Tuesday, June 26, 2007

Volta por cima

Já que perdeu ação na Justiça, Daniela Cicarelli deveria transformar sua volta ao YouTube num grande acontecimento. Quem sabe um novo vídeo... Ninguém agüenta mais assistir aquele da praia.


Tutty Vasques - No Mínimo - ig.com.br


Monday, June 25, 2007

Balada do Amor Através das Idades

Eu te gosto, você me gosta
desde tempos imemoriais.
Eu era grego, você troiana,
troiana mas não Helena.
Saí do cavalo de pau
para matar seu irmão.
Matei, brigamos, morremos.

Virei soldado romano
perseguidor de cristãos.
Na porta da catacumba
encontrei-te novamente.
Mas quando vi você nua
caída na areia do circo
e o leão que vinha vindo,
dei um pulo desesperado
e o leão comeu nós dois.

Depois fui pirata mouro,
flagelo da Tripolitânia.
Toquei fogo na fragata
onde você se escondia
da fúria de meu bergantim.
Mas quando ia te pegar
e te fazer minha escrava,
você fez o sinal-da-cruz
e rasgou o peito a punhal...
Me suicidei também.

Depois (tempos mais amenos)
fui cortesão em Versailles,
espirituoso e devasso.
Você cismou de ser freira...
Pulei muro de convento
mas complicações políticas
nos levaram à guilhotina.

Hoje sou moço moderno,
remo, pulo, danço, boxo,
tenho dinheiro no banco.
Você é uma loura notável,
boxa, dança, pula, rema.
Seu pai é que não faz gosto.
Mas depois de mil peripécias,
eu, herói da Paramount,
te abraço, beijo e casamos.

Carlos Drummond de Andrade; Alguma poesia - 1930

Sunday, June 24, 2007

Wednesday, June 20, 2007

Enquanto a Microsoft tenta caçar meu computador, os safados já conseguiram que meu programa de áudio tenha que ser registrado e ele não responde mais! não consigo fazer nada com ele! Mas isso não importa...
Depois da "Alucinada Cultural" tentaram encerrar o evento mais cedo, a polícia mais uma vez mostra para que veio e manda bombas de efeito imoral pra cima de todo mundo com pitadinhas de balas de borracha, loucura e caos instaurado pelos que deveriam garantir a ordem! Os caras tão com medo da população e não perdem tempo!
e por falar nessa "Alucinada Cultural" que evento mais torto foi aquele? Milhares de pessoas andando pra todos os lados da cidade, malucos de várias espécies, o “centrão” bonito que só e feio que dá dó, o pessoal que mora ali pelas ruas não conseguia dormir com tanta gente e tanta bagunça, a sujeira reinava, a quantidade de lixo e mijo pelas ruas era absurda, revelando uma cidade sem estrutura, sem banheiro público, sem uma torneira de água, não sei não, mas achei tudo muito maluco. Mas deu pra encerrar a tal virada em grande estilo tomando um sol no parque e ouvindo umas sinfônicas, eu fui até o final sem dormir... só faltou o Caverna que não apareceu no Frank Zappa e nunca mais vi... Cadê você Caverna?!

http://www.vitroladavovo.podomatic.com/

Thursday, June 14, 2007

Estado laico não é Estado ateu e pagão

Ives Gandra da Silva Martins e Antonio Carlos Rodrigues do Amaral

DESDE A Constituição de 1824, os Textos Magnos pátrios consagram o princípio da liberdade religiosa, o que se dá amplamente a partir da Carta Republicana de 1891.
O Estado laico, longe de ser um Estado ateu -que nega a existência de Deus-, protege a liberdade de consciência e de crença de seus cidadãos, permitindo a coexistência de vários credos. Aliás, é princípio fundamental do cristianismo e muito precioso aos católicos, que compreendem a parcela maior dos brasileiros, o profundo respeito à liberdade religiosa de cada um, como bem se afirma na declaração "Dignitatis Humanae", do Concílio Vaticano 2º.
As Constituições brasileiras fazem expressa menção, em seus preâmbulos, à confiança depositada em Deus (1934), colocando-se sob sua proteção (1946) ou afirmando o amparo divino, como pouco humildemente se fez em 1988.
Essa percepção da importância de Deus como fundamento de uma sociedade fraterna radica na indissociável conexão entre a história, a cultura e o próprio Criador, o que é imprescindível à elaboração de políticas públicas que não colidam com a liberdade religiosa nem desrespeitem a profunda religiosidade dos brasileiros. Daí a enorme distância entre o pluralismo religioso do Estado laico e um Estado ateu ou pagão, que nega a existência de Deus ou prega a divinização do ocupante do poder.
Nero lançou no ano 64 feroz perseguição aos cristãos, que se seguiu ao longo do século dois para a preservação do culto pagão aos imperadores. Hitler, com políticas de extermínio do povo judeu -e de cristãos, ciganos e deficientes físicos- sustentou um Estado ateu em que o "führer" era o senhor supremo da vida e da morte.
Por outro lado, Bento 16, o papa do amor e da paz da encíclica "Deus Caritas Est", ao abrir a 5º Celam, em Aparecida, considerando "a realidade urgente dos grandes problemas econômicos, sociais e políticos da América Latina e do mundo", afirmou: "O que é a "realidade'? O real? São "realidade" só os bens materiais, os problemas sociais, econômicos e políticos? Aqui está precisamente o grande erro das tendências dominantes no último século, erro destrutivo, como demonstram os resultados dos sistemas marxistas e dos capitalistas.
Falsificam o conceito de realidade com a amputação da realidade fundante, e por isso decisiva, que é Deus. Quem exclui Deus de seu horizonte falsifica o conceito de "realidade" e, em conseqüência, só pode terminar em caminhos equivocados e com receitas destrutivas. A primeira afirmação fundamental é, pois, a seguinte: Só quem reconhece Deus conhece a realidade e pode responder a ela de modo adequado e realmente humano. A verdade dessa tese é evidente ante o fracasso de todos os sistemas que colocam Deus entre parênteses".
Para se evitarem "caminhos equivocados e com receitas destrutivas", é indispensável que o Estado laico também dialogue com a ciência, que, quando busca a verdade e é conduzida com vistas à preservação da dignidade humana em plenitude, não contradiz verdades da fé.
Nos temas de proteção à vida, a ciência moderna comprova que ela se dá a partir da concepção, o que já impõe substancial amparo jurídico do Estado. A proteção constitucional e legal à vida -única e irrepetível- a partir de seu início confirma, pois, o que algumas das maiores religiões já afirmam desde tempos imemoriais.
Assim, quando nos defrontamos com temas como aborto, pesquisas destrutivas com células-tronco embrionárias, comercialização de embriões humanos por clínicas de fertilização artificial, não se pode calar a manifestação de cristãos, judeus, muçulmanos e até mesmo de ateus como expressão da rica realidade dos que compõem a sociedade brasileira.
Quando se sustenta que o Estado deve ser surdo à religiosidade de seus cidadãos, na verdade se reveste esse mesmo Estado de características pagãs e ateístas que não são e nunca foram albergadas pelas Constituições brasileiras. A democracia nasce e se desenvolve a partir da pluralidade de idéias e opiniões, e não da ausência delas. É direito e garantia fundamental a livre expressão do pensamento, inclusive para a adequada formação das políticas públicas.
Pretender calar os vários segmentos religiosos do país não apenas é antidemocrático e inconstitucional mas traduz comportamento revestido de profunda intolerância e prejudica gravemente a saudável convivência harmônica do todo social brasileiro.

Folha de São Paulo; 14/07/2007

IVES GANDRA DA SILVA MARTINS, 72, advogado tributarista, é professor emérito da Universidade Mackenzie, da UniFMU, da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército e da Escola Superior de Guerra. ANTONIO CARLOS RODRIGUES DO AMARAL, 45, mestre em direito pela Universidade Harvard (EUA) e mestre em educação pela USP, é professor de direitos e garantias fundamentais da Universidade Mackenzie e presidente da Comissão de Direito Constitucional da OAB-SP.

Enquanto isso, no país da piada pronta

Minutos depois de lançar, pela manhã, um convite público para que os brasileiros viajem mais, a ministra do Turismo, Marta Suplicy (PT), deu uma sugestão inusitada para os que precisam enfrentar as longas filas nos aeroportos: "Relaxa e goza, porque você esquece todos os transtornos depois". Ainda comparou os problemas enfrentados nos aeroportos antes e depois das viagens ao sofrimento da mulher durante o parto, que depois seria esquecido com a alegria do nascimento da criança. "É como o parto, depois esquece tudo." Marta lançou mão do "relaxa e goza" ao responder qual seria sua sugestão para o brasileiro que deseja viajar, mas fica desanimado com o caos aéreo. À tarde, por meio de nota, ela se desculpou pela "frase infeliz".
O ministro da Defesa, Waldir Pires, criticou a frase. "É uma pena, evidente que temos de ter muito respeito com a população", disse ele, para quem "a ministra é uma mulher inteligente, com capacidade de comunicação". Durante o dia, a frase "relaxa e goza" teve mais repercussão do que o Plano Nacional de Turismo anunciado por Marta no início da manhã.
À tarde, ela divulgou nota oficial, por meio de sua assessoria, pedindo desculpas. "Quero pedir desculpas aos turistas e a todos os brasileiros pela frase infeliz que proferi hoje, ao término de uma entrevista coletiva. Não tive por intenção desdenhar, muito menos minimizar os transtornos que estão sendo enfrentados pelos usuários do transporte aéreo." Marta sugere, no texto, que ela também enfrenta filas quando viaja. "Minha intenção foi dizer aos jornalistas e à população que viajar vale a pena, mesmo que os problemas nos aeroportos demorem um pouco mais, apesar de todo o empenho do governo federal para agilizar as soluções."
Até a "frase infeliz", Marta aparentava satisfação com os projetos do ministério. Ao ser indagada se não seria melhor resolver primeiro o caos aéreo para depois lançar um plano de turismo, foi enfática: "Você não faz uma coisa e outra depois, faz tudo ao mesmo tempo".
A nomeação de Marta para o ministério não foi tão tranqüila. Ex-prefeita de São Paulo, a petista tinha vontade de assumir uma pasta mais relevante, como o Ministério da Educação, mas foi relegada por Lula. Ontem, ela tentou passar a idéia de que estava "encantada" com o Turismo, pela possibilidade de "fazer muitas coisas", a "inclusão social" entre elas. "Nossa prioridade será a de dar musculatura, fortalecer o mercado interno, principalmente por meio da inclusão de pessoas que nunca consumiram o turismo", discursou.
Logo no início da cerimônia, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva reclamava que o presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), havia derrubado um copo de água nele. Lula ficou com a roupa toda molhada. "Vocês viram que o Arlindo Chinaglia quebrou um copo em cima de mim, numa tentativa de violência sem precedentes. Estou todo molhado aqui, embora ninguém esteja vendo, porque o terno é azul."

Monday, June 11, 2007

Com um pé nas costas.

Sunday, June 10, 2007

1.
- Não. Bem poucas. Quase não se mata...
Era um rastro de cobra, seu regozinho contornado na poeira, no descer para a grota. Do capim, uma codorniz envoou. O melosal já bem se molhava, de sereno. A mula rata soprou e esperou. Periquitos passavam, das veredas, pretos contra o poente, o dia deles tinha terminado. Os buritizais longe escureciam. O Dalberto havia de estimar Doralda. Quem como era o Dalberto, peito de bom amigo, extenso de correto. Só não ia dar os presentes a Doralda com ele vendo. Não ia dar o sabonete... Dalberto podia ver que ele tinha casado tão bem. Se... Esbarrou.
Só o triz de um relance, se acendeu aquela idéia, de pancada, ele se debateu contra o pensamento, como boi em laço; como boi cai com tontura do cabelouro, porretado atrás do chifre. Senseou oco, o espírito coagulado, nem podia doer de pensar em nada, sabia que tinha o queixo trêmulo, podia ser que ia morrer, cair; não respirava. As pernas queriam retombar de lado, os pés se retinham nos estribos, como num obstáculo. Soropita estava ficando de pedra. Mas seu corpo dava um tremor, que veio até os olhos. - "Uai, câimbra, Surupita?" - "Mas melhorou..." Era aquela tremura nervosa, boi sonsado pelo calor. Curvo na sela. O coração tão pesado, ele podia encostar a cara na crina do animal. O Dalberto não tinha culpa... Mas, por quê tinha vindo, tinha aparecido ali, para o encontrar como amigo, para vir entrar em casa, tomar sombra? E já estavam quase à porta. Fosse o que fosse, nada mais remediava. Mesmo enquanto, não podia se entregar à quele falecimento de ânimo. Mas a idéia o sufocava: quem sabe o Dalberto conhecia Doralda, de Montes Claros, de qualquer tempo, sabia de onde ela tinha vindo, a vida que antes levara?

2.
Chegava a casa, abria a cancela, chegava à casa, desapeava do cavalo, chegava em casa.

João Guimarães Rosa - Noites do Sertão / Dão Lalalão ( o devente )

Saturday, June 09, 2007




















Quem? Eu? Deprimido?

Friday, June 08, 2007

Carrego Comigo

Carrego comigo
há dezenas de anos
há centenas de anos
o pequeno embrulho.

Serão duas cartas?
será uma flor?
será um retrato?
um lenço talvez?

Já não me recordo
onde o encontrei.
Se foi um presente
ou se foi furtado.

Se os anjos desceram
trazendo-o nas mãos,
se boiava no rio,
se pairava no ar.

Não ouso entreabri-lo.
Que coisa contém,
ou se algo contém,
nunca saberei.

Como poderia
tentar esse gesto?
O embrulho é tão frio
e também tão quente.

Ele arde nas mãos,
é doce ao meu tato.
Pronto me fascina
e me deixa triste.

Guardar um segredo
em si e consigo,
não querer sabê-lo
ou querer demais.

Guardar um segredo
de seus próprios olhos,
por baixo do sono,
atrás da lembrança.

A boca experiente
saúda os amigos.
Mão aperta mão,
peito se dilata.

Vem do mar o apelo,
vêm das coisas gritos.
O mundo te chama:
Carlos! Não respondes?

Quero responder.
A rua infinita
vai além do mar.
Quero caminhar.

Mas o embrulho pesa.
Vem a tentação
de jogá-lo ao fundo
da primeira vala.

Ou talvez queimá-lo:
cinzas se dispersam
e não fica sombra
sequer, nem remorso.

Ai, fardo sutil
que antes me carregas
do que és carregado,
para onde me levas?

Por que não me dizes
a palavra dura
oculta em teu seio,
carga intolerável?

Seguir-te submisso
por tanto caminho
sem saber de ti
senão que te sigo.

Se agora te abrisses
e te revelasses
mesmo em forma de erro,
que alívio seria!

Mas ficas fechado.
Carrego-te à noite
se vou para o baile.
De manhã te levo

para a escura fábrica
de negro subúrbio.
és, de fato, amigo
secreto e evidente.

Perder-te seria
perder-me a mim próprio.
Sou um homem livre
mas levo uma coisa.

Não sei o que seja.
Eu não o escolhi.
Jamais a fitei.
Mas levo uma coisa.

Não estou vazio,
não estou sozinho,
pois anda comigo
algo indescritível.

ANDRADE, Carlos Drummond de; A Rosa do Povo

Exercícios práticos para treinamento de futuros papais e mamães

Vestindo a roupinha:

Compre um polvo vivo de bom tamanho e vá colocando, sem machucar a criatura, nesta ordem: fraldas, macaquinho, blusinha, calça, sapatinhos, casaquinho e touquinha. Não é permitido amarrar nenhum dos membros.
Tempo de execução da tarefa: uma manhã inteira.

Comendo a sopinha:

Faça um buraquinho num melão, pendure-o no teto com um barbante comprido e balance-o vigorosamente. Agora tente enfiar a colherinha com a sopa no buraquinho. Continue até ter enfiado pelo menos metade da sopa. Despeje a outra metade no seu colo. Não é permitido gritar. Limpe o melão, limpe o chão, limpe as paredes, limpe o teto, limpe os móveis à volta. Vá tomar um banho.
Tempo para execução da tarefa: uma tarde inteira.

Passeando com a criança:

Vá até a pracinha mais próxima.
Agache-se e pegue uma bituca de cigarro. Atire-a fora, dizendo com firmeza: não!
Agache-se e pegue um palito de picolé sujo. Atire-o fora, dizendo com firmeza: não!
Agache-se e pegue um papel de bala. Atire fora o papel de bala, dizendo com firmeza: não!
Agache-se e pegue uma barata morta. Atire fora a barata morta, dizendo com firmeza: não!
Tempo para execução: o dia inteiro.

Passando a noite com o bebê:

Pegue um saco grande de arroz e passeie pela casa com ele no colo das 20 às 21h. Deite o saco de arroz. Às 22h pegue novamente o saco e passeie com ele até as 23h. Deite o saco e vá se deitar.
Levante à 1h30min e passeie com o saco até as 2h. Leve o saco para a cama com você.
Levante às 2h15min e vá ver o ShopTour porque não consegue mais pegar no sono. Deite às 3h.
Levante às 3h30min, pegue o saco de arroz e passeie com ele até as 4h15min.
Deitem-se os dois (cuidado para não usar o saco como travesseiro).
Levante às 6:00 e pratique o exercício de alimentar o melão. Não é permitido chorar.
Repita tudo pelo menos cinco vezes.
Repita a palavra não a cada 10 minutos, fazendo o gesto com o dedinho.
Gaste uma pequena parcela do seu orçamento (90%) com leite em pó, fraldas, brinquedos, roupinhas.
Passe semanas a fio sem transar, sem ir ao cinema, sem beber, sem sair com amigos.
Não é permitido enlouquecer!

Texto anônimo, recebido via internet.

Um homem que chega do trabalho vê, antes de atravessar o portão de sua casa, seu vizinho procurando alguma coisa na calçada, perto do poste de luz.

Aproxima-se, oferece ajuda e pergunta o que o outro está tentando achar.

“Trata-se da chave da minha porta”, responde o conhecido.

Os dois passam a examinar juntos a área em redor do poste e como a busca se mostra infrutífera, o homem pergunta se a chave não pode ter caído em algum lugar que não aquele.

O
vizinho responde prontamente: “Sem dúvida, lembro-me bem quando ela caiu no jardim, lá dentro, logo que cheguei”.

“Mas por quê, então, procurarmos tão longe?”.

“Ora, porque aqui está iluminado. Lá dentro não se enxerga nada!”.

Assisti Road to Perdition depois de assistir Jarhead e me tocar que a direção era de Sam Mendes. Penso ser possível juntar os dois a American Beauty e assisti-los como uma trilogia.
Nos dois últimos, como apontou o crítico da Folha de São Paulo, a mão do diretor pesa menos, isto quer dizer que em Jarhead e Road to Perdition Mendes optou por atuações e direção mais "naturalistas". O clima onírico que percorre American Beauty de ponta a ponta comparece só pontualmente nas duas obras mais recentes. Um exemplo é o vômito de areia do personagem Swoford em Jarhead. Mas certas obsessões do cineasta estão lá. A visão da morte, por exemplo. Em American Beauty a curiosidade enternecida do rapaz diante de bichos e pessoas sem vida, em Road to Perdition a câmera fotográfica do assassino psicopata interpretado por Jude Law, em Jarhead os corpos carbonizados como num museu de estátuas no meio do deserto.
Outro ponto, e este sem dúvida o principal é o mergulho no inconsciente mais primitivo da nação americana e a prospecção absolutamente honesta e despida de julgamentos morais que o diretor consegue realizar. Não imagino como a trilogia poderia se chamar, mas sem dúvida ela opõe julgamento moral versus especulação ética. Não casualmente, Mendes escolhe três grandes temas que definem antropologicamente o ethos americano: o american way of life, o gangsterismo e a guerra. A cada um detalha, espia com os mesmos olhos dilatados do jovem personagem de American Beauty. A cada um dos personagens concede o direito de expor seus motivos mais profundos. Para cada um cria o contra campo exato, seu oposto complementar. As interpretações, nos três filmes, são contidas, duras, neutras. Em American Beauty elas contribuem para a neutralidade dos caráteres, baseados nos estereótipos de jovens, adultos, teenagers, bichas, militares. Todos serão desmontados até o fim do filme, onde num pequeno lampejo, Kevin Spacey (na cena da cozinha, que antecede o assassinato), irá sintetizar em seu rosto toda a variedade de experiências que seu personagem se permitiu.
Em Road to Perdition, a contenção dos atores transforma-os em seres quase de pedra, inexpugnáveis no inferno de segredos que suas trajetórias impõem. Um detalhe de maquiagem recorrente deixa todos com olheiras enormes, (curiosamente sintoma interpretado na medicina chinesa como resultante de desequilíbrio energético quando a agressividade está mal canalizada). Em Jarhead, talvez o mais naturalista dos três, as expressões são pastosas a maior parte do tempo, mas como reflexo da situação. Os personagens são capazes de esgares terríveis, desesperos completos. Mais do que suas expressões, suas próprias existências são anódinas, desprovidas de significado.
A neutralidade moral é a marca da trilogia. Ao abrir espaço para essa reflexão tão profunda das motivações "demasiadamente humanas" de seus personagens, Sam Mendes nos permite um mergulho prospectivo nas profundezas arquetípicas da América ao mesmo tempo em que consegue ser universal, pois seus americanos falam sempre da condição humana.

Publicado originalmente em 26/01/2006 - www.irajamenezes.blig.ig.com.br

Thursday, June 07, 2007

JOSÉ BOI CAIU DE UM barranco de vinte metros; ficou com a cabeleira enterrada no chão e quebrou o pescoço. Mas, meio minuto antes, estava completamente bêbado e também no apogeu da carreira: era o "espanta-praças", porque tinha escaramuçado, uma vez, um cabo e dois soldados, que não puderam reagir, por serem apenas três. ­- Você o conheceu, Manuel Fulô?

- Mas muito!... Bom homem... Muito amigo meu. Só que ele andava sempre coçando a cabeça, e eu tenho um medo danado de piolho...

- Podia ser sinal de indecisão...

[...]

- Briga, Manuel?

- Lhe conto, seu doutor. Foi na venda: eu estava comprando cadarço de roupa, coisa de paz... O homem já veio chegando enjoado me olhando com cara de herege... Negaceou. Depois, virou p'ra o Pércio, que era caixeiro nesse tempo, e perguntou: "O senhor tem aí dessa raça de faca que entra na barriga e murguêia?" E olhou p'ra mim, outra vez, p'ra ver se eu estava com receio...

- E você, Manuel Fulô?

Eu ia serrar de cima, mas não tive tempo, porque nessa horinha vinha entrando um tropeiro da Soledade, que era homem duro, e pensou que a ofensa era p'ra ele... E aquilo foi o tropeiro dando um murro no balcão, e tossindo e perguntando também p'ra o Pércio: "Por falar nisso, o senhor não terá também dessa raça de bala que bate na testa e chatêia?!" Pois aí o Adejalma se riu de medo, e disse que estava era brincando...

[...]

- E o Miligido?

- Esse era bom... Homem justo. O que ele era era preto... Mais preto do que os outros pretos, engomado de preto... Eu acho que ele era preto até por dentro! Mas foi meu amigo. Valentão valente, mesmo. Um dia ele me deu uma escova de dente, quase nova... Eu acho que ele encontrou a tal nalgum lugar e não sabia que serventia aquilo tinha...

- Matou muita gente, o Miligido?

- Quase nenhum, que eu esteja lembrado... Também, todo o mundo tinha medo dele... Cada um dizia amém antes de ele rezar o fim da reza... Está vivo, mas não é valentão mais. Muito velho... Deve de andar beirando uns setenta... Agora...

- Agora, o valentão é o Targino...

- Nem fala, seu doutor. Esse é ruim mesmo inteirado... Não respeita nem a honra das famílias! É um flagelo...

Guimarães Rosa – Corpo Fechado - Sagarana

Saturday, June 02, 2007

Friday, June 01, 2007


O Recado do Morro


As escolinhas de cultura

De um lado, gente que quer aprender; de outro, gente que quer ensinar. Entre eles, um dinheiro que não havia na forma que se apresenta hoje e o conhecimento escorregando das universidades e dos salões domésticos em direção às escolinhas de cultura.

O fenômeno é visível há poucos anos: escolas ou “casas do saber”, conforme o nome imortalizado por uma bem sucedida rede de instituições culturais de ensino (duas em São Paulo, uma no Rio), multiplicam-se como cogumelos após a chuva. Umas com especialização em artes (Viver Arte), outras em debates culturais variados (Contraponto, Escola São Paulo), outras genéricas (Casa do Saber).

São todas iniciativas que aproveitam uma forte demanda do mercado por conhecimento superior, conforme atesta o enorme crescimento da busca por cursos de pós-graduação em humanidades na condição de “alunos especiais” ou “alunos ouvintes” -portanto sem obrigações formais em relação a titulação. Estima-se que esta demanda cresceu cinco vezes mais do que a demanda por cursos regulares de pós-graduação nas universidades públicas. Acompanhando essa tendência, a nova modalidade de “casas de cultura”, onde são ofertados cursos livres sobre inúmeras áreas do conhecimento, é o verdadeiro MBA das ciências humanas.

Nas áreas técnicas (medicina, engenharia, meio ambiente, economia, administração etc.) as fundações universitárias não só desenvolvem programas de MBAs como “pós-MBAs”. Um curso desse tipo na Fundação Instituto de Administração, da USP (FIA-USP) custa cerca de R$ 3 mil.

O professor Jacques Marcovitch, por exemplo, ex-reitor da USP e professor da Faculdade de Economia e Administração (FEA), onde ministra o curso de relações internacionais, oferece um curso de “Pioneirismo Empresarial e Empreendedorismo Sustentável” nesse valor. Quem não é aluno regular da FEA precisa desembolsar, se quiser ouvi-lo; quem é aluno, aprende com ele de graça na sala de aula.

Atualmente existem 4,4 milhões de alunos matriculados em cursos de ensino superior em todo o Brasil. Desses, 3 milhões (72%) estão na rede privada. Estima-se que em 2010 serão 5,7 milhões de alunos, de modo que os tentáculos da privatização, inclusive indireta, via MBAs, continuarão a avançar sobre a rede pública.

As 20 maiores instituições de ensino privado do Brasil faturaram, em 2003, R$ 4,8 bilhões, sendo que só a Universidade Paulista (Unip) faturou R$ 676 milhões, e a Estácio de Sá, R$ 482 milhões. É um mercado milionário, e entende-se que outros produtos e formas de aquisição de conhecimentos sejam constantemente ofertados, ampliando os ganhos do sistema de ensino privado ou público-privatizado via MBAs.

Os alunos desses cursos técnicos, assim como as empresas para as quais trabalham, estão convictos de que o que vale mesmo na competição moderna é o “capital intelectual” de cada um. Vêem a sua própria formação como “investimento”, não como consumo. São, num certo sentido, os capitalistas de si próprios1, na procura incessante de formas de enriquecer o patrimônio cultural que adquira expressão “salarial”.

O que destoa nesse mercado são os cursos não diretamente referidos ao mundo dos negócios e formas de ganhar dinheiro que as pessoas acreditam decorrer do conhecimento. Assim, cursos de artes plásticas, ciências sociais, cinema, filosofia, história, música, psicologia, temas contemporâneos, e até mesmo astronomia, são ofertados como cursos livres ou palestras, e o seu caráter diletante é evidente. Ninguém espera, através deles, “enriquecer” -a não ser metaforicamente.

Por definição, o diletantismo está situado do lado de fora da atividade produtiva, sendo por isso mesmo uma modalidade de cultura cujo consumo se associa aos momentos de ócio ou à vida das classes ociosas. Afinal de contas, para que serve o saber que não se expressa como força produtiva? Aparentemente serve para adornar ou ilustrar aqueles cujas rendas não dependem do que sabem e, portanto, não dependem da inovação frenética que o capitalismo impõe ao saber produtivo, parecendo mais ligado às formas tradicionais de cultura. O nosso modernismo nasceu nesse tipo de ambiente diletante, nos salões da família Prado -insubordinando-se depois e ganhando o espaço público.

Pessoas de elite sempre contrataram intelectuais para apresentações musicais, palestras e cursos entre amigos, ministrados nas próprias casas, escritórios e ateliês. Tratava-se do mesmo modelo da velha aula de violão ou piano “em domicílio”, mostrando como o dinheiro permite se apropriar da cultura em doses superiores àquela que é ofertada de modo público.

Mas o que se passa nas “casas do saber” não é, em ponto grande, o mesmo que se passava nos salões burgueses. Sua simples existência denuncia uma mudança nas áreas de humanidades, cuja crise é patente em todo o mundo, conforme se constata mesmo nas universidades norte-americanas: nos anos 1970, as editoras universitárias vendiam, em média, 1.250 exemplares por título de humanidades publicado; hoje vendem apenas 275 exemplares. O número de títulos se multiplicou, mas a relevância do que se publica despencou.

O livro de humanidades beira à inutilidade, exceto para os professores que, ao publicá-los, tornam-se mais competitivos ao engordarem o próprio curriculum vitae. Mais e mais os cursos de ciências humanas se devotam à reprodução dos seus próprios quadros: alunos de hoje serão professores de amanhã, fechando-se todos no círculo restrito do saber administrado pelas burocracias universitárias.

Lindsay Waters, editor da Harvard University Press, relaciona a decadência das humanidades com o fim do movimento de contracultura nos anos 1970. Depois dessa data as ciências humanas se tornaram bem comportadas, acompanhando o declínio da própria figura do intelectual público -aquele que fala ao público sobre as questões que atingem a vida coletiva-, que foi engolido pelo mercado. Assim, a famosa “Conferência de Araraquara”, de Jean-Paul Sartre, nada mais é do que parte da mitologia da vida intelectual brasileira.

Se nos anos 1970 o fascínio das humanidades estava na sua dimensão crítica e na insubordinação do pensamento, no que consiste este fascínio atual, quando a crítica ao status quo é cada vez mais uma exceção e o exercício da reflexão se torna atomizado e descolado de qualquer pratica social contestadora?

Além da falência do intelectual público e da prática social que lhe dava sustentação, além da noção moderna de “capital intelectual” que faz do trabalhador uma unidade de negócios, e do seu consumo cultural uma modalidade de “investimento”, é preciso considerar, no novo modo de aquisição cultural, a evolução da própria vida diletante.

A multiplicação das “casas do saber”, a par com a multiplicação dos MBAs, se deve à impermeabilidade crescente das universidades ao diletantismo do aprendizado. Elas abrigam curadores de arte, fashionistas, filósofos, professores universitários em geral, artistas plásticos -pessoas que se especializaram, mas cuja audiência vai além do seu público igualmente especializado e que estão dispostos a contar o que se passa “por trás” da vida cotidiana.

O “segredo” da filosofia, das artes plásticas, da antropologia, é o que atrai o leigo. Muitas vezes os mestres são professores aposentados que, no entanto, se encontram em pleno vigor produtivo. Todos se lançam nesses novos “espaços culturais” e descobrem um novo e fascinante universo, que cresce dia a dia sem depender da burocracia universitária.

Só a impermeabilidade e o extravasamento da vida universitária explicam que um curso de introdução à antropologia -ou outro mais especializado, sobre Franz Boas– possam encontrar interessados no mercado. Só o público não-especializado, livre das modas acadêmicas, pode encontrar em Franz Boas matéria de reflexão como “novidade”.

Por outro lado, o novo “intelectual público” tornou-se aquele que sabe o que o comum dos mortais não sabe -já não sendo necessário que o seu discurso esteja centrado nas esferas da vida pública. Nesse sentido preciso, ele também se tornou um diletante.

“Especialistas” em qualquer coisa de interesse estão em alta simplesmente porque trazem a público os conteúdos culturais seqüestrados dos campos acessíveis da cultura. Por paradoxal que seja, numa espécie de da cultura de massa “exclusiva”, há sempre com quem aprender, com a vantagem de que o novo consumidor pode compor o seu próprio repertório “zapeando” a oferta cultural.

Seguramente há um segmento do mercado cujo objetivo é parecer culto. Talvez, nele, Franz Boas ainda tenha um valor maior do que na antropologia que já não o cultua (a moda agora é Philippe Descola, o antropólogo que se pôs a filosofar na selva, entre os Achuar da Venezuela).

É claro que a cultura que assim se apresenta pode ser ironizada pelo seu lado “chique”, ou pela atração que eventualmente exerce sobre mocinhas casadoiras & solitários em geral. Ou, ainda, pelo saber “inútil” e pretensioso, imortalizado no monólogo do teatrólogo Pedro Bloch (“As Mãos de Eurídice”, 1950), ironizando a personagem que, um dia, foi flagrada numa festa, entre um uísque e outro, explicando o “azul de Portinari” para... o próprio Portinari! Mas este é um ponto de vista parcial. De fato, a cultura se fracionou e especializou, desenvolvendo-se em nichos e se apresentando como uma coleção de cacos sem nexos evidentes entre si.

O que os cursos extra-universitários de humanidades oferecem é justamente uma coleção de nexos que se escondem por trás do modo desestruturado como a cultura se apresenta.

Um só exemplo é suficiente: a “Revista Civilização Brasileira”, surgida em 1965 e desaparecida em 1968, pretendia mostrar um país cindido em duas culturas, resultante do golpe militar de 1964. Ao apresentar o pensamento democrático “em bloco” favorecia uma intelecção orgânica do mundo, o que se desfez nas décadas seguintes. Hoje as revistas de cultura são segmentadas e ultra-especializadas, dificultando a compreensão mais ampla da realidade, ou como se articulam os diversos segmentos do saber. Em resumo, é mais fácil se especializar em cinema do que compreender o seu significado moderno articulado com outros campos do fazer cultural.

“Produto de sociedades despedaçadas, o intelectual é sua testemunha porque interiorizou seu despedaçamento”, dizia Sartre, mas é nos cursos das “casas do saber” que ele busca reconstruir totalidades às quais a vida cotidiana é refratária; nelas a sua especialidade busca responder a uma curiosidade livre e errática, ávida por encontrar nexos entre a vida e o saber.

Mas há instituições de todo tipo. Como o espaço Contraponto, do pintor Sergio Fingermann, onde os cursos, palestras e eventos lembram um “revival” das velhas discussões que, outrora, animaram a cultura paulistana em torno da Faculdade de Filosofia da USP, sediada na rua Maria Antonia, cuja marca era a abordagem holística da cultura, especialmente relacionando-a com a política. É inegável que no Contraponto se discute coisas relevantes para o desenvolvimento da cultura mesmo em áreas especializadas, mas ele só pode existir porque o “modelo público Maria Antonia” ruiu.

A novidade é que esse tipo de atividade institucionalizou-se e passou a ser administrada pelo capital e, por outro lado, o cardápio se ampliou. Assim, parece que a expulsão dos diletantes das universidades e a ampliação do mercado de consumo desse tipo de cultura constituem a base objetiva de sustentação das “casas do saber”. Por outro lado, elas também são devedoras da própria representação moderna da cultura como “patchwork”, disposta como cacos ou fragmentos de totalidades que já não parecem fazer sentido para quem não está imerso cotidianamente no discurso estruturado do saber universitário.

Carlos Alberto Dória - É sociólogo, doutorando em sociologia no IFCH-Unicamp e autor de "Ensaios Enveredados", "Bordado da Fama" e "Os Federais da Cultura", entre outros livros.