Sunday, February 25, 2007

O filósofo e estudioso do iluminismo Renato Janine Ribeiro repensa a pena de morte à luz da morte do menino João Hélio.

RENATO JANINE RIBEIRO ESPECIAL PARA A FOLHA

Escrever sobre o horror em estado puro: assim vivi o convite para participar deste número do Mais!. É insuportável pensar no crime cometido contra o menino João Hélio. E é nisso que mais penso, nestes dias. Não me saem da cabeça duas ou três coisas. A primeira é o sofrimento da criança. Se há Deus, e acredito que haja, embora não necessariamente antropomorfo, como admite Ele esse mal extremo, gratuito, crudelíssimo?
Se a alma ou o espírito tem um destino após a morte, chame-se esse de juízo eterno ou de uma série de reencarnações, como poderá esse infeliz menino ser recompensado pela vida que lhe foi ceifada, não apenas tão cedo, mas, além disso, de modo tão bárbaro?
Essas são questões religiosas, ou melhor, de fé. E quanto aos assassinos? A outra coisa que não me sai da cabeça é como devem ser punidos. Esse assunto me faz rever posições que sempre defendi sobre (na verdade, contra) a pena de morte.
Anos atrás, me convidaram a escrever um artigo para uma revista de filosofia contra a pena de morte. Perguntei então: mas alguém escreverá a favor? E me responderam que era possível, por que não? Acabei escrevendo meu artigo (contra a pena capital), mas este caso horrível me faz repensar ou, melhor, não pensar, sentir coisas distintas, diferentes.
Se não defendo a pena de morte contra os assassinos, é apenas porque acho que é pouco. Não paro de pensar que deveriam ter uma morte hedionda, como a que infligiram ao pobre menino.
Imagino suplícios medievais, aqueles cuja arte consistia em prolongar ao máximo o sofrimento, em retardar a morte. Todo o discurso que conheço, e que em larga medida sustento, sobre o Estado não dever se igualar ao criminoso, não dever matar pessoas, não dever impor sentenças cruéis nem tortura - tudo isso entra em xeque, para mim, diante do dado bruto que é o assassinato impiedoso.
Torço para que, na cadeia, os assassinos recebam sua paga; torço para que a recebam de modo demorado e sofrido. Conheci o sr. Masataka Ota, pequeno empresário cujo filho pequeno foi assassinado. Entrevistei-o para meu programa de ética na TV Futura (episódio "Justiça e Vingança"). Masataka perdoou os assassinos, isto é, embora pudesse matá-los, não o fez.
Quis que fossem julgados e lamenta que já estejam soltos, poucos anos após o crime hediondo, mas ele é um caso raro - e admirável - em não querer se vingar, em não querer que os assassinos sofram mais do que a pena de prisão. Confesso que não seria a minha reação.

Quem é humano?

Penso - porque ainda consigo pensar, em meio a esse turbilhão de sentimentos - também que há diferentes modos de impor a pena máxima. A punição com a morte se justifica ora pela gravidade do crime cometido, ora pela descrença de que o criminoso se possa recuperar. No caso, as duas razões comparecem. Parecem irrecuperáveis, e seu crime é hediondo. Não vejo diferença entre eles e os nazistas.
Creio que só um insensato condenaria as execuções decretadas em Nuremberg. Há, hoje, quem debata se Luís 16 deveria ou não ter sido guilhotinado: dizem alguns que o melhor seria reduzir o último rei absoluto da França a um cidadão privado, um pouco como a China (curiosamente, campeã em execuções) fez com Pu Yi, seu derradeiro imperador. Mas Luís era culpado apenas de ser rei. Pessoalmente, era um homem bom. Os nazistas foram culpados do que fizeram. Optaram pelo mal. Como esses assassinos.
Em países como os Estados Unidos, a demora na execução é ela própria uma parte – talvez involuntária - da pena. Alguém passa 20 anos no corredor da morte, e é executado quando já pouco tem a ver com quem foi. Na Inglaterra, antes de abolir a pena de morte, era diferente: dois ou três meses após o crime, o assassino era enforcado. Nos dois países, a garantia de todos os direitos de defesa ao réu faz parte, por curioso que pareça, da engrenagem que diz ao acusado: você terá todos os direitos, mas não escapará.
No Brasil é diferente. Não temos pena de morte, na lei. A Constituição a proíbe. Mas provavelmente executamos mais gente que o Texas, o Irã ou a China. É que o fazemos às escondidas. Quando penso que, desses infanticidas, os próprios colegas de prisão se livrarão, confesso sentir um consolo. Mas há algo hipócrita nisso.
Se as pessoas merecem morrer, e se é péssimo o Estado se igualar a quem tira a vida de outro, por outro lado é uma tremenda hipocrisia deixar à livre iniciativa dos presos ou aos justiceiros de esquina a tarefa de matar quem não merece viver. Abrimos mão da responsabilidade, que pode ter uma sociedade, de decidir - no caso, quem deve viver e quem merece morrer. Tudo isso traz questões adicionais. É-se humano somente por se nascer com certas características?
Ou a humanidade se constrói, se conquista - e também se perde? Alguém tem direito, só por ser bípede implume, de fazer o que quiser sem perder direitos? A todos assiste o direito da mais ampla defesa.
Mas, garantida esta, posso fazer o que quiser sem correr o risco da pena última? Isto, que relato, põe em questão meu próprio papel como intelectual. Intelectual não é apenas quem tem uma certa cultura a mais do que alguns outros. É quem assina idéias, quem responde por elas.
Tive, na graduação, uma amiga que teve bloqueio de escrita. Mas, na verdade, ela até fazia trabalhos - de graça - para outros colegas. Seu bloqueio não era de escrita, mas de assinatura.
Talvez possa dizer: o cientista escreve, o intelectual assina.
O intelectual é público. Só que, para ele cumprir seu papel público, é preciso acreditar no que diz. Ora, quantas vezes o intelectual afirma aquilo em que não acredita? Quantos não foram os marxistas que se calaram sobre os campos de concentração, que eles sabiam existir? Por isso, o mínimo que devo fazer, se sou instado a opinar, é dizer o que realmente penso (ou, então, calar-me).
Sei que a falta de perspectiva ou de futuro é o que mais leva pessoas a agirem como os infanticidas. Sei que devemos reformar a sociedade para que todos possam ter um futuro. Creio que isso reduzirá a violência. Mas também sei que os pobres são honestos, mais até do que os ricos. A pobreza não é causa da falta de humanidade. Quer isso dizer que defenderei a pena de morte, a prisão perpétua, a redução da maioridade penal? Não sei. Não consigo, do horror que sinto, deduzir políticas públicas, embora isso fosse desejável.
Mas há algo que é muito importante no exercício do pensamento: é que atribuamos aos sentimentos que se apoderam de nós o seu devido peso e papel. Não posso pensar em dissonância completa com o que sinto. A razão, sem dúvida, segura muitas vezes as paixões desenfreadas. Quantas vezes não nos salvamos do desespero, do desamparo, do ódio e da agressividade, apenas porque a razão nos acalma, nos contém, nos projeta o futuro?
Que crimes o amor desprezado não causaria, não fosse ele contido pela razão? Mas isso vale quando a dissonância, insisto, não é completa. Se o que sinto e o que digo discordam em demasia, será preciso aproximá-los. Será preciso criticar os sentimentos pela razão - e a razão pelos sentimentos, que no fundo são o que sustenta os valores. Valores não são provados racionalmente, são gerados de outra forma. Afinal de contas, o que vivemos no assassínio bárbaro de João Hélio, como meses atrás quando queimaram viva uma criança num carro, não é diferente do nazismo.
Dizem uns que o Brasil está como o Iraque. Parece, pior que isso, que temos algumas mini-auschwitzes espalhadas pelo território nacional.


--------------------------------------------------------------------------------
RENATO JANINE RIBEIRO é professor de Ética e Filosofia Política na USP e autor de, entre outros, "A Ética na Política" (ed. Lazuli).

Friday, February 23, 2007

Manoel Carlos renovou contrato com a Globo até 2013. Como se fosse haver Leblon até lá! - Tutty Vasques

Monday, February 19, 2007

Ao Vivo: Você diz que música, acima de tudo é relação humana. Como você avalia esse poder da música de atingir e provocar sensações tão diferentes nas pessoas?

Lenine: Isso é uma arma poderosa... Talvez por isso mesmo é que eu, durante a vida toda, fiz questão que minha arte fosse apartidária. Porque eu acho que a gente exerce uma função político-social muito bacana. A gente é cronista. Se você pegar o disco de qualquer pessoa, vão ter fotos do cotidiano daquela pessoa. Isso é história. Então, eu acho que música é isso aí, entretenimento e informação.

Ao Vivo: No que você acha que suas músicas ajudam ou interferem nas relações humanas?

Lenine: Ah, ajudam e interferem muito. Por exemplo, eu estava fazendo um show, acho que era no Paraná, aí chegou um cara, dono de uma baita fazenda, para me dar um abraço porque a produção leiteira dele aumentou 25%. Ele fez uma fita com a música Paciência e ficava tocando toda vez na hora da ordenha (risos). Ora, quando eu iria imaginar que minha música teria uma função dessas, cara? (risos). Nem por isso estou recebendo queijinho ou leite de graça (risos).

Saturday, February 17, 2007

Friday, February 16, 2007

Rogério Flausino, do Jota Quest, perde parte da audição

Enviada por Alcides Constantino Filho

14/02/2007 - 20:20

Minha Notícia - http://www.ig.com.br/

Rogério Flausino, 35, vocalista do grupo pop Jota Quest, perdeu aproximadamente 30% da audição do ouvido direito.

A causa seria o alto volume do fone de ouvido utilizado durante os shows. O acessório serve como retorno de aúdio para o músico, que dessa forma pode ouvir os instrumentos e a voz.

Flausino não se abalou com o fato e disse que vai se acostumar a tocar sem o fone.

Sting, Phil Collins e Eric Clapton, entre outros, também perderam parte da audição por causa dos decibéis que produzem. Ossos do ofício.

Comentários

Achei bom, assim ele se poupa de ouvir suas músicas, que são uma droga!!!
Fernandão

Eu tenho um recadinho para enviar para o Rogério Flausino do grupo Jota Quest: Meu; Tudo de mais, é veneno. Inclusive, retorno de som muito alto, nos ouvidos.
Osías Dos Santos Maciel http://osias@ig.com.br

Melhoras Flausino.. adoro suas musicas, sua voz, seu som, seu olhar, espero que não deixe isso impactar no seu trabalho.. bjs lindo!
Everton http://keko.com.br/

Ah e acho uma pena o rapaz ter perdido 30% da audição, mas não é nada que vá fazer ele parar o seu trabalho, só precisa acostumar com essa perda e cuidar pra não piorar

A MÃE DESSE TAL DE ROSALVO NÃO PERDEU A AUDIÇÃO. PERDEU FOI A VOZ NA CAMA DE TANTO GRITAR: ENFIA MAIS, ENFIA MAISMAIS,ENFIAAAAAAAAAAAAAAAAAAA ENFIA JUMENTO.
JCARLOS

é triste ver quando pessoas se baseiam em comentários de noticias pra dizer se o Brasil é bom ou ruim. O problema do Brasil vem de muito antes, o por querermos copiar posturas de outros paises. E com essa juventude que tem hj o futuro do Brasil é cada vez mais obscuro

QUE BABAQUICE, OFENDER OS OUTROS COM SEUS COMENTÁRIOS IDIOTAS, E ATÉ PARECE QUE O TAL DE rei roberto o que mesmo? CANTA DEMAIS, POXA SERIA MOMENTO DE NOS CONDOERMOS COM A DOR DOS OUTROS E VOCÊS SÓ SABER METER O PAU, E SE FOSSE ELGUÉM DA FAMÍLIA DE VOCÊS, VOCÊS ESTARIAM METENDO O PAU ASSIM ? POXA VIDA RESPEITO É BOM É POR ISSO QUE ESSE PAÍS IDIOTA CHAMADO brasil NÃO MELHORA NUNCA E NUNCA VAI MELHORAR. OBs DEIXEM A VIDA DOS OUTROS EM PAZ QUEM NÃO SABE FAZER CRITICA, CREIO QUE ISSO É DESPEITO QUERIAM ESTAR NO LUGAR DA PESSOA CRITICADA E NÃO PODEM
josé jr

Gosto muito do Jota Quest, e em especial do Rogério Flausino. Espero que ele consiga superar o problema. Serve como alerta, a maioria não se preocupa com a possibilidade de perda auditiva, o que infelizmente é definitivo. Segue um abraço especial pro Rogério Flausino.
Valéria

Que lástima, perder parte da audição por ouvir o lixo que a banda dele produz. Já não bastava o plágio descarado de uma música do Roberto Carlos... tá aí... deve ser castigo!
Rosalvo

Aí, Reinaldo... é melhor ouvir um comentário idiota e estúpido como esse seu do que ser surdo!
SANDRO

ai Reinaldo na boa esse seu comentário é uma lástima cara vc não sabe nem fazer comentários simplesmente vc é mais um analfabeto nesse país
cristina

essa historia de que isto é um avioo pra outros cantores, isto é besteira... a verdade.. é q a musica tem q ser alta mesmo... senão os troxas nao ouvem, senão a musica nao presta.. então... q se lasque.... quem faz essa%!@$&@#.. quem compra a%!@$&@#.. quem toca a%!@$&@#. e quem ouve...bem alto... bem feito....q se lasque todos....
REINALDO

Pra esses caras, perder um pouco da audiçao nao é nada. Encheram a mala de dinheiro. Pior é o mané que ouve as músicas deles a todo volume, fica surdo tambem e continua pobre!
Helio

Ok, até entendo que devido a carreira e aos shows ele possa ter problemas com audição, mas isso deve servir de alerta para outros artistas para que possam evitar este problema!
Rafael

acho que esse problema acontece com todos os musicos. e isso não é problema do governo, é uma questão de manisfestação popular. acho que o João está certo. deixa o João comentar!
Eron

O que ocêis tão falando? Num tô ouvindo nada...
Abustampífio

...NA MINHA ÉPOCA ERA TUDO AO VIVO E SEM FRESRA, PLAYBACK E OUTROS ARTIFÍCIOS QUE USAM E MASCARAM A VOZ E A MÚSICA...Quem é esse tal de João obscuro e invejoso que se diz músico? Talvês ele queira um autógrafo! Só pode ser um músico fracassado! Disse!
Ivan

na moral eu tb. perdi e nao deixo de escutar asneiras..ks
claudemir rodrigues cesar

AQUI NINGUÉM COMENTANTO SE A BANDA É RUIM OU NÃO EU PARTILAMENTE GOSTO DE ALGUMAS MÚSICAS, MAS A REPORTAGEM QUE FOI COLOCADA FOI DE UMA PESSOA NORMAL E VAMOS TER PELOS ALGUM RESPEITO PELA ESTÁ FASE RUIM. QUERIA VER SE FOSSE COM ALGUM DESSES INVEJOSOS SE ELES ESTARIAM FAZENDO BRINCADEIRA. SE LIGAM.
João

Caramba, que mensagem mais ridícula, isso é tão normal, é que é um digamos cantor que para mim não canta nada, porque se não fosse não teria a matéria. ISSO POR CAUSA DO PONTO QUE ELE USA NO OUVIDO, NA MINHA ÉPOCA ERA TUDO AO VIVO E SEM FRESRA, PLAYBACK E OUTROS ARTIFÍCIOS QUE USAM E MASCARAM A VOZ E A MÚSICA. HOJE EM DIA QUALQUER UM SE DIZ MÚSICO. MAS MÚSICOS SÃO OS DE ANTIGAMENTE. HOJE SÓ DÁ PORCARIA, INFELIZMENTE! BACH, MOZART, PAULINHO NOGUEIRA QUE O DIGA....
João

Sou musico, isso é muito comum com quem trabalha música. Acho que 99% dos bateristas perdem a audição.
Rodrigo

VAI LAVAR ROUPA O FRUSTRADA!!!! SEU MAL É FALTA DE PAU!
P a Adriana

J. Quest é um cantor q agrada a todos, tem um carisma muito grande, espero q ele possa se recuperar e continuar a cantar músicas bacanas como sempre o fez.
O CARA É DEZ....

OUTRO INVEJOSO NA AREA!
P O VENOM.....

SUA INVEJA ESTÁ EXPLICITA, TENHO PENA DE VC....SERÁ Q VC PRODUZ ALGUMA COISA NA VIDA ALÉM DE VIR DERRAMAR O SEU VENENO INVEJOSO????
P o DANIEL>.......

Que zica,%!@$&@# adoro o Conjunto Pão-de-Queijo. Fica tranquilo existem aparelhos subcutâneos de última geração para este tipo de problema - GN Resound.
Antonio Carlos

Gente ninguém está pedindo pra quem não gosta da banda comentar. Mas o minimo que se pode esperar é o respeito. Cada um ouve aquilo que gosta.Não faça critica pra não ser criticado. Não gosta deles não comente. Sinto muito pelo ROGÈRIO, ele vai se recuperar.
Drica

desculpa Rosivaldo, mas essa eu não poderia deixar escapar, vc acaba de cometer uma gafe moooooooooooonstra, qm canta...vou deixar a vida me levar..., não é o J Quest e sim, o Skank, mas td bem, axo q eu pessoal te perdoa, rsrsrs. flw.
Indio

Acho q todo mundo tem o direito de criticar e de defender seu gosto musical, eu particularmente não gosto de bandas pops, por isso q nao gosto do J Quest, mas depois de tomar umas até que eu do meus pulos e canto vou deixar a vida me levar..hehehehehehe... abraços
Rosivaldo Batista Filho

Eu também perdi um percentual de audição graças aos shows de rock que frequento. A minha otorrino disse: está proibida de ir em show de rock! Acho que hoje estou quase surda. Huahuahua!
Iva

Rapaz os Caras São Muito Bons, As Letras São o Máximo Não Entendo Porque Criticam o Cara e a Banda Eles São Ótimos, Ai Rogério Você Canta Muito Até Mesmo Sem Audição Boa Sorte Brother.
Aureo

tcs, tcs... idaí?? Jura que isso é para comentar? tcs,tcs,tsc... O paizinho ridículo... Tanta coisa mais importante. A minha vó está perdendo cabelo... comentem
Adriana

Para quem acha a banda ridícula pq entrou para comentar, poderia fazer outras coisas ao invés de ser tão imbecil. E sua mãe ainda escuta? Pq com um filho otário assim melhor ser surda, pq ter parido um corno assim, coitada!!
meg http://www.ig.com.br

Bom, para quem nunca teve voz para cantar até que não vai fazer falta. Já está na hora desta banda ridícula acabar, mas enquanto tiverem otários para comprar seus CDs, eles vão sobrevivendo. Na realidade os fãs dessa banda já devem ter perdido parte da audição escutando as porcarias que esse cara canta.
Venom

... E agora hein.. Eu não vou nem dormir !!!!
Richard

Vozinha fraca e irritande, Daniel. Fraco, irritante e invejoso é vc. Rogério é perfeito e o Jota é o maravilhoso
nana

Talento, voz, criatividade, alegria...Faustino nao perdeu nada nao... e com todo este potencial podemos, com certeza, esperar ...Dias melhores...p`ra sempre...p`ra sempre...
Afonso Galvao http://www.akemypa.hpg.com.br

comentário Ridículo!! Isso é pura inveja. E também ele traz alegria para muitos.
Walber

Comentariozinho ridículo em filho, perdeu a oportunidade de ficar calado!
Fc

Tem gente que perde a oportunidade de ficar quieto....
Dani

Pena q não perdeu 100% da audição e o resto daquela vozinha fraca e irritante dele......
Daniel

Wednesday, February 14, 2007

Monday, February 12, 2007



Evandro Lins e Silva relatou a denúncia do Ministério Público que no dia 30 de dezembro de 1976, aproximadamente às 16 horas, na residência de Ângela Maria Fernandes Diniz, na Praia dos Ossos, em Cabo Frio, Estado do Rio de Janeiro, a vítima Ângela decidiu acabar definitivamente com a ligação amorosa com Raul Fernando do Amaral Street (Doca Street), mandando-o embora de forma irrevogável, ocasião em que discutiram acaloradamente.

Raul arrumou seus pertences, colocou-os no carro e afastou-se da casa, para retornar em seguida, sem nenhuma explicação. Tentou a reconciliação e, vendo-a frustrada, discutiram novamente, momento em que Ângela se afastou para o banheiro. Nessa oportunidade, Raul armou-se de uma arma automática “Bereta” e seguiu sua amásia, encontrando-a no corredor, abordando-a, ocasião em que desferiu vários tiros contra a face e o crânio de Ângela, culminando por matá-la.

O Tribunal do Júri de Cabo Frio somente veio reunir-se em 1980, para julgar Doca Street, ocasião em que Evandro Lins e Silva pronunciou memorável defesa, divulgada por todo o país, através dos meios de comunicação de massa que cobriram intensamente aquele julgamento.

O advogado de defesa disse: “Senhores jurados. Quiseram os fados, quis o destino, que a última defesa, o “canto do cisne” de um velho advogado criminal se desse nesta cidade, recanto inimitável e deslumbrante do Brasil e do mundo, onde, como no verso do poeta, “a mão da natureza esmerou-se enquanto tinha”.

E por uma extraordinária coincidência que só os mistérios insondáveis do destino podem explicar, há 52 anos, vindo das plagas do Norte, ao passar em frente a Cabo Frio, houve uma cerimônia simbólica no navio – o batismo daqueles que ainda não tinham ido ao Rio de Janeiro.

Em vez dos santos óleos, as águas do mar de Cabo Frio. Não sei se esse batismo que tanto me marcou e que conservo retido na memória, como um feliz evocação do passado, teve alguma oculta influência no desenvolvimento da minha carreira e da minha vida.

Guardo o sentimento, um tanto supersticioso de que foram muito bons os fluidos dessa crisma nas águas lustrais desta cidade sedutora.

Faço uma despedida e uma despedida é sempre melancólica. Abandono hoje a Tribuna em que ia fazer jubileu daqui a dois anos. É triste deixá-la.

O Júri sempre a minha escola, de onde me devia ter afastado, esta foi a minha escola, o meu fanal.

Tudo o que sei, aprendi no convívio dos cidadãos jurados, que me ensinaram a entender a explicação da lei não como uma forma tarifada da imposição de penas, mas como um instrumento de defesa da sociedade dentro de critérios eminentemente humanos, compreendendo os motivos e as razões profundas que, algumas vezes, levam as criaturas à prática de atos violentos ou desesperados, na defesa de seus afetos mais caros. Aprendi no Júri maciças lições de vida, presenciei gestos de solidariedade, vi decisões carregadas de sabedoria.

O Júri foi ponto de partida de uma longa atividade profissional.

Foi daqui, desta Tribuna, foi com o seu aval, que saí para uma incursão na vida política, em cargos eminentes. Não imaginava voltar, mas o meu fadário me trouxe novamente ao Tribunal do Júri.

Não arrefeceu o meu amor por esta Casa e por esta Tribuna, mas não é possível prosseguir mais.

É imprudente. Temo eu, receia minha família, que as coronárias não resistam por muito tempo aos debates tão desgastantes dos processos do Júri.

As lutas neste Tribunal são cheias de dificuldades, de imprevistos, de apreensões, de preocupações, sobretudo quando o advogado tem um verdadeiro sentimento de sua responsabilidade, quando tem a consciência de que dele depende a liberdade de um cidadão.

Mais pesada é essa responsabilidade quando se tem a convicção de que a causa é justa, de que não há razão para mandar o acusado para a prisão. Neste caso, como o Júri verá dentro em pouco, a condenação representaria apenas a satisfação de uma vindita.

Sim, seria iníquo e desnecessário mandar para o cárcere uma pessoa que pode ser útil à sua família e à vida social.

Cadeia não é solução, não recupera, não ressocializa, não regenera ninguém; avilta, degrada, corrompe.

Esse é o axioma que nem mais se precisa demonstrar e que todos hoje compreendem.

A segregação não ensina, nem é capaz de fazer com que a pessoa reaprenda a viver no meio social, dentro de sua coletividade; ao contrário, a reclusão é fonte de vícios, é geradora de revoltas, é um eficaz dissolvente do caráter.

A prisão adapta ao isolamento, jamais à vida em liberdade.

Senhores jurados, nestes processos, como o que hoje ides julgar, como em todos os casos submetidos à competência do Tribunal do Júri, se deve principiar pelo exame da personalidade dos protagonistas do fato, o que permite verificar a participação que a vítima sempre tem, maior ou menor, na eclosão da deflagração da tragédia.

O cidadão jurado percebe rapidamente quando o fato foi provocado pela vítima, e isso eu tive oportunidade de observar nestes 48 anos de profissão.

O jurado tem sempre uma justa percepção do quadro posto diante dos seus olhos e decide com aquele golpe de vista genial, de que falava o grande Magarinos Torres, juiz magnífico, amigo maior da instituição do Júri.

E cada caso concreto, os jurados sabem oferecer a solução adequada.

O Júri é uma justiça diferente da justiça togada, ele julga de consciência, não está adscrito a tarifas legais, a certos formalismos, não tem compromissos doutrinários.

O Júri julga de acordo com aquilo que considera justo, dentro de princípios de uma justiça imanente, dentro daquilo que na sua alma e consciência representa uma solução de verdade e de bom senso.

São bem diversos os critérios de julgamento da justiça profissional e da justiça dos jurados.

O juiz togado está jungido a regras legais para ele intransponíveis, por motivos técnicos e razões formais.

Há um limite que ele não pode ultrapassar, mesmo que a consciência lhe dite outra coisa.

Veja-se o brocardo latino, que ele é obrigado a obedecer: “Dura lex, sed lex”. Aí está a algema que manieta a liberdade de julgamento do juiz profissional.

Os jurados têm outra amplitude para decidir.

Se os critérios fossem idênticos, se o Júri julgasse da mesma forma que a justiça togada, não haveria necessidade de convocar 21 cidadãos, retirá-los de suas atividades, recrutá-los de seu trabalho, para que eles viessem fazer justiça a seus semelhantes, quando isso poderia ser feito pelo juiz togado, sozinho, como acontece em todos os processos.

O Júri é uma instituição democrática, que representa o povo dentro da justiça, julgando de consciência, com amplitude de visão, sem peias legais, julgando com o alto sentido finalístico de verificar se alguma pena deve ser aplicada ou se não o deve, se ela é útil ou se ela não é útil, se ela representa alguma vantagem para a sociedade ou se não existe essa vantagem.

Ao julgar as causas de sua competência, que são os crimes contra a vida, o Júri, necessariamente, há de querer conhecer, precisa conhecer, antes de tudo, as personagens envolvidas na tragédia.

Essas personagens devem ser trazidas, com detalhes, ao conhecimento dos jurados: a sua vida, os seus antecedentes, a sua origem, a sua formação, as suas atividades, para se poder formar um juízo, para se poder tomar uma decisão justa, para verificar no binômio acusado-vítima até que ponto a participação da vítima contribui, mais ou menos fortemente, para a deflagração da tragédia.

Esse moço é um passional, na conhecida classificação de Enrico Ferri, é um criminoso de ocasião, não é um delinquente habitual. O seu ato de violência é um gesto isolado em sua vida, produto de um desvario, num momento de desespero.

Vejamos, primeiro, quem é Raul Street.

Aí, Evandro Lins e Silva passou a dissertar sobre a personalidade do réu, a sua família, seus pais, sua formação, suas atividades e, enfim, a sua vida.

Na acusação particular funcionaram dois grandes criminalistas brasileiros: George Tavares e Evaristo Filho, que auxiliaram o acusador público.

A certa altura, o advogado Evandro Lins e Silva proclamou: “A acusação particular é luxo, porque há o Ministério Público, tão bem representado pelo digno dr. Promotor. Ele podia fazer a acusação sozinho. Não precisava de ajudantes. Pois bem, srs. Jurados, vieram mais três, vieram mais três!!! (Apartes sucessivos e sussurros no plenário).

Querem tomar o tempo da defesa (apartes insistentes). Os meus colegas tiveram a gentileza de me entregar esta sustentação, porque viam um dia diferente para mim, o último da minha carreira. Por isso, me proporcionaram...

“O Dr. Evaristo de Moraes Filho – Nós sabemos que não, esperamos que não...”

“Evandro Lins e Silva – Se v.exa. tivesse a desventura de cometer um crime, eu iria defendê-lo. Pode estar certo, é a única hipótese. Se v. exa. quiser me levar à Tribuna outra vez, faça isso... Então aí eu vou defender o colega, o filho do meu mestre Evaristo de Moraes.

“Evaristo de Moraes Filho – Romeiro Neto durante cinco anos disse isso, despediu-se do Júri, dizendo: “É o meu último Júri”... (risos).”

“Evandro Lins e Silva – Tenho a certeza de que não vai acontecer isso, porque eu tomei a minha pressão antes de vir para cá. Ainda tomei outras medidas necessários. Não confio mais nas coronárias... A minha idade não permite mais que eu tenha confiança...”

“Evaristo de Moraes Filho – O Júri está vendo que v. exa. está em plena forma.”

“Evandro Lins e Silva – Com a graça de Deus... (risos).”

“Evaristo de Moraes Filho – Olhe aí, conquistando a platéia”.

“Evandro Lins e Silva – Com a graça de Deus, com a graça de Deus, eu sou um velho advogado (risos)”.

“Evaristo de Moraes Filho – Enternecendo a todos, fazendo sorrir...”

“Evandro Lins e Silva – Eu não conquisto mais ninguém... Sou um velho... V.exa. sim, com o seu talento, seu brilho , seu corpo jovem conquistará a causa! (risos da platéia). Agora, não conquistará a causa! (risos da platéia). Porque a gente não muda processo, ninguém muda processo. Ninguém muda. Então é preciso cair dentro dos autos, e quando a gente cai dentro dos autos, a acusação que não tem razão, naufraga, soçobra.”

Suspensa a sessão por alguns minutos, retorna a defesa com o criminalista Evandro Lins e Silva: “Senhores jurados! Procurarei represar, neste tempo que me resta, os fundamentos da defesa, no seu sentido jurídico, do ponto de vista da instituição do Júri.

Não estou falando para juízes togados, estou falando para jurados. Vou pleitear do Júri uma solução humana, uma solução que me parece justa e acredito que os jurados concordem comigo, porque é a solução mais adequada, do ponto de vista familiar, social, humano.

A profissão do advogado é paradoxal: quanto mais fácil a causa, maior a sua responsabilidade. E esta causa, eu disse desde o começo, que a mim me parecia, à minha compreensão de velho advogado, que passou também pelo Ministério Público – eu fui procurador-geral da República - e que foi também juiz, no Supremo Tribunal Federal, sempre me pareceu de fácil sustentação perante o Júri.

Vamos procurar, senhores jurados, encontrar uma solução.

A lei obriga o Júri a responder a quesitos, que envolvem questões técnicas, mas o Júri não tem compromissos doutrinários. O Júri é finalístico e quer chegar a determinado resultado. Assim, proposta uma justa solução, o Júri pode dá-la, o Júri tem soberania, o Júri é soberano em suas decisões.

O Júri pode decidir contra a prova dos autos? Sim, pode. O Júri pode negar a autoria? Pode negar a autoria!

E se ele negar duas vezes, acabou-se, a decisão é definitiva, é soberana. Senhores jurados, temos que insistir no binômio acusado-vítima. O Júri já viu que este moço apaixonou-se, apaixonou-se perdidamente. E a paixão sempre é cega, não é boa conselheira. Quando a paixão se torna obsessiva, quando a pessoa se deixa marcar por ela, vem o ciúme a dominá-lo, ele vai se escravizando à paixão, vai se deixando subjugar pelo objeto amado.

E, então, toda a visão que ele tem dos valores da vida se deforma. Ele passa a viver em função daquela idéia fixa, que é a mulher amada. É claro que ele vai se descontrolando em tudo o que faz, minadas as suas resistências pela paixão doentia que o avassala.

Isso acontece, como diz neste livro magnífico um dos grandes juízes do Brasil, que se chama Edgard de Moura Bittencourt, livro sobre a vítima, Vitimologia, a Dupla Penal Delinquente-Vítima, quando um homem cai nas garras de uma mulher fatal.

A “mulher fatal”, esse é o exemplo dado para o homem se desesperar, para o homem ser levado, às vezes, à prática de atos em que ele não é idêntico a si mesmo, age contra a sua própria natureza.

Senhores jurados, a “mulher fatal”, encanta, seduz, domina, como foi o caso de Raul Fernando do Amaral Street.

Meu mestre Evaristo de Moraes, dizendo ser idêntica a opinião de Ferri, Corsi, Bonano, Florian, Melussi e Holtz, escreveu em Criminalidade Passional, à fl. 69: “Quando a boa índole do criminoso, o seu passado honesto, a qualidade moral e social dos motivos e a forma apenas violenta da execução do crime, seguida de manifestações de arrependimento ou de remorso, mostrarem que o mesmo crime – passional ou emotivo – foi um triste e doloroso episódio na vida normal do criminoso, não há razão para lhe ser aplicada alguma pena, ainda mesmo que não desonrosa. Toda repressão seria inútil e, como tal, iníqua.”

Depois de dissertar longamente sobre o estado de legítima defesa em que se encontrava o seu cliente, Evandro Lins e Silva começou a peroração: “Senhores jurados, eu me despeço desta Tribuna, e vou deixá-la com muita saudade, porque a minha vida está ligada ao Júri que eu, de agora em diante, para não ficar longe dela, virei assistir aos meus colegas Heleno, Evaristo, George, todos eles, dr. Fador, dr. Eden... Eu gostaria de assistir a Júris...mas não gosto, não.

Fico tão agoniado quando estou assistindo a um Júri, que tenho vontade de interferir, quero participar.

Isso torna impossível assistir tranqüilamente a um Júri, eu me angustio, quero intervir.

São quase 50 anos de convívio com o Júri.

Srs. Jurados, chego ao fim, tenho pudor das despedidas mais dramáticas, talvez outros beijassem a Tribuna para se retirar.

Era assim que se fazia antigamente, de modo teatral, e os advogados, como o antecessor de Evaristo de Moraes no Júri, o notável Alberto de Carvalho, quando o promotor agredia o réu, ele retirava a beca e a jogava sobre a cabeça do acusado, para que as injúrias não o atingissem e usava o latim habitual na época: “Reo res sacra est” – o réu é uma sagrada.

Estes gestos espetaculares ele repetia sempre.

Certa vez, Evaristo de Moraes defendia o próprio pai no Júri, e ele, Alberto de Carvalho, depois da defesa brilhantíssima de Evaristo, saiu da platéia, subiu à Tribuna e osculou, como diz o livro, beijou a testa do grande Evaristo.

Jurados, despeço-me do Júri e, para ventura minha, a despedida se dá neste lindo sítio do Brasil, neste lindo recanto do mundo, nesta cidade magnífica e deslumbrante, que é Cabo Frio.

Jurados, procurei cumprir o meu dever de velho advogado. De fato, foi um risco que assumi, contra a vontade da minha família, dos meus filhos, que aqui estão todos presentes.

Saio realmente desta Tribuna, despedindo-me dela e esperando que a emoção não me domine neste final.

Jurados, julgai-o. Eu confio na vossa consciência, eu confio na vossa justiça, eu sempre confiei no Tribunal do Júri do meu país, e hoje, o meu país, no Júri, está representado pelos jurados da cidade de Cabo Frio.

Absolvei-o, jurados, e tereis feito justiça! (Aplausos prolongados, o orador não contém as lágrimas e é cumprimentado por seus colegas.) O conselho de sentença aceitou a tese do excesso culposo no estado de legítima defesa e o juiz fixou a pena de dois anos de detenção ao réu, concedendo-lhe o direito ao “sursis”. A assistência aplaudiu a proclamação do resultado.

Posteriormente, o Tribunal de Justiça do Estado do Rio anulou o julgamento, mandando Raul Fernando Street a novo Júri. Neste segundo julgamento, no qual não participou o advogado Evandro Lins e Silva, o réu foi condenado a cumprir pena de homicídio.


http://www.realfestivalmusic.co.uk


Expresso 2222

Começou a circular o Expresso 2222
Que parte direto de Bonsucesso pra depois
Começou a circular o Expresso 2222
Da Central do Brasil
Que parte direto de Bonsucesso
Pra depois do ano 2000

Dizem que tem muita gente de agora
Se adiantando, partindo pra lá
Pra 2001 e 2 e tempo afora
Até onde essa estrada do tempo vai dar
Do tempo vai dar
Do tempo vai dar, menina, do tempo vai

Segundo quem já andou no Expresso
Lá pelo ano 2000 fica a tal
Estação final do percurso-vida
Da terra-mãe concebida
De vento, de fogo, de água e sal
De água e sal, de água e sal
Ô, menina, de água e sal

Dizem que parece o bonde do morro
Do Corcovado daqui
Só que não se pega e entra e senta e anda
O trilho é feito um brilho que não tem fim
Que não tem fim
Que não tem fim
Ô, menina, que não tem fim

Nunca se chega no Cristo concreto
De matéria ou qualquer coisa real
Depois de 2001 e 2 e tempo afora
O Cristo é como o que foi visto subindo ao céu
Subindo ao céu
Num véu de nuvens brilhantes subindo ao céu

Gilberto Gil.

Wednesday, February 07, 2007

Gosto da palavra “fornida”. É uma palavra que diz tudo o que quer dizer. Se você lê que uma mulher é “bem fornida”, sabe exatamente como ela é. Não gorda mas cheia, roliça, carnuda. E quente. Talvez seja a semelhança com “forno”. Talvez seja apenas o tipo de mente que eu tenho.

Não posso ver a palavra “lascívia” sem pensar numa mulher, não fornida mas magra e comprida. Lascívia, imperatriz de Cântaro, filha de Pundonor. Imagino-a atraindo todos os jovens do reino para a cama real, decapitando os incapazes pelo fracasso e os capazes pela ousadia.

Um dia chega a Cântaro um jovem trovador, Lipídio de Albornoz. Ele cruza a Ponte de Safena e entra na cidade montado no seu cavalo Escarcéu. Avista uma mulher vestindo uma bandalheira preta que lhe lança um olhar cheio de betume e cabriolé. Segue-a através dos becos de Cântaro até um sumário - uma espécie de jardim enclausurado -, onde ela deixa cair a bandalheira. É Lascívia. Ela sobe por um escrutínio, pequena escada estreita, e desaparece por uma porciúncula. Lipídio a segue. Vê-se num longo conluio que leva a uma prótese entreaberta. Ele entra. Lascívia está sentada num trunfo em frente ao seu pinochet, penteando-se. Lipídio, que sempre carrega consigo um fanfarrão (instrumento primitivo de sete cordas), começa a cantar uma balada. Lascívia bate palmas e chama:

- Cisterna! Vanglória!

São suas escravas que vêm prepará-la para os ritos do amor. Lipídio desfaz-se de suas roupas - o sátrapa, o lúmpen, os dois fátuos - até ficar só de reles. Dirige-se para a cama cantando uma antiga minarete. Lascívia diz:

- Cala-te, sândalo. Quero sentir o seu vespúcio junto ao meu passe-partout.

Atrás de uma cortina, Muxoxo, o algoz, prepara seu longo cadastro para cortar a cabeça do trovador.

A história só não acaba mal porque o cavalo de Lipídio, Escarcéu, espia pela janela na hora em que Muxoxo vai decapitar seu dono, no momento entregue aos sassafrás, e dá o alarme. Lipídio pula da cama, veste seu reles rapidamente e sai pela janela, onde Escarcéu o espera.

Lascívia manda levantarem a Ponte de Safena, mas tarde demais. Lipídio e Escarcéu já galopam por motins e valiums, longe da vingança de Lascívia.

*

“Falácia” é um animal multiforme que nunca está onde parece estar. Um dia um viajante chamado Pseudônimo (não é o seu verdadeiro nome) chega à casa de um criador de falácias, Otorrino. Comenta que os negócios de Otorrino devem estar indo muito bem, pois seus campos estão cheios de falácias. Mas Otorrino não parece muito contente. Lamenta-se:

- As falácias nunca estão onde parecem estar. Se elas parecem estar no meu campo é porque estão em outro lugar.

E chora:

- Todos os dias, de manhã, eu e minha mulher, Bazófia, saímos pelos campos a contar falácias. E cada dia há mais falácias no meu campo. Quer dizer, cada dia eu acordo mais pobre, pois são mais falácias que eu não tenho.

- Lhe faço uma proposta - disse Pseudônimo. - Compro todas as falácias do seu campo e pago um pinote por cada uma.

- Um pinote por cada uma? - disse Otorrino, mal conseguindo disfarçar o seu entusiasmo. - Eu devo não ter umas cinco mil falácias.

- Pois pago cinco mil pinotes e levo todas as falácias que você não tem.

- Feito.

Otorrino e Bazófia arrebanharam as cinco mil falácias para Pseudônimo. Este abre o seu comichão e começa a tirar pinotes invisíveis e colocá-los na palma da mão estendida de Otorrino.

- Não estou entendendo - diz Otorrino. - Onde estão os pintores?

- Os pintores são como as falácias - explica Pseudônimo. - Nunca estão onde parecem estar. Você está vendo algum pinote na sua mão?

- Nenhum.

- É sinal de que eles estão aí. Não deixe cair.

E Pseudônimo seguiu viagem com cinco mil falácias, que vendeu para um frigorífico inglês, o Filho and Sons. Otorrino acordou no outro dia e olhou com satisfação para o seu campo vazio. Abriu o besunto, uma espécie de cofre, e olhou os pinotes que pareciam não estar ali!

Na cozinha, Bazófia botava veneno no seu pirão.

*

“Lorota”, para mim, é uma manicura gorda. É explorada pelo namorado, Falcatrua. Vivem juntos num pitéu, um apartamento pequeno. Um dia batem na porta. É Martelo, o inspetor italiano.

- Dove está il tuo megano?

- Meu quê?

- Il fistulado del tuo matagoso umbráculo.

- O Falcatrua? Está trabalhando.

- Sei. Com sua tragada de perônios. Magarefe, Barroco, Cantochão e Acepipe. Conheço bem o quintal. São uns melindres de marca maior.

- Que foi que o Falcatrua fez?

- Está vendendo falácia inglesa enlatada.

- E daí?

- Daí que dentro da lata não tem nada. Parco manolo!


Eu não entendia por que meu pai tinha todos aqueles livros encadernados, guardados com aquele carinho, e ao mesmo tempo me dizia para ter cuidado: “Cuidado com as leituras, cuidado com as leituras!” Havia uma edição ilustrada das Mil e Uma Noites, odaliscas carnudas em papel acetinado que eu não sabia se olhava ou se cheirava, a Ilíada - “Esqueça os gregos!” - e até uma edição com capa de couro e letra gravada em ouro de O Capital, que eu olhei só uma vez, procurando as figuras. Um dia ele me encontrou sentado no chão da biblioteca, com um livro aberto na frente, namorando uma gravura sombria do mar, e decidiu fazer uma das suas declarações em tom de oratória. Ele falava do mesmo jeito para um filho menor, um colega de congregação ou um jardineiro, e certa vez fora visto discursando animadamente para um pipoqueiro sobre o simbolismo das chagas de Cristo. Disse: “Todos estes livros, todas estas histórias, todas estas idéias, todas estas palavras não significariam nada - nada! - se não fosse uma coisa. Você sabe o quê?” Não adiantou eu fazer “não” com a cabeça, ele não estava me olhando. “Uma coisa que dá sentido a tudo, uma coisa sem a qual as palavras são apenas manchas no papel, todas as histórias não passam de encantações e todas as idéias nascem mortas. O que é? Me diga, o que é?” Eu disse que não sabia. Ele baixou a voz, dramaticamente, e respondeu sua própria pergunta. “O pecado.” “Certo”, disse eu, como se tivesse entendido e concordava sem hesitação. “O pecado!”, gritou ele. “O que nos condena é o que nos salva. Ou, pelo menos, salva a nossa literatura.” Ele sentou na sua poltrona preferida, que tinha o couro rachado. Estava, agora, falando sozinho. “Muitas vezes você vai ler um livro e sente que ali falta alguma coisa. Idéias, ótimas. Redação, perfeita. Erudição. Estilo. Tudo. Mas falta uma noção do pecado. Você sente que o autor reuniu todos os ingredientes mas esqueceu o principal. Quem não tem a convicção do pecado nunca fará a grande literatura. Você concorda?” “Certo”, respondi, cem por cento de acordo. Ele pareceu se dar conta da minha idade e fez um adendo. “É possível manjar branco sem a essência do coco?” “Impossível”, concordei. Manjar branco era uma das paixões dele. Anos mais tarde concluí que ele mantinha a biblioteca como um ex-alcoólatra mantém uma adega bem estocada, para ter sempre à mão a magnitude da sua renúncia. Ou um vertiginoso que escolhe viver à beira do abismo, como um desafio. Depois descobri que aquela era sua vida clandestina. Uma das suas vidas clandestinas. Eu o entendi depressa demais.

VERÍSSIMO, L. F. - http://portalliteral.terra.com.br/verissimo/index.htm

CHEGA DE SONHO

Ai, de que vale sonhar
Se ela não quis
Inspirar a canção
Que eu não fiz
Só faria se fosse por ela

É, no sonho o coração
Revela porque
No meu peito ele dói
Sonhando eu sei
Que ela se foi

Mas se ela voltasse
Se ela voltasse
É que ia ser bom
Meus versos fluiriam bem mais fácil
E eu os declamaria em alto e bom som

Eu faria a canção
Mais bonita que eu já fiz
Chega de sonho
Eu mereço ser feliz

Papaterra, Fran.

Numquam se plus agere quam nihil cum ageret, numquam minus solum esse quam cum solus esset.

("Nunca hacía más que cuando nada hacía, y nunca se hallaba menos solo que cuando estaba solo") - CATÓN

Cada uno de nosotros todo lo sabe como en sueños, pero cuando está despierto, em cambio, todo lo ignora. - PLATÓN, Político

Epígrafes à La Vida del Espíritu; Hannah Arendt - Tradução: Carmen Corral. Paidós Básica.

Sunday, February 04, 2007

A Esquadra do Bagaço

Pra começar, o goleiro Mamadu (Guiné Bissau). Na sua frente, uma zaga formada por Mulenga (seleção da Zâmbia), John Boa (Detroit), Vavadio (Charleroi, da Bélgica) e o infantil Shopetim Mamo (Tirana, Albânia). No meio campo, Janos Vamos (Ferencvaros, Hungria) tem que se desdobrar para cobrir o lento Seródio (Farense, Portugal), enquanto o volante Moita (Boavista, Portugal) se esconde do jogo e o armador Trivellas (Grécia) só faz lance de efeito, sem nenhum resultado prático. Talvez por essa absoluta ausência de organização, o atacante Miko Simula (Lahti, Finlândia) se limita a cavar faltas, enquanto o sombrio Posthumus (Lierse, Bélgica) vaga como uma alma penada entre os defensores rivais.

Enviado por Alfredo Gabrielleschi e Leandro Mattera para a coluna FUTEBOL de José Roberto Torero.

Saturday, February 03, 2007

I. RESPONSABILIDADE

Responsabilidade pessoal sob a ditadura

Inicialmente, gostaria de comentar a controvérsia um tanto furiosa desencadeada pelo meu livro Eichmann em Jerusalém. Uso deliberadamente a palavra "desencadeada", em vez da palavra "causada", pois, como já tenho apontado, uma grande parte da controvérsia se dirigia a um livro que jamais fora escrito. Por isso, a minha primeira reação foi desconsiderar toda a questão com as famosas palavras de um espirituoso austríaco: "Não há nada tão divertido quanto a discussão de um livro que ninguém leu". Como a controvérsia continuou, entretanto, e como, especialmente nos seus últimos estágios, mais e mais vozes não só me atacavam pelo que eu nunca tinha dito, mas, ao contrário, passaram a me defender por isso, comecei a compreender que talvez houvesse algo mais nesse exercício levemente soturno do que sensação ou diversão. Tive igualmente a impressão de que algo mais do que "emoções" estava envolvido, isto é, algo mais do que mal-entendidos honestos, que em alguns casos causaram um autêntico colapso de comunicação entre a autora e o leitor; e também algo mais do que as distorções e falsificações de grupos de interesse, que tinham menos medo do meu livro que da possibilidade de que ele desse início a outro exame imparcial e detalhado do período em questão.

A controvérsia invariavelmente se propunha a toda espécie de questões estritamente morais, muitas das quais nunca tinham me ocorrido, enquanto outras tinham sido mencionadas por mim apenas de passagem. Eu apresentara um relato factual do julgamento, e até o subtítulo do livro, Um relato sobre a banalidade do mal, aos meus olhos era tão evidentemente sustentado pelos fatos do processo que eu não sentia ser necessária mais nenhuma explicação. Eu apontara para um fato que sentia ser chocante por contradizer as nossas teorias a respeito do mal, portanto, para algo verdadeiro, mas não plausível.

De certo modo, eu tinha aceitado como natural que todos ainda acreditamos, junto com Sócrates, que é melhor sofrer o mal do que infligi-lo. Essa crença revelou-se um erro. Havia uma convicção difundida de que é impossível resistir a qualquer tipo de tentação, de que não se podia confiar em nenhum de nós, nem sequer esperar que resistíssemos no momento crítico, de que ser tentado e ser forçado é quase a mesma coisa, enquanto, nas palavras de Mary McCarthy, a primeira a identificar essa falácia: "Se alguém lhe aponta um revólver e diz: 'Mate o seu amigo, senão vou matar você', ele o está tentando, só isso". Embora uma tentação em que se corre perigo de vida possa ser uma desculpa legal para um crime, ela não é certamente uma justificação moral. Finalmente, e de modo muito surpreendente, já que se tratava de um julgamento cujo resultado, invariavelmente, era a produção de um juízo, fiquei sabendo que o próprio julgar é errado: não pode julgar quem não estava presente. Incidentalmente, esse foi o argumento de Eichmann contra o julgamento da corte distrital. Quando informado de que houvera alternativas e de que poderia ter se furtado aos seus deveres assassinos, ele insistiu em que essas eram lendas do pós-guerra, nascidas da visão posterior aos acontecimentos e sustentadas por pessoas que não sabiam ou tinham esquecido como as coisas realmente tinham se passado.

Há várias razões pelas quais a discussão do direito ou da capacidade de julgar incide na mais importante questão moral. Duas coisas estão implicadas nesse ponto: primeiro, como posso distinguir o certo do errado, se a maioria ou a totalidade do meu ambiente prejulgou a questão? Quem sou eu para julgar? E, segundo, em que medida, se é que há alguma medida, podemos julgar acontecimentos ou ocorrências passados em que não estávamos presentes? Quanto à última, parece gritantemente óbvio que nenhuma historiografia e nenhum procedimento no tribunal seriam possíveis se negássemos a nós mesmos essa capacidade. Seria possível dar um passo além e sustentar que há muito poucos exemplos em que, ao usar a nossa capacidade de julgar, não julgamos em retrospectiva, e isso vale tanto para o historiador quanto para o juiz no tribunal, que podem ter boas razões para desconfiar dos relatos das testemunhas oculares ou do julgamento daqueles que estavam presentes. Além do mais, como essa questão de julgar sem estar presente é geralmente ligada com a acusação de arrogância, quem jamais afirmou que, ao julgar uma ofensa, pressuponho que eu próprio seria incapaz de cometê-la? Mesmo o juiz que condena um homem por assassinato ainda pode dizer: e assim, se não fosse pela graça de Deus, procedo eu!

Assim, prima facie, tudo isso parece tolice elaborada, mas quando muitas pessoas, sem terem sido manipuladas, começam a falar tolice, e se entre elas estão pessoas inteligentes, há geralmente algo mais envolvido do que apenas tolice. Existe em nossa sociedade um medo bem difundido de julgar que não tem nada a ver com a frase bíblica "Não julgues, para que não sejas julgado", e se esse medo fala em termos de "atirar a primeira pedra", invoca essa frase em vão. Pois, por trás da não-vontade de julgar, oculta-se a suspeita de que ninguém é um agente livre, e com isso a dúvida de que alguém seja responsável pelo que fez ou de que se poderia esperar que respondesse pelos seus atos. No momento em que se propõem questões morais, mesmo de passagem, aquele que as propõe será confrontado com essa assustadora falta de autoconfiança e conseqüentemente de orgulho, e também com uma espécie de falsa modéstia que ao dizer: "Quem sou eu para julgar?", que realmente significa: "Somos todos parecidos, igualmente ruins, e aqueles que tentam (ou fingem) permanecer parcialmente decentes são santos ou hipócritas, e em qualquer dos casos deveriam nos deixar em paz". Daí o enorme alarido assim que alguém atribui uma culpa específica a uma pessoa em particular, em vez de pôr a culpa de todos os atos ou acontecimentos em tendências históricas e movimentos dialéticos; em suma, em alguma necessidade misteriosa que funciona pelas costas dos homens e confere a tudo o que fazem algum tipo de significado mais profundo. Desde que se tracem as raízes dos atos de Hitler até Platão, Joaquim di Fiore ou Nietzsche, até a ciência e tecnologia moderna, ou até o niilismo ou a Revolução Francesa, tudo está bem. Mas assim que se chama Hitler de assassino de massas - admitindo, claro, que esse assassino de massas específico era politicamente muito talentoso e também que todo o fenômeno do Terceiro Reich não pode ser explicado unicamente pelo que Hitler foi e como ele influenciou as pessoas - há um consenso geral de que esse julgamento da pessoa é vulgar, carece de sofisticação, e não se deveria permitir que interferisse na interpretação da história. Assim, para lhes dar outro exemplo de uma controvérsia contemporânea, o enredo da peça de Rolf Hochhuth, O vigário, em que o papa Pio XII é acusado por seu silêncio singular na época dos grandes massacres de judeus no Leste, foi imediatamente contestado, e não apenas pela gritaria da hierarquia católica, o que afinal é compreensível. Foi também contestado pelas falsificações daqueles cuja habilidade inata é produzir imagens: Hochhuth, tem-se afirmado, acusou o papa de ser o principal culpado, para desculpar Hitler e o povo alemão, o que é uma simples inverdade. Mais significativa em nosso contexto tem sido a repreensão de que é "certamente" superficial acusar o papa, a acusação atinge toda a cristandade; ou de forma ainda mais incisiva: "Sem dúvida, há razões para uma acusação séria, mas o réu é toda a raça humana". A idéia que gostaria de propor neste momento vai além da falácia bem conhecida do conceito de culpa coletiva, como ele foi aplicado pela primeira vez ao povo alemão e ao seu passado coletivo - toda a Alemanha é acusada, bem como toda a história alemã desde Lutero a Hitler -, o que, na prática, se transformou numa caiação altamente eficaz para todos aqueles que realmente tinham feito alguma coisa, pois quando todos são culpados ninguém o é. Basta colocar a cristandade ou toda a raça humana no lugar originalmente reservado à Alemanha para perceber, ou assim poderia parecer, o absurdo do conceito, pois agora até mesmo os alemães deixaram de ser culpados: a culpa não é de ninguém individualmente, mas do conceito de culpa coletiva. Além dessas considerações, o que gostaria de apontar é como deve estar profundamente arraigado o medo de julgar, dar nomes e atribuir culpa - especialmente, no que diz respeito àqueles no exercício do poder ou em alta posição, mortos ou vivos -, se essas manobras intelectuais desesperadas estão sendo invocadas como ajuda. Pois não é óbvio que a cristandade sobreviveu com bastante elegância a muitos papas que foram piores do que Pio XII, precisamente porque toda a cristandade nunca foi a acusada? E o que se deve dizer daqueles que preferem jogar toda a humanidade pela janela, por assim dizer, para salvar um homem de alta posição, e para salvá-lo da acusação que não é nem de ter cometido um crime, mas apenas uma falha reconhecidamente grave de omissão?

É afortunado e prudente que não exista nenhuma lei para falhas de omissão e que nenhum tribunal humano seja invocado para julgá-las. Mas é igualmente afortunado que ainda exista na sociedade uma instituição em que é quase impossível escapar das questões de responsabilidade pessoal, em que todas as justificações de natureza abstrata e não específica - do Zeitgeist até o complexo de Édipo - entram em colapso, em que não são julgados sistemas, tendências ou o pecado original, mas homens de carne e osso como os senhores e eu, cujos atos ainda são certamente atos humanos, mas que comparecem perante o tribunal porque transgrediram alguma lei cuja manutenção consideramos essencial para a integridade de nossa humanidade comum. As questões legais e morais não são absolutamente idênticas, mas possuem uma certa afinidade, porque ambas pressupõem o poder de julgamento. Nenhum repórter de tribunal, se sabe o que está fazendo, pode evitar o envolvimento com essas questões. Como podemos distinguir o certo do errado, independentemente do conhecimento da lei? E como podemos julgar sem ter estado na mesma situação?

É nesse ponto que acho apropriado fazer o meu segundo comentário pessoal. Se a comoção causada pela minha "participação no julgamento" mostrou, como acho que realmente revelou, o desconforto que a maioria de nós sente quando confrontada com questões morais, é melhor admitir que meu desconforto não é menor. A minha primeira formação intelectual ocorreu numa atmosfera em que ninguém prestava muita atenção a questões morais; fomos criados com a pressuposição: Das Moralische versteht sich von selbst, a conduta moral é algo natural. Ainda me lembro muito bem da minha opinião juvenil sobre retidão moral, que em geral chamamos de caráter; toda insistência nessa virtude teria me parecido hipócrita, porque isso também achávamos ser algo natural e assim de pouca importância, uma qualidade não decisiva, por exemplo, na avaliação de uma pessoa. Sem dúvida, de vez em quando éramos confrontados com a fraqueza moral, com a falta de firmeza ou lealdade, com essa rendição curiosa, quase automática, à pressão, especialmente da opinião pública, que é tão sintomática das camadas educadas de certas sociedades, mas não fazíamos idéia de como essas questões eram sérias e menos ainda de aonde poderiam nos levar. Não conhecíamos muito sobre a natureza desses fenômenos, e receio que nos importávamos ainda menos. Bem, aconteceu que nos seria dada uma ampla oportunidade de aprender. Para a minha geração e as pessoas da minha origem, a lição começou em 1933 e terminou quando não só os judeus alemães, mas o mundo inteiro, tiveram notícia das monstruosidades que ninguém julgava possíveis no início. O que aprendemos desde então, e não é de modo algum pouco importante, pode ser contado como adições e ramificações do conhecimento adquirido durante aqueles primeiros doze anos, de 1933 a 1945. Muitos de nós precisamos dos últimos vinte anos para nos reconciliar com o que aconteceu, não em 1933, mas em 1941, 1942 e 1943, até o amargo fim. E com isso não me refiro à dor e tristeza pessoais, mas ao próprio horror com o qual, como podemos ver agora, nenhum dos grupos interessados foi capaz de se reconciliar. Os alemães cunharam para todo esse complexo o termo altamente questionável de seu "passado incontrolado"(unmastered past). Bem, a impressão que temos hoje, depois de tantos anos, é que esse passado alemão ainda continua a ser de certo modo incontrolável para uma boa parte do mundo civilizado. Na época o próprio horror, na sua nua monstruosidade, parecia, não apenas para mim, mas para muitos outros, transcender todas as categorias morais e explodir todos os padrões de jurisdição; era algo que os homens não podiam punir adequadamente, nem perdoar. E nesse horror sem palavras, receio, todos tendemos a esquecer as lições estritamente morais e controláveis que tínhamos aprendido antes, e que nos seriam ensinadas de novo, em inúmeras discussões, tanto dentro como fora dos tribunais.

Para esclarecer a distinção entre o horror inexprimível, no qual não se aprende nada, e as experiências não de todo horríveis, mas freqüentemente repulsivas, em que a conduta das pessoas está sujeita a julgamentos normais, permitam-me mencionar primeiro um fato que é óbvio, mas raramente mencionado. O que importava na nossa primeira educação não teórica em moralidade nunca foi a conduta do verdadeiro culpado, de quem, mesmo então, ninguém em sã consciência esperava senão o pior. Assim, ficávamos ofendidos mas não moralmente perturbados, com o comportamento bestial dos membros das tropas de assalto nos campos de concentração e nos porões de tortura da polícia secreta, e teria sido realmente estranha a indignação moral com os discursos dos manda-chuvas nazistas no poder, cujas opiniões tinham sido notórias havia anos. O novo regime nos propunha então nada mais do que um problema político muito complexo, e um de seus aspectos era a introdução da criminalidade no domínio público. Acho que também estávamos preparados para as conseqüências do terror cruel, e teríamos admitido de bom grado a probabilidade de esse tipo de medo acovardar a maioria dos homens. Tudo isso era terrível e perigoso, mas não propunha problemas morais. A questão moral surgiu apenas com o fenômeno da "coordenação", isto é, não com a hipocrisia inspirada no medo, mas com esse desejo muito primitivo de não perder o trem da História com essa como que honesta mudança de opinião, da noite para o dia, que acometeu uma grande maioria das figuras públicas em todos os procedimentos da vida e em todas as ramificações da cultura, acompanhada, como foi, pela incrível facilidade com que amizades de vidas inteiras foram rompidas e abandonadas. Em suma, o que nos perturbou não foi o comportamento de nossos inimigos, mas o de nossos amigos, que não tinham feito nada para produzir essa situação. Eles não eram responsáveis pelos nazistas, estavam apenas impressionados com o sucesso nazista e incapacitados de opor o seu próprio julgamento ao veredicto da História, assim como eles o interpretavam. Sem levar em consideração o colapso quase universal, não da responsabilidade pessoal, mas do julgamento pessoal nos primeiros estágios do regime nazista, é impossível compreender o que realmente aconteceu. É verdade que muitas dessas pessoas logo se decepcionaram, sendo bem conhecido que a maioria dos homens de 20 de julho de 1944, que pagaram com a vida por sua conspiração contra Hitler, tinha estado ligada ao regime em algum momento. Ainda assim, creio que essa primeira desintegração moral na sociedade alemã, mal perceptível aos de fora, foi como um ensaio geral para o seu colapso total, que deveria ocorrer durante os anos da guerra.

ARENDT, Hannah. Responsabilidade e Julgamento; www.companhiadasletras.com.br

Os ensaios, cursos e palestras reunidos em Responsabilidade e Julgamento foram produzidos nos anos 60 e 70. Neles, a filósofa Hannah Arendt propõe uma ética dirigida à visibilidade no domínio público da ação e da política, evocando mais uma vez, como já o fizera em A Condição Humana, o papel decisivo da reflexão e da crítica como atividades intelectuais imprescindíveis.


Aqui Arendt aborda o tema da moralidade tendo em vista uma proposição ética da vida contemplativa. Os ensaios relocam questões a respeito do pensar, do querer e do julgar no domínio da visibilidade - estabelecida, no mundo das imagens, como parâmetro de valoração.


As colocações da autora se mostram fundamentais para a construção de uma ética da responsabilidade no mundo pós-totalitário, em que a hierarquia dos valores varia segundo as oscilações da aparência e a alienação impede o discernimento.

‘I suppose you fellows remember I did once turn fresh-water sailor for a bit’ (…) ‘I don’t want to bother you much with what happened to me personally’ (…) ‘yet to understand the effect of it on me you ought to know how I got out there, what I saw, how I went up that river to the place where I first met the poor chap. It was the farthest point of navigation and the culminating point of my experience. It seemed somehow to throw a kind of light on everything about me – and into my thoughts. It was sombre enough, too – and pitiful – not extraordinary in any way – not very clear either. No, not very clear. And yet it seemed to throw a kind of light.’

CONRAD, Joseph – Heart of Darkness

“Acho que vocês estão lembrados da ocasião em que fui marinheiro de água doce por um certo tempo” (...) “Não desejo aborrecê-los demais com o que me sucedeu pessoalmente” (...) “Contudo, para que compreendam o efeito que essa viagem causou em mim vocês precisam saber como fui parar tão longe, que foi que eu vi e como subi aquele rio até o lugar onde fiquei conhecendo aquele pobre sujeito. Ali era o ponto mais remoto alcançado pela navegação fluvial, e foi o ponto culminante da minha experiência. De certa forma foi como se tivesse sido lançada uma luz sobre tudo o que me cercava, e sobre a minha mente também. Mas foi igualmente uma experiência bastante tenebrosa, além de lastimável, ainda que de forma alguma extraordinária, nem muito clara também. Nada clara, mesmo. No entanto, pareceu lançar uma certa luz sobre as coisas.”

Tradução: Regina Régis Junqueira

"Arendt emerge, na atualidade, como a pensadora política de uma modernidade atormentada que vacila, em equilíbrio, no limiar, entre um passado irredutível e um presente imprevisível, entre o que é tão recente que ainda não foi tocado por nenhuma história, tão deteriorado que não chegou a envelhecer, tão inédito que não chegou a nascer e está morto, tão novo que algo nele permanece à espera de conclusão. [...] Talvez a grandeza da obra de Hannah Arendt esteja em sua capacidade de pensar e reinventar a política a partir da recuperação dos fragmentos perdidos de toda tradição, aquilo que foi esquecido, eclipsado, ocultado no tempo - e que ainda assim está lá, insiste Arendt, como uma espécie de sons que se encontram perdidos na escuridão do passado, 'sons que libertam os homens de seus hábitos presentes e desamarram as correntes que prendem o futuro'. Nesse caso, e como diria Guimarães Rosa, 'o livro pode valer pelo muito que nele não deveu caber'."

O coração das trevas - Heloisa Starling Folha de S.Paulo - Jornal de Resenhas
08/07/2000 http://www.companhiadasletras.com.br/

SE UM DIA (Foi um Rio que Passou em Minha Vida)
(S. Zeigler & I. Menezes)

Se um dia...

Se um dia
O Aristóteles for lido
O Sócrates absorvido
Vai ser melhor de agüentar

Meu coração tem manias de amor
Um amor que não é fácil de achar
N'é só pelo site do Olavo*, não é ( n'é só )
É pelo livre pensar

N'é só pelo site do Olavo, não é ( n'é só )
É pelo livre pensar

Porém, há, porém
Cá um caso diferente
Que marcou - me em breve tempo
Foi quando eu li a Hannah Arendt
Num feriado de Carnaval

Imerso em tédio e tristeza
Procurava um novo autor
Quando alguém que tinha o livro me emprestou

Folheei... aí... li a orelha...
Fiquei examinando a lombada
E assim o tempo passou

Ai, mas que novela!
Que difícil atravessar
As vicissitudes, os vãos da abordagem ( se situa! )
Foram deixando-me às margens ( se situa! )
De um colapso intelectual ( inteléco-teléco-técto )

No entanto, prescindir desta adventure
Que ignora o Freud ( fréu, fréu )
Despreza o Marx

É impossível se a verdade foi escolhida
O sumo bem que se quer colimar

É impossível se a verdade foi escolhida
O sumo bem que se quer colimar

Voi lá! ( vô lá! )
Vô lá!
Vô lá! Voi lá! ( vô relê; vô ralá )

Voi lá! ( vô lá! )
Vô lá!
Vô lá! Voi lá!

Se um dia...

Se um dia
O Aristóteles for lido
O Sócrates absorvido (da curpa)
Vai ser melhor de agüentar

Meu coração tem manias de amor
Um amor que não é fácil de achar...

* Olavo de Carvalho, jornalista que recebeu por parte de Marilena Chauí a alcunha de "filósofo de internet" e a quem, replicando, definiu como "um peido".
No vasto site do Olavo ( http://www.olavodecarvalho.org ), em meio a toneladas de debates em que a polidez não ganha - jamais - status de virtude, é possível encontrar gratuitamente, por exemplo, um curso inteiro de Aristóteles entre outras (muitas) páginas dedicadas ao estudo da filosofia.