiro governo de Lula e revitalizado pela atual cúpula partidária. O mensalão seria uma espécie de laboratório para a conquista do fim.

Contudo tenho de lembrar que o PT não é o primeiro a pretender um projeto de poder. Lá atrás, o finado ex-ministro Sergio Motta, no primeiro governo de FHC, falou também na necessidade desse laboratório, que garantiria 20 anos de poder ao PSDB. E fez por onde: obteve a emenda da reeleição - que garantiu novo mandato ao presidente de então. Por sinal, um presidente que a perspectiva histórica começa a fazer justiça, com méritos maiores do que inevitáveis defeitos.

A emenda que possibilitou a reeleição teve o preço em dólares. Alguns congressistas mais ligados com o esquema tucano chegaram a renunciar ao mandato para não passarem pelo vexame da cassação.