Wednesday, January 30, 2008
O principal problema neste caso é estabelecer uma ligação entre o consciente e o subconsciente; é exatamente isso que o criador das cartas do tarô tencionava fazer. Os símbolos do tarô servem a uma dupla finalidade: de alfabeto, com cuja ajuda o subconsciente pode soletrar seus significados e para estimular a força inerente do subconsciente, assim como uma ficha perfurada "estimula" um computador eletrônico. Tudo se resume num intercâmbio recíproco.
Colin Wilson, Das Okkulte (citado no Manual do Tarô de Hajo Banzhaf)
Hajo Banzhaf - Manual do Tarô
O desfile dos heróis triunfantes de pé sobre seus carros de guerra é um costume pelo menos tão antigo quanto os próprios carros de guerra. Court de Gébelin – e com ele os que acreditam numa origem egípcia do Tarô – imagina que o Arcano VII nada mais é que a reapresentação do Osíris triunfal, e que os cavalos são uma herança vulgar da Esfinge.
www.clubedotaro.com.br
O Arcano do Domínio, do Repouso
Compilação de Constantino K. Riemma
Dois cavalos arrastam uma espécie de caixa, montada sobre duas rodas e coberta por um dossel, onde se encontra um homem coroado, que traz um cetro em sua mão direita. Na parte frontal do carro (a única visível), em boa parte dos tarôs clássicos, há um escudo com duas letras, que variam com as editoras das lâminas.
Mais do que de cavalos, poderíamos falar de dois corpos dianteiros, fundidos ao carro. Os dois animais olham para a esquerda, mas a sua disposição é tal que parecem andar cada um para o seu lado. O cavalo da esquerda levanta a pata direita, e o da direita, a pata esquerda. O dossel repousa sobre quatro colunas.
O homem, que tem uma coroa do tipo das de marquês, tem a mão esquerda sobre um cinto amarelo, na altura da cintura, e na mão direita traz um cetro que termina por um ornamento esférico encimado por um cone. O peito do personagem está coberto por uma couraça. Cada um dos seus ombros está protegido por uma meia-lua, com rostos de expressão diferente.
Os cabelos do personagem são amarelos, e seu olhar dirige-se ligeiramente para a esquerda, no mesmo sentido que o de seus cavalos.
Cinco plantas brotam do solo. Não aparecem rédeas ou qualquer outro meio de guiar o carro.
Contemplação ativa, repouso. Vitória, triunfo. O setenário sagrado, a realeza, o sacerdócio. Magistério. Superioridade. Realização.
Êxito legítimo, avanço merecido. Talento, dons, capacidade, aptidões postas em marcha. Tato para governar, diplomacia, direção competente.
Conciliação dos antagonismos, condução de forças divergentes. Progresso, mobilidade, viagens por terra.
Mental: As coisas se realizam, mas falta ainda montar as peças de conjunto.
Emocional: Afeto manifestado; protetor, serviçal.
Físico: Grande atividade, rapidez nas ações. Boa saúde, força, atividade intensa. Do ponto de vista do dinheiro: gastos ou ganhos, movimento de fundos.
Significa também notícia inesperada, conquista. Pode ser interpretado também como difusão da obra ou atividades do consulente através de palavras e, segundo sua localização na tiragem, significa elogios ou calúnias.
Sentido negativo: Ambições injustificadas, vanglória, megalomania. Falta de talento e de consideração. Governo ilegítimo, situação usurpada, ditadura. Oportunismo perigoso. Preocupações, cansaço, atividade febril e sem repouso. Perda de controle.
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Julio Cortázar - Del sentimiento de no estar del todo - La vuelta al día en ochenta mundos.
Citado por Jorge Larrosa em Pedagogia Profana.
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Friday, January 25, 2008
Li no Blue Bus a nota aqui sobre a proibiçao da France Presse ao uso da Wikipedia como fonte e o comentário do Thompson Loiola aqui apoiando a decisao. Entendo a preocupaçao dele e da AFP, mas acho um pouco exagerada, equivocada mesmo. Toda fonte tem problemas de credibilidade. Quem me garante que o reporter que redigiu um texto para a France Presse, por exemplo, nao mentiu, deturpou ou distorceu a informaçao? Já aconteceu antes e vai acontecer no futuro. Quem me garante que os livros e as revistas que compro ou o jornal que vejo na TV trazem realmente a informaçao correta? 24/01 Jorge Henrique
A Wikipedia conta com a colaboraçao de milhares de pessoas mundo afora, que, por diletantismo, gostam de escrever sobre determinados assuntos. Muitos sao, inclusive, especialistas no tema, mas nao tem espaço - ou nao querem, por ter outra profissao - para divulgar seus conhecimentos. É aí que a Wikipedia entra e funciona muito bem. É a inteligência coletiva funcionando muito bem, obrigado. 24/01 Jorge Henrique
Em 2005, fizeram um teste para conferir a precisao da Wikipedia. Estudiosos foram convidados pela revista Nature para avaliar um mesmo número de artigos da enciclopédia online e também da tradicional Britannica. Resultado? Encontraram a mesma quantidade de erros em ambas! Ou seja - a Wikipedia é tao precisa quanto a Britannica - com a vantagem de podermos corrigir os erros no exato momento em que sao identificados. Já os erros da Britannica terao que aguardar compulsoriamente uma nova ediçao. 24/01 Jorge Henrique
Eu mesmo sou autor de alguns verbetes na Wikipedia e sempre que posso vou lá dar uma conferida para ver se alguem mexeu em algo, acrescentou, etc. Se encontro algum erro grave, corrijo. Converso com outros autores, discuto idéias, debato conceitos e informaçoes publicadas. É divertido, acreditem! Recomendo a todos que têm informaçoes preciosas sobre qualquer tema e nunca publicaram nada. Essa cultura wiki nao pára de crescer - estao soltando as amarras do pensar. A Wikipedia gerou filhotes. Muitos. Como a sisuda RationalWiki e as hilárias Uncyclopedia e Desiclopédia. Tem também o Wikibooks (dedicado a livros de conteúdo aberto) e a Wikiversity (que cria e promove o uso de materiais didáticos livres). Estao pensando até em criar um portal wiki para a produçao científica. É o sonho de Diderot realizado - enciclopédias vivas! 24/01 Jorge Henrique
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Thursday, January 24, 2008
Preso em SP sexagenário com ficha criminal de 82 páginas
Policiais civis da Divisão de Investigações Gerais (DIG) prenderam em flagrante um idoso de 61 anos com 82 páginas de ficha criminal, em São José do Rio Preto, no interior de São Paulo.
O acusado, que não teve seu nome revelado, tem passagens na polícia por furto, roubo, tráfico, estelionato, receptação e até homicídio. Segundo a Secretaria Estadual de Segurança Pública, na casa dele, a polícia apreendeu armas e munições.
Os policiais chegaram até o acusado após a apreensão de um trator furtado. Com ele, foram apreendidos dois revólveres, duas espingardas, munições, um alicate de corte hidráulico, cinco chaves para dar partida em trator e um celular.
O idoso tem três mandados de prisão preventiva e está preso na delegacia da DIG. A polícia acredita que, com a prisão dele, outros casos de roubos também sejam solucionados na região de São José do Rio Preto.
Aê, vovô!!!
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Wednesday, January 23, 2008
You say it's your birthday
It's my birthday too, yeah
They say it's your birthday
We're gonna have a good time
I'm glad it's your birthday
Happy birthday to you
Yes we're going to a party, party
Yes we're going to a party, party
Yes we're going to a party, party
I would like you to dance
(birthday) Take a cha-cha-cha-chance
(birthday) I would like you to dance
(birthday) da-da-dance
I would like you to dance
(birthday) Take a cha-cha-cha-chance
(birthday) I would like you to dance
(birthday) da-da-dance
You say it's your birthday
It's my birthday too, yeah
They say it's your birthday
We're gonna have a good time
I'm glad it's your birthday
Happy birthday to you
Tuesday, January 22, 2008
A professora Maria Cristina Sucupira é um exemplo de como pode ser distinta as realidades na rede particular. Enquanto há escolas em São Paulo que pagam apenas o piso, de R$ 659 para o ensino fundamental, ela leciona no colégio Santa Cruz (zona oeste de SP), onde os docentes recebem, na mesma etapa de ensino, no mínimo R$ 4.296.
Sobre sua situação financeira, Maria Cristina, 44, afirma: "Não tenho do que reclamar". Ela leciona biologia no ensino médio (etapa que o colégio paga entre R$ 7.114 e 8.821, por 30 h semanais).
O salário, conta, permite que ela dê aulas só em uma escola. "O professor pode se concentrar só em manter ou melhorar as atividades."
Professora de 5ª série ao ensino médio em um colégio estadual da zona sul de SP, Ana Luiza Siscart de Toledo, 52, afirma viver em uma situação salarial totalmente diferente. Com 29 anos de magistério, ela ganha R$ 2.000 por 30 horas semanais.
Conta que tem três cursos superiores (história, pedagogia e serviço social) e fala quatro línguas. "O salário é baixo. Se não fosse professora, certamente ganharia mais."
Ana Luiza, porém, afirma que trabalha "com muito prazer", pois "ver uma criança crescendo, aprendendo, é muito gratificante".
A professora Shirley da Anunciação Cruz, 35, desistiu há cerca de um ano de dar aulas na rede particular de Aracaju (SE). O motivo: ganhava R$ 200 mensais, pouco mais de meio salário mínimo.
Professora de português, ela lecionou por 13 anos em escolas particulares. Agora, se dedica somente à rede estadual, onde já está faz oito anos. O trabalho lhe rende cerca de R$ 850 por mês.
"Pensei no meu filho, que hoje tem três anos, e acho que foi melhor ter saído. Além de pagarem pouco, as escolas particulares ainda exigem muitas atividades extras. Era muito cansativo", diz.
Os professores brasileiros do ensino básico com diploma superior ganham menos que a média da população com semelhante grau de instrução. Considerando os docentes sem ensino superior, a média salarial é inferior à da população total -constatações presentes em dados tabulados pela Folha, com base na Pnad 2006.
Segundo dados do IBGE, o rendimento médio dos professores da educação básica com nível superior vai de R$ 1.152 (1ª a 4ª) a R$ 1.660 (ensino médio). Entre a população brasileira em geral com diploma superior a média é de R$ 2.693.
Comparando diversas profissões, no país, professores do ensino básico ganham menos que caixas de banco (R$ 1.690).
Dentro da classe docente, apenas os que lecionam no ensino superior ganham mais (R$ 3.605) que a média brasileira com nível universitário.
"Com esses salários, em muitos casos, o magistério sobra como um emprego provisório ou para os que não conseguiram outro trabalho", diz o pesquisador da USP-Ribeirão Preto José Marcelino Rezende Pinto.
"Esse quadro leva os professores a jornadas duplas e triplas, para aqueles que de fato vivem do magistério. Aí, não tem jeito, cai a qualidade."
Defensor do entendimento de que a situação financeira dos professores no país "não é tão ruim", o pesquisador da FGV-RJ Samuel Pessoa diz ser necessário considerar um fato adicional ao salário.
"Na rede pública, há vantagens adicionais como a estabilidade e a aposentadoria integral em menos tempo de trabalho." (AG e FT)
A Pnad mostra que, de 2005 para 2006, os rendimentos na rede privada -sem considerar o nível de ensino que lecionam- caiu 4,3%. Já nos sistemas municipais e estaduais houve, respectivamente, aumentos de 16% e 20%.
Na avaliação de Simon Schwartzman, autor da tabulação da pesquisa, a melhoria dos salários na rede pública está relacionada ao fato de muitos professores terem obtido o diploma de nível superior.
Dados do Censo Escolar mostram que o percentual de professores dos níveis iniciais da educação básica com diploma de ensino superior cresceu de 20% para 53% de 1996 a 2006. Quanto maior a titulação, em geral, maior a remuneração na rede pública.
Outros estudos divulgados no ano passado já indicavam que a condição salarial dos professores da rede pública melhoram. Um deles foi feito pelos pesquisadores Samuel Pessoa, Fernando de Holanda Barbosa Filho e Luís Eduardo Afonso, da FGV (Fundação Getúlio Vargas) e da USP (Universidade de São Paulo), e utilizava o Censo do IBGE (Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) do ano 2000 como base.
Naquele ano, o rendimento médio verificado entre os professores da rede privada era ligeiramente superior ao da rede pública, mas, quando se incluía no salário as vantagens da aposentadoria, o emprego no setor público ficava mais vantajoso, de acordo com a conclusão do estudo. (AG e FT)
Os professores da educação fundamental das escolas públicas (estadual e municipal) do país ganham, em média, mais do que os da rede particular.
Os docentes de 1ª a 4ª série (o antigo primário) das escolas estaduais têm um rendimento mensal médio de R$ 1.398, ante R$ 1.051 das municipais e R$ 1.048 das particulares.
A constatação está presente em tabulações da Pnad 2006 (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, do IBGE) feitas por Simon Schwartzman, ex-presidente do IBGE e atual presidente do Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade. Dados do Ministério do Trabalho confirmam o panorama.
A rede pública paga mais também na 5ª a 8ª (antigo ginásio) e da educação superior.
No antigo ginásio, a média no sistema estadual é de R$ 1.347, contra R$ 1.120 na particular -a municipal paga R$ 1.230.
O sistema particular só oferece salários maiores no ensino médio (antigo colegial) -veja mais em quadro ao lado.
A lógica se mantém mesmo quando se simula que todos os educadores do país tivessem a mesma jornada.
Uma das explicações para que a média na rede particular seja mais baixa é sua heterogeneidade. Na capital paulista, por exemplo, há escolas de regiões mais pobres em que os salários não chegam a R$ 700, enquanto outras escolas de ponta, como o Santa Cruz (em Pinheiros), pagam mais de R$ 8.000.
Essa diferença salarial entre os colégios reflete na qualidade de ensino no setor privado.
As médias no Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) entre as dez escolas particulares de São Paulo de melhor salário variam de 68 a 58, numa escala de 0 a 100. Entre as dez com piores salários, a variação é de 47 a 56. O ranking de rendimentos foi feito pelo sindicato dos professores da rede particular no ano passado.
A oscilação salarial não costuma ter tanto impacto nas redes públicas. No sistema estadual de São Paulo, por exemplo, a diferença entre o piso e o teto da 1ª a 4ª séries é de 92,3%.
A grande diferença entre os Estados também ajuda a explicar as baixas médias. O cruzamento dos dados da Pnad 2006 com o Censo dos Profissionais do Magistério da Educação Básica, feito em 2003 pelo MEC, aponta que os salários da rede privada no Nordeste puxam a média nacional para baixo.
Em Sergipe, por exemplo, a rede particular pagava R$ 410, contra R$ 628 da pública.
Naquele ano, as redes privadas do Distrito Federal e de São Paulo pagavam uma média superior a R$ 1.200.
Pesquisadores apresentaram diferentes análises e explicações para o setor público pagar mais que a rede particular.
Para Samuel Pessoa, professor da FGV-RJ que estuda os rendimentos dos docentes, "a carreira de professor da rede pública não é tão ruim como afirmam". Schwartzman complementa: "Não é à toa que todos que podem tratam de conseguir um emprego público".
A análise do pesquisador da USP-Ribeirão Preto José Marcelino Rezende Pinto, ex-diretor do Inep (instituto de pesquisas do MEC), é diferente. "Independentemente da diferença entre público e privado, os professores no país ganham mal" (leia mais nesta página).
O assessor especial da Unesco no Brasil, Célio da Cunha, diz que a média esconde diferenças regionais. "Há redes públicas próximas ao adequado. Outras pagam mal. O mesmo ocorre na rede privada."
A coordenadora da Contee (entidade que representa os professores do ensino particular do país), Madalena Guasco Peixoto, afirma que os salários da rede privada são mais baixos no ensino fundamental porque, nesse nível de ensino, quase toda a população já foi atendida.
"A presença do setor público é muito forte e, por isso, as escolas não precisam disputar alunos. Oferecem apenas o básico do básico", disse.
"No médio, como ainda há muita gente fora da escola, elas precisam brigar pelos estudantes. Assim, pagam melhor", completou Peixoto, que é pesquisadora da PUC-SP.
Uma explicação possível, afirma o presidente da Fenep (federação das escolas particulares do país), José Augusto Lourenço, é que incentivos tributários oferecidos a partir da década de 90 (o Simples) estimularam a abertura de escolas de pequeno porte, que têm menos condições de pagarem salários melhores. "Isso mostra que também há escolas particulares com baixa qualidade."
Para a presidente da CNTE (entidade que representa professores da rede pública), Juçara Dutra Vieira, "os dados apontam mais para um agravamento na rede privada do que uma situação ideal na pública".
Além da Pnad, a Rais (Relação Anual de Informações Sociais), do Ministério do Trabalho, também aponta que a rede pública paga mais.
Com base em 2006, o trabalho mostra que a média salarial dos docentes dos ensinos infantil e fundamental na rede federal era de R$ 5.640; na rede estadual, R$ 1.656; na particular sem fins lucrativos, R$ 1.431; e na particular com fins lucrativos, R$ 740 -as divisões são diferentes das da Pnad.
ANTÔNIO GOIS - DA SUCURSAL DO RIO / FÁBIO TAKAHASHI - DA REPORTAGEM LOCAL
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Monday, January 21, 2008
Estreou na sexta passada Desejo e Reparação, de Joe Wright - uma adaptação, essencialmente fiel, da obra-prima de Ian McEwan, Reparação (ed. Companhia das Letras).
O filme recebeu o Globo de Ouro para melhor drama e será certamente um sucesso de público. O livro de Ian McEwan é já um clássico e um best-seller. Por quê?
Certo, Joe Wright fez um filme maravilhoso, e McEwan é um dos melhores escritores do momento. Mas não é só isso.
Acontece que, na tela ou nas páginas, a história contada revela e ilustra um canto ao mesmo tempo escuro e familiar da subjetividade de todos nós, ou melhor, como se diz em psicologia, um mecanismo psíquico que governa nossa vida muito além do que a gente pensa.
Resumindo: uma menina, dotada de uma certa predisposição artística e inspirada por uma paixão amorosa e pelo ciúme inconfessável que essa paixão produz, faz uma sacanagem que estraga radicalmente a vida da irmã assim como a do jovem que ama essa irmã e é amado por ela.
A menina, ao crescer, tenta expiar sua culpa e descobre que ela poderá remir-se escrevendo não tanto a verdade do que aconteceu, mas uma história, um romance. É de uma vida dedicada à literatura que ela esperará a redenção: um romance reparará, enfim, o ato funesto que ela cometeu.
Os distribuidores brasileiros do filme mudaram o título de McEwan.
Acrescentando "desejo" a "reparação", eles fizeram uma escolha aceitável. Evitaram, em particular, a tentação de optar por algo como "Culpa e Reparação", termos ligados por uma implicação óbvia: a gente faz uma besteira, sente-se culpado e tenta acalmar a culpa reparando os danos - às vezes, trata-se de uma decisão consciente, outras vezes, nossa vida inteira se organiza ao redor de um projeto reparador sem que a gente saiba direito por quê (afinal, somos sempre culpados de alguma coisa, não é?).
Claro, a culpa pode exigir reparação, mas talvez a vontade de reparar os tortos não seja apenas a conseqüência das culpas que nos tocam por causa de nossos malfeitos. Talvez essa vontade seja algo mais radical, mais originário.
Foi uma grande psicanalista, Melanie Klein, que introduziu a "reparação" entre os conceitos da psicanálise. A idéia básica é a seguinte: um belo dia, o bebê se dá conta de que os objetos de seu amor são pessoas inteiras (por exemplo, ele descobre que não gosta apenas do seio que o alimenta, das mãos que cuidam dele etc., mas da mãe como um todo). Logo, nosso bebê começa a sentir a necessidade de "reparar" os "danos" que sua visão anterior do mundo teria causado - em suma, de reconstituir o corpo materno que ele havia consumido aos pedaços.
Isso pode parecer bastante exótico aos olhos do leigo. Mas, para entender, basta considerar que nunca paramos de oscilar entre a vontade de despedaçar o outro e a vontade de reparar os estragos. Como assim?
É simples e está no título do filme (Desejo e Reparação). No desejo sexual, em geral dilaceramos o outro desejado. Por exemplo, o desejo, sempre um pouco fetichista, prefere os pedaços: o decote, a voz, um olhar, a perna cortada pela cinta-liga, a queda dos rins, a forma dos lábios e por aí vai. Quando amamos a quem desejamos, o amor nos ajuda a reparar os efeitos do estilo carniceiro do nosso desejo: idealizamos o amado e a amada para que a beleza que neles enxergamos os preserve de nossa própria crueldade.
Falando em beleza, justamente, Melanie Klein e seus primeiros alunos já pensavam que talvez a vontade ou a necessidade de reparar o mundo (despedaçado por nosso próprio desejo) fosse a força que anima nossas ambições estéticas.
A incrível persistência humana na tentativa de criar algo bonito lhes parecia ser o jeito que inventamos para compensar a violência de nossa cobiça (não só sexual, aliás). Ou seja, os danos produzidos pela brutalidade de nosso querer nos dariam vontade de arrumar o mundo, de embelezá-lo, de fazê-lo ficar "bom de novo", como dizia Klein.
Em suma, talvez nossa capacidade de criar algo misteriosa e extraordinariamente "bonito" (como o livro de McEwan e o filme de Wright) seja a maneira que encontramos para proteger aos outros, a nós mesmos e ao mundo contra a "loucura" de nossos desejos.
Nota: é bem possível que nossa paixão ecológica de hoje tenha uma origem parecida. Afinal, ela tenta preservar e restaurar o que não sabemos deixar de destruir.
Contardo Calligaris
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Numa entrevista à TV, o escritor português Antonio Lobo Antunes disse que todo escritor, ao ser indagado sobre as influências que o levaram a escrever, costuma citar Joyce, Proust, etc. Para ele, isso é conversa fiada de intelectual. “Quem nos leva a escrever é Flash Gordon”, disse. “Muito antes de conhecermos os grandes autores, a vontade de contar histórias já nos foi despertada por aqueles autores ditos menores, mas que apaixonam nossa imaginação: Emilio Salgari, Julio Verne...”
Yambo, o protagonista da A Misteriosa Chama da Rainha Loana de Umberto Eco, é um homem com amnésia que reconstitui a própria infância através dos livros e gibis que leu. Yambo relaciona a imagem de Flash Gordon, que ele lia no semanário L’Avventuroso, aos heróis arianos da época (1934) e à própria imagem de Mussolini, e diz à página 237: “Tive em Flash Gordon a primeira imagem de um herói de uma guerra de libertação combatida em um Alhures Absoluto, fazendo explodirem asteróides fortificados em galáxias distantes”. Ele percebe também os anacronismos dos quadrinhos de Alex Raymond, em que os personagens “eram incongruentemente dotados tanto de armas brancas ou flechas quanto de prodigiosos fuzis de raio fulminante”.
Ariano Suassuna recorda ter visto na infância Flash Gordon no Planeta Mongo, e diz: “Quando vi a chegada do homem à Lua pela televisão, fiquei decepcionado. Flash Gordon era mil vezes mais interessante”. Lobo Antunes nasceu em 1942, Eco em 1932 e Ariano em 1927. Nestes três escritores tão diferentes entre si vemos o resultado de uma das primeiras investidas maciças da cultura pop norte-americana (cinema e quadrinhos) durante as décadas de 1930-40.
Hoje em dia vivemos saturados de “Space Opera”, a tal ponto que mesmo os aficionados (como eu) consideram isto uma banalização insuportável da beleza da FC. Flash Gordon surgiu numa época em que o “realismo aparente” era soberano. Naquela paisagem naturalista e banal suas aventuras envolviam reinos futuristas, monstros pré-históricos, foguetes espaciais, lutas de gladiadores, pistolas desintegradoras. Eram, e ainda são, um escoadouro indisciplinado e descontraído para as imagens do inconsciente, sem a mínima preocupação com a lógica ou a verossimilhança. A imagem brotando pelo seu valor como imagem; a peripécia surgindo pelo seu valor como peripécia.
Flash Gordon foi o Star Wars de seu tempo, ou melhor, uma síntese surrealista entre o futurismo de Star Wars e o medievalismo de O Senhor dos Anéis. Nada tem de científico. Seus enredos são absurdos, seus personagens são de papelão. No cinema, os efeitos especiais provocam risos no espectador de hoje; nos quadrinhos, o belo desenho de Alex Raymond continua imbatível. Mas acima de tudo ele comprova o poder da imaginação pura, despida de pretextos, independente da razão e da lógica. Flash Gordon é o nosso inconsciente coletivo posto a nu e revelado às crianças antes que elas sejam vacinadas contra a imaginação.
Braulio Tavares
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Álvaro de Campos
O dia deu em chuvoso.
A manhã, contudo, esteve bastante azul.
O dia deu em chuvoso.
Desde manhã eu estava um pouco triste.
Antecipação! Tristeza? Coisa nenhuma?
Não sei: já ao acordar estava triste.
O dia deu em chuvoso.
Bem sei, a penumbra da chuva é elegante.
Bem sei: o sol oprime, por ser tão ordinário, um elegante.
Bem sei: ser susceptível às mudanças de luz não é elegante.
Mas quem disse ao sol ou aos outros que eu quero ser elegante?
Dêem-me o céu azul e o sol visível.
Névoa, chuvas, escuros — isso tenho eu em mim.
Hoje quero só sossego.
Até amaria o lar, desde que o não tivesse.
Chego a ter sono de vontade de ter sossego.
Não exageremos!
Tenho efetivamente sono, sem explicação.
O dia deu em chuvoso.
Carinhos? Afetos? São memórias...
É preciso ser-se criança para os ter...
Minha madrugada perdida, meu céu azul verdadeiro!
O dia deu em chuvoso.
Boca bonita da filha do caseiro,
Polpa de fruta de um coração por comer...
Quando foi isso? Não sei...
No azul da manhã...
O dia deu em chuvoso.
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Sunday, January 20, 2008
No ano 2000, os líderes mundiais acordaram um conjunto de metas para estimular avanços visando a concretização, até 2015, do previsto no tratado Educação para Todos (EFA, na sigla em inglês, proposto durante o último Fórum Mundial sobre a Educação promovido pela Unesco).
As metas do EFA são: ampliar a educação e a assistência à primeira infância; garantir o ensino primário gratuito e obrigatório; promover a aprendizagem e habilidades para a vida; aumentar em 50% a alfabetização de adultos; alcançar a igualdade de gêneros; e assegurar a qualidade em todos os níveis de ensino.
Entretanto, pesquisas recentes mostram que, a meio caminho de 2015, os governos ainda estão deixando de atender às crianças e aos adultos analfabetos.
Existem 774 milhões de adultos desprovidos do grau mais rudimentar de alfabetização e 72 milhões de crianças - mais da metade das quais são meninas - estão fora da escola.
Quase a metade dessas crianças que não freqüentam a escola vivem em Estados frágeis. As crianças de famílias pobres não têm meios para pagar mensalidades e taxas ainda prevalecentes em mais de 90 países.
Muitas precisam trabalhar para ajudar a sustentar suas famílias, freqüentemente em condições desesperadoramente perigosas e insalubres: segundo a Organização Mundial do Trabalho, 111 milhões de crianças trabalham em "atividades de risco". As crianças portadoras de deficiência, as que integram comunidades étnicas minoritárias e as que são doentes de Aids ou soropositivas enfrentam ainda outros obstáculos para chegar à escola.
Juntando os dados da ONU e do Banco Mundial a pesquisas alternativas conduzidas pela sociedade civil, a Campanha Global pela Educação (GCE, na sigla em inglês) divulgou no ano passado o relatório "No Excuses" ("Sem Desculpas"), em que atribui "notas" de A a F a todos os governos, segundo seu desempenho até hoje no tocante à educação.
Os governos que obtiveram as melhores "notas" incluem os de Maurício, Letônia e Uruguai, enquanto o fundo da classe é ocupado por Haiti, Somália e Guiné-Bissau.
Os países mais ricos também são avaliados quanto ao cumprimento da promessa com relação ao EFA: fornecer assistência adequada e de longo prazo para que as metas sejam alcançadas. Enquanto Noruega e Holanda ocupam o topo desse ranking, os países do G8 são os piores quando se trata de dar o financiamento prometido para a educação, e os EUA são o último colocado em sua "classe do G8".
Quando são avaliados dentro da tabela global, o Reino Unido ocupa o quinto lugar, o Canadá, o 36º, a França, o 91º, a Alemanha, o 109º, o Japão, o 124º, e a Itália e os EUA, na 146ª posição, ocupam quase os últimos lugares na classe global.
Mas as evidências também indicam que muito pode ser realizado quando os governos priorizam a política educacional. Nos últimos 18 anos, vários países em desenvolvimento conseguiram avanços importantes na ampliação do ensino fundamental. Entre eles estão Costa Rica, Cuba, México, Sri Lanka e Tailândia.
E avanços notáveis têm sido conseguidos em alguns dos contextos mais difíceis; milhões de crianças passaram a freqüentar a escola em países como Quênia, Camarões, Botsuana e Burundi, nos quais, nos últimos anos, os governos eliminaram as mensalidades escolares.
O Brasil faz parte dos 20 primeiros países do ranking mundial graças aos esforços feitos aqui, sobretudo por meio da pressão de organizações sociais e da sociedade civil e, ainda, de experiências como o Bolsa Família.
Com 2015 chegando cada vez mais perto, a GCE leva adiante sua campanha de pressão global e espera que atores como os movimentos sociais brasileiros e líderes como o presidente Lula continuem a dar um bom exemplo e a defender a causa do bem global nessa questão de importância tão vital.
Acreditamos que as histórias de êxitos vão inspirar outros líderes de países em desenvolvimento a redobrar seus esforços. Também estamos convencidos de que mostrar o que pode ser conseguido com a vontade política certa, respaldada por recursos, pode envergonhar os doadores, levando-os a cumprir suas promessas.
O ano de 2008 também será o 60º desde a Declaração dos Direitos Humanos da ONU; vamos nos assegurar de que a geração que vai nascer neste ano possa finalmente crescer com a luz e a esperança que a educação traz à vida de cada um.
KAILASH SATYARTHI , indiano formado em engenharia eletrônica, é o presidente da Campanha Global pela Educação. Foi o fundador da Aliança do Sul da Ásia contra a Escravidão das Crianças e da Marcha Global contra o Trabalho Infantil. Em 2006, foi indicado ao Prêmio Nobel da Paz.
Marcadores: da Dignidade da Política
As musas não têm perfil, seu rosto quem o dá é o Destino, a seu gosto.
- São feitas da matéria de que são feitos os sonhos!
Desejar o corpo da musa é o abismo.
Foi inevitável: me atirei.
Cruzei a ponte que separa os dois mundos incompatíveis.
Agora, feito um bailarino hindu que dançou no alto de uma árvore
na ponta de um pé só,
penso o equilíbrio entre o ar e o vazio, as mãos mandam mensagens,
um alfabeto de gestos, enquanto despenco.
Lá embaixo alguém acena: pareço dizer adeus?
Na guerra dos mundos, os dois mundos que não combinam acabaram por se tocar.
Já era tarde, noite alta.
E o corpo da musa,
impenetrável.
Marcadores: À guisa de filosofia, Autorais
Próximo ao chão a penúltima descoberta
Que a lógica violenta das cores tinge
A velocidade terrível da queda
A velocidade terrível da queda
Marcadores: Lobão
Saturday, January 19, 2008
Sunday, January 13, 2008
2 + 1 + 1 + 9 + 1 + 8 + 2 + 0 = 24 = 2 + 4 = 6
O caminho do amor e da decisão
Saturday, January 12, 2008
Alguns leitores me disseram não ter achado claro o significado da expressão "modernidade filosófica", que, no artigo passado, contrapus ao relativismo vulgar. Em outra ocasião, havia citado Kant para explicar que a modernidade surge e se mantém como a época da crítica, isto é, da razão crítica.
Criticar é separar ou distinguir. A crítica põe de um lado o que passa pelo seu crivo e de outro lado o que não passa por ele. Já que dar nome às coisas, defini-las, classificá-las etc são modos de distingui-las umas das outras, essas atividades representam manifestações da crítica. Assim, a razão crítica constitui uma condição da própria linguagem que, por sua vez, a potencializa.
A crítica distingue entre as proposições logicamente necessárias e as logicamente contingentes. As necessárias (por exemplo, "A = A") são aquelas cujo oposto é contraditório, logo, inconcebível. As contingentes (por exemplo "a Terra gira em torno do Sol") são aquelas cujo oposto é concebível.
Também a dúvida é uma manifestação da razão crítica. A dúvida metódica, que inaugura a filosofia moderna, lembra que, sendo contingente que eu - seja lá quem eu for - não esteja a delirar ou sonhar, há sempre, em última análise, a possibilidade de que eu esteja a delirar ou sonhar. Conseqüentemente, é uma verdade necessária que, em última análise, não posso ter certeza absoluta da existência ou efetividade de coisa nenhuma. Só não posso, é claro, duvidar da efetividade de mim mesmo, uma vez que, mesmo ao duvidar dela, eu a exerço. Observe-se, entretanto, que, neste contexto, "eu" não sou nenhum ser concreto, de modo que a efetividade em questão é a da própria razão crítica, de que não passo de portador.
A cláusula "em última análise", que tenho repetido, está longe de ser meramente retórica. É só no nível extremo de radicalidade analítica que todas as certezas mencionadas são relativas. No nível dos conhecimentos práticos, usamos as palavras de outro modo.
Isso é um pouco como o que ocorre com a física relativista. A dilatação do tempo, por exemplo, segundo a qual o tempo passa tanto mais rápido quanto mais rapidamente um objeto se mova, é algo que só se observa a velocidades próximas da luz. Como tais velocidades jamais são alcançadas pelos objetos cotidianos, os efeitos da relatividade não são observáveis na vida corrente. Assim, no dia-a-dia, devemos nos comportar e falar como se o tempo fosse o mesmo para todos os objetos, mesmo sabendo que, em última análise, não é assim.
Do mesmo modo, no nível da vida corrente, considero ter certeza absoluta de estar sentado em frente ao meu computador, terminando de escrever este artigo. Digamos que o artigo estivesse um pouco atrasado e o editor do jornal me telefonasse, perguntando por ele. "Estou terminando de escrevê-lo", diria eu. Talvez ele duvidasse disso e insistisse: "Tem certeza?". Possivelmente, então, eu lhe responderia, por exemplo: "Certeza absoluta!". Com essa resposta, eu estaria sendo muito mais veraz do que se tivesse respondido, no lugar de "certeza absoluta", "certeza relativa". Por quê? Porque, nesse último caso, eu lhe daria a falsa impressão de não estar realmente a terminar o artigo.
Mas por que, então, não abandonar a "última análise" e ficar restrito ao plano das certezas práticas? Porque o reconhecimento da possibilidade de que esteja errado qualquer um dos nossos pretensos conhecimentos empíricos, bem como qualquer um dos nossos sistemas de idéias, tanto laicos quanto religiosos, é importante para, entre outras coisas, a constituição da ciência. Chamamos esse reconhecimento de "falibilismo".
Eis como, no que diz respeito ao conhecimento, se opõem a modernidade filosófica e o relativismo vulgar. Este nivela todos os pretensos conhecimentos, considerando-os como igualmente verdadeiros e/ou igualmente falsos. A modernidade filosófica, ao contrário, permite hierarquizar os conhecimentos.
A partir do falibilismo, ela determina a produção do conhecimento científico como um processo em princípio aberto à razão crítica, público, baseado em premissas imanentes, e cujos resultados são - em última análise - sujeitos a serem revistos ou refutados. A certeza que posso ter da verdade do conhecimento produzido nessas condições não é menor do que a certeza prática que tenho de estar sentado em frente ao meu computador. Por outro lado, o falibilismo revela o caráter fictício de todo pretenso conhecimento que se subtraia à razão crítica ou à inspeção pública, que se baseie em premissas transcendentes, ou cujas doutrinas sejam impermeáveis a revisões ou refutações.
Antonio Cicero
Marcadores: Filosofia
Livro clássico de Flaubert faz rir com nó na garganta
Quem tiver preparado aquela famigerada listinha de resoluções de Ano Novo ainda tem chance de nela acrescentar um item mais "realizável" do que os habituais "vou emagrecer", "vou fazer ginástica", "vou me estressar menos". Seria ele (e o crítico literário é, por dever de ofício, sempre otimista em suas expectativas): "vou ler o livro Bouvard e Pécuchet.
Comédia da imbecilidade (e da fragilidade) humana, o romance de Gustave Flaubert, como escreveu Juan José Saer, vai fazer seu leitor rir bastante, mas muitas risadas serão acompanhadas de um "nó na garganta".
Produto de um trabalho insano, para o qual centenas de livros dos assuntos mais diversos tiveram de ser consultados, o texto conta o encontro de dois copistas que se conhecem por acaso e, percebendo inúmeras afinidades, resolvem depois de um tempo juntar as economias e uma herança que em boa hora chegara e se mudar para o campo, onde poderiam estudar e fazer experiências a respeito de tudo que existe.
É assim que, capítulo após capítulo, a partir de um esquema narrativo absolutamente estruturado, acompanhamos os personagens mergulhando no mundo da agricultura, da química, da medicina, da história, da literatura, da filosofia, da religião etc.
Como afirma Guy de Maupassant em artigo (reproduzido em apêndice nesta nova edição) de 1881, publicado quando o livro é lançado (um ano após a morte de Gustave Flaubert, que não consegue terminá-lo), o texto faz "um exame de todas as ciências, da forma como elas se manifestam a dois espíritos bastante lúcidos, medíocres e simples".
Possivelmente, uma das questões centrais da obra seja que, ainda que a mediocridade e a simplicidade dos dois amigos se mantenham inalteradas, os instantes de lucidez parecem se ampliar na mesma medida em que a variedade de temas se multiplica (e o capítulo sobre religião, nesse sentido, é devastador).
Daí um pessimismo que o final nunca escrito, mas do qual são conhecidos os planos, só consegue exacerbar. Este inacabamento, aliás, pode ser visto como uma das marcas de distinção da obra, uma qualidade especial de textos que talvez tenham chegado perto demais de um lugar que não poderia ser alcançado -textos como O Processo, de Franz Kafka, ou O Homem Sem Qualidades, de Robert Musil (se você quiser aumentar aquela listinha de resoluções de final de ano...).
ADRIANO SCHWARTZ é professor de literatura da Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) da USP
BOUVARD E PÉCUCHET
Autor: Gustave Flaubert
Tradução: Marina Apenzeller
Editora: Estação Liberdade
Quanto: R$ 48 (400 págs.)
Avaliação: ótimo
Marcadores: Sobre leituras
Friday, January 11, 2008
Quando janto fora, prefiro os restaurantes onde sou um cliente conhecido, porque, em princípio, eles aceitam com um sorriso meu comportamento, que é um pouco atípico: não gosto de ler o cardápio, peço o prato do qual estou a fim naquela noite, que ele esteja ou não no menu. Caso a cozinha não disponha dos ingredientes necessários, o maître e eu imaginamos um compromisso próximo de meus desejos.
Nota: às vezes os que lêem o cardápio do começo ao fim, à força de hesitar entre massas, risoto, carne ou peixe, acabam se entupindo de pão e couvert - e assim perdem o apetite.
Pensei nisso ao reler O Paradoxo da Escolha, Por que Mais é Menos, de Barry Schwartz, recentemente traduzido em português (ed. Girafa). Schwartz constata, com razão, que a multiplicação das possibilidades de escolha (que é própria da sociedade de consumo) constitui, de fato, um fardo.
Exemplo: queremos comprar uma calça jeans e descobrimos que existem infinitos cortes, desbotamentos, preços etc. Ótimo, somos LIVRES PARA escolher entre centenas de jeans. Mas, de repente, eis que NÃO somos LIVRES DE uma tarefa, no fundo, fútil: a de encontrar a calça que nos veste melhor na perfeita relação custo/benefício.
Na hora de escolher um carro, uma faculdade, uma profissão, um país ou uma cidade em que morar, as escolhas possíveis são, hoje, incontáveis. Portanto seríamos mais livres, não é? Pode ser. Em compensação, temos a trabalhosa (e, às vezes, desanimadora) incumbência de escolher.
Schwartz opõe dois tipos subjetivos: os "maximizadores" e "os que se contentam com algo suficientemente bom". Os maximizadores querem absolutamente fazer a escolha certa; os outros sabem se satisfazer sem ter que alcançar a certeza de que fizeram o melhor negócio.
Ora, constata Schwartz com razão, o maximizador não é nunca feliz: ele é corroído pelo remorso e pela dúvida (será que examinou efetivamente todas as possibilidades?).
Schwartz chega a imaginar que a epidemia de depressão das últimas décadas tenha uma relação com a multiplicação das escolhas possíveis e, portanto, com a insatisfação crônica de nosso lado maximizador. Obviamente, os que sabem se satisfazer vivem melhor. Conclusão de Schwartz: o excesso de liberdade nem sempre é bom.
Tudo bem. Mas vamos aplicar a visão de Schwartz ao campo amoroso. É claro que, se a tradição nos obrigasse a nos casar com a moça escolhida pelos anciões de nossa aldeia, a vida amorosa seria mais fácil. A liberdade para se juntar com quem quisermos é, de fato, uma complicação: para ter a certeza de que Fulano é meu homem fatal, com quantos Sicranos deverei compará-lo?
Por outro lado, se adotarmos a sabedoria dos que sabem se contentar com o que lhes agrada, nossos parceiros e parceiras não vão gostar.
Em geral, preferimos ser amados por quem acha que somos a melhor escolha possível, em absoluto.
Ou seja, na vida amorosa, os maximizadores sofreriam como sempre, enquanto os que "se contentam" seriam detestados por parceiros e parceiras. Como fica? Pois é, talvez a vida amorosa seja um bom exemplo para descobrir os limites das idéias de Schwartz, porque, nela, a liberdade certamente não consiste em poder escolher o amado numa lista de pretendentes. Amar tem mais a ver com "encontrar" do que com "escolher".
O livro de Schwartz é ótimo e divertido sem contar que pode ajudar todas as pessoas que se inibem diante da multiplicidade dos possíveis. Mas Schwartz parte de um pressuposto, que está implícito desde seu primeiro exemplo (o dos jeans): ele considera a pluralidade das escolhas possíveis como o índice da liberdade. Quando constata que essa liberdade é fonte de tormentos, ele conclui que talvez seja melhor sermos menos livres e mais felizes.
Ora, a visão que Schwartz tem da liberdade é parasitada pelo próprio modelo do consumo, cujos impasses ele castiga.
Ser livre não significa poder escolher entre os objetos disponíveis nas prateleiras do supermercado; ser livre significa saber criar o que queremos e encontrá-lo, mesmo e sobretudo quando não está em lista alguma de liquidações e promoções. Certo, o mal-estar do maximizador é uma patologia da liberdade de escolha. Mas a liberdade de escolher entre as ofertas que estão nos cardápios é, por sua vez, uma deformação da verdadeira liberdade - a de inventar.
Contardo Calligaris - Folha de São Paulo
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Alguém entendido em "cinemão" diria que "Desejo e Reparação" apela para recursos fáceis de dramaturgia. Que o protagonista, num parque de diversões devastado pela guerra, atinge as vísceras de qualquer um: grandiloqüência, desespero. Mas não sou especialista.
Talvez só goste de histórias. E, nesse sentido, o filme é brilhante. Ele é exatamente sobre o que a história e a literatura são capazes de fazer.
Uma garota fantasiosa, Briony, com olhos que vêem mais a fantasia do que a realidade (e, afinal, o que é isso?), é capaz de arruinar a vida das pessoas que mais ama. Por imaginação, amor e medo, coisas muito próximas e, até, indiferenciáveis.
A história é adaptada do livro homônimo de Ian McEwan, e o filme é produzido por ele próprio. Na narrativa, a fantasia, mesmo que de um modo ingênuo, provoca o mal, e a idéia mais difícil é a da reparação.
Melanie Klein, em "Amor, Ódio e Reparação", mostra que a última é uma das práticas mais dignas de um indivíduo. A reparação é um arrependimento ativo, que requer mergulho no cerne do vazio, para poder retratar o estrago.
Nem todos são capazes de reparar; é preciso coragem, mais do que para provocar o sofrimento.
A questão do filme é: se um escritor pode tudo, como Deus, de que vale sua tentativa de reparação? "Não há reparação possível para Deus nem para os romancistas, nem mesmo para os romancistas ateus." É o que diz Briony no final de sua vida, na interpretação inacreditável de Vanessa Redgrave, o que faz valer o filme, mesmo para os especialistas.
Como a arte pode reparar tudo, pois inventa a realidade, talvez ela não seja capaz de reparar nada.
Não posso concordar com isso. Mesmo que as vítimas não se beneficiem da reparação do artista, nós, espectadores catárticos, teremos nosso terror e nossa piedade, prontos para possíveis reparações.
Noemi Jaffe - colaboração para a Folha
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General Meaning: Traditionally called the High Priestess, this major arcana, or trump, card represents human wisdom. She can be viewed as a kind of female Pope, the ancient Egyptian Priestess of Isis, the even older snake and bird Goddesses, the Greek Goddess Persephone, or the Eve of Genesis before the Fall.
For the accused heretics who were burnt at the stake for revering her in the 14th and 15th century, she symbolized the prophecy of the return of the Holy Spirit, which was perceived as the female aspect of the Holy Trinity.
In the sequence of cards in the major arcana, the High Priestess appears as soon as the Fool decides he wants to develop his innate powers, making a move toward becoming a Magus. The High Priestess is his first teacher, representing the Inner Life and the method for contacting it, as well as the contemplative study of Nature and the Holy Mysteries.
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Wednesday, January 09, 2008
Você sabe o que é ter um amor, meu senhor?
Ter loucura por uma mulher?
E depois encontrar esse amor, meu senhor
Nos braços de um tipo qualquer?
Você sabe o que é ter um amor, meu senhor
E por ele quase morrer?
E depois encontrá-lo em um braço
Que nem um pedaço do seu pode ser?
Há pessoas com nervos de aço
Sem sangue nas veias e sem coração
Mas não sei se passando o que eu passo
Talvez não lhes venha qualquer reação
Eu não sei se o que trago no peito
É ciúme, despeito, amizade ou horror
Eu só sinto que quando a vejo
Me dá um desejo de morte e de dor
Tuesday, January 08, 2008
Sunday, January 06, 2008
No espaço de um segundo entram juntos e agem conjuntamente
O Grande Khan
O Queijo Appenzeller
Denise
O Açougueiro
Leda
Circe
A Ouvinte
A Norna
O Cavaleiro Nevado
A Cúmplice
O Emissor
A Dama
A Mãe
O Príncipe
O Andarilho
O Menino de 14 anos
O Nenê
O Prisioneiro
A Manipedicure
O Huno
O Homem-Orelha
A Madona
O Caçador
O Receptor
A Druida
O Espectador
O Anão
A Datilógrafa
O Homem que mal pode compreender como é que a peça já terminou.
no blog do Antonio Cicero
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General Meaning: What has traditionally been known as the Moon card refers to a deep state of sensitivity and imaginative impressionability, developed within a womb of deep relaxation. Here we dream and go into trance, have visions and receive insights, wash in and out with the psychic tides, and experience deep mystical and/or terrifying realities beyond our ordinary senses. The full moon and/or eclipse cycle charted by the Magi (as in some of the earliest Moon card images) exemplify this as a mechanism that Nature uses to expand consciousness.
The variants of the courtly lovers (representing skillful use of the sex force) or the man sleeping it off under the tree (use of drugs to alter consciousness) are also traditional avenues for tapping this primal force. Human interest in higher states propels us to the frontiers of consciousness, where we cannot always control what happens. The Moon card represents the ultimate test of a soul's integrity, where the membrane between self and the Unknown is removed, and the drop of individuality reenters the Ocean of Being. What transpires next is between a soul and its Maker.
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Saturday, January 05, 2008
Chico Buarque
Quem vem lá
Que horas são
Isso não são horas, que horas são
É você, é o ladrão
Isso não são horas, que horas são
Quem vem lá
Blim blem blão
Isso não são horas, que horas são
A casa está bonita
A dona está demais
A última visita
Quanto tempo faz
Balançam os cabides
Lustres se acenderão
O amor vai pôr os pés
No conjugado coração
Será que o amor se sente em casa
Vai sentar no chão
Será que vai deixar cair
A brasa no tapete coração
Quando aumentar a fita
As línguas vão falar
Que a dona tem visita
E nunca vai casar
Se enroscam persianas
Louças se partirão
O amor está tocando
O suburbano coração
Será que o amor não tem programa
Ou ama com paixão
Mulher virando no sofá
Sofá virando cama coração
O amor já vai embora
Ou perde a condução
Será que não repara
A desarrumação
Que tanta cerimônia
Se a dona já não tem
Vergonha do seu coração
Minha empregada Mme. Thérèse, que já ia se conformando em ser chamada de dona Teresa, caiu doente. Mandou-me um bilhete com a letra meio trêmula, falando em reumatismo. Dias depois, apareceu, mas magra, mais pálida e menor; explicou-me que tudo fora conseqüência de uma corrente de ar. Que meu apartamento tem uma courant d'air terrível, de tal modo que, àquela tarde, chegando em casa, nem teve coragem de tirar a roupa, caiu na cama. "Dói-me o corpo inteiro, senhor; o corpo inteiro."
O mesmo caso, ajuntou, houve cerca de 15 anos atrás, quando trabalhava em um apartamento que tinha uma corrente de ar exatamente igual a essa de que hoje sou sublocatário. Fez uma pausa. Fungou. Contou o dinheiro que eu lhe entregava, agradeceu a dispensa do troco. Foi lá dentro apanhar umas pobres coisas que deixara. Entregou-me a chave, fez qualquer observação sobre o aquecedor a gás - e depois, no lugar de ir embora, deixou-se ficar imóvel e calada, de pé, em minha frente. Repetiu a história da outra corrente de ar, a de 1935. Passou a mão pelos cabelos grisalhos - e me revelou que sua patroa de então, uma senhora forte, rica, bonita, de menos de quarenta anos, também fora vítima da corrente de ar. Outra pausa e acrescentou: morreu.
Vigiou um pouco minha surpresa, mas como eu não dissesse nada, queixou-se do frio. Tive um movimento de ternura por dona Teresa: ofereci-lhe o cachecol que o pintor Caribé comprou para mim em Buenos Aires, onde - isso me ocorreu na ocasião - um cachecol tem o nome bastante pitoresco e vivo de bufanda. Eu pensava apenas nisso, na palavra bufanda, quando Mme. Thérèse voltou a 1935 e detalhou como sua patroa morreu depois de pegar uma pneumonia devido à corrente de ar - igual a esta, senhor, igual. E uma mulher forte, nova...
Fiz uma pergunta desviacionista: era loura? Sim, loura, rosada. Meus olhos devem ter ficado tristes. Não há falta na praça de mulheres louras e rosadas, mas também não há tantas a ponto de devermos permitir que elas sucumbam assim, levadas pelos ventos dos corredores. Fiquei calado. Então dona Teresa fez a seguinte pergunta:
- E a sua tosse, senhor, vai melhor?
Depois do que, se despediu para sempre, com muitos agradecimentos; e desceu a escada com uma certa tristeza. Como sentisse que eu ficara a olhá-la da porta, voltou-se na primeira curva do caracol e me disse, suave como a minha mãe em Cachoeiro de Itapemirim, que eu cuidasse da tosse. Mas disse - hélar! - sem esperança mais nenhuma.
A Borboleta Amarela - As melhores de Rubem Braga - 200 Crônicas Escolhidas
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Friday, January 04, 2008
Se a noite tem luar
O azul do céu me faz lembrar
Da luz do teu olhar
Comum
É tão comum ficar assim
Vagando pra lugar nenhum
A noite não tem fim
Quando o clarão
Da noite se fôr
E o calor
Da luz do Sol chegar
Vai me encontrar
Tentando achar razão
Pra me lembrar
Da cor do teu olhar
Tão azul
Azul
Luar azul eu sei de cor
A dor que fica ao meu redor
Até o Sol se pôr
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Thursday, January 03, 2008
A confrontation with a loved one is possible today, and you may find yourself engaging in somewhat self-critical behavior. Don't. Today is the perfect day for greater understanding of yourself and others. Make this a time for spiritual realization rather than negative back talk.
Theme: Quiet, Insightful, Analytical, Mystical, Intuitive
Astro Association: Cancer
Tarot Association: Chariot
* diminish pressure
** pode ser um importante artifício /artefato / negócio / manha / saber-fazer / know how
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