Chego, agora, ao inefável centro de meu relato; começa aqui meu desespero de escritor. Toda linguagem é um alfabeto de símbolos cujo exercício pressupõe um passado que os interlocutores compartem; como transmitir aos outros o infinito Aleph, que minha temerosa memória mal e mal abarca? Os místicos, em análogo transe, são pródigos em emblemas: para significar a divindade, um persa fala de um pássaro que, de algum modo, é todos os pássaros; Alanus de Insulis, de uma esfera cujo centro está em todas as partes e a circunferência em nenhuma; Ezequiel, de um anjo de quatro faces que, ao mesmo tempo, se dirige ao Oriente e ao Ocidente, ao Norte e ao Sul. (Não em vão rememoro essas inconcebíveis analogias; alguma relação têm com o Aleph.) É possível que os deuses não me negassem o achado de uma imagem equivalente, mas este relato ficaria contaminado de literatura, de falsidade. Mesmo porque o problema central é insolúvel: a enumeração, sequer parcial, de um conjunto infinito. Nesse instante gigantesco, vi milhões de atos prazerosos ou atrozes; nenhum me assombrou tanto como o fato de que todos ocupassem o mesmo ponto, sem superposição e sem transparência. O que viram meus olhos foi simultâneo; o que transcreverei, sucessivo, pois a linguagem o é. Algo, entretanto, registrarei.
Jorge Luis Borges - O Aleph
Jorge Luis Borges - O Aleph



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