Friday, December 31, 2010

Dizei-me o que ledes e eu vos direi quem sois

Meu criado-mudo repleto de livros 2010

José Castello - João Cabral de Melo Neto: O Homem Sem Alma

Zuenir Ventura - Cidade Partida

Laure Adler - Nos Passos de Hannah Arendt

Norberto Bobbio - A Era dos Direitos

Sigmund Freud - O Mal-Estar na Cultura

Gustave Flaubert - Madame Bovary

Marcelo Leite - Folha Explica Darwin

Hunter S. Thompson -  Medo e Delírio em Las Vegas

Guilherme Fiuza - Bussunda: a vida do casseta

João Cabral de Melo Neto - Morte e Vida Severina

Leonardo Cortez - Trilogia Canalha

Cormac McCarthy - A Estrada

Cormac McCarthy - Onde os Velhos Não Têm Vez / Meridiano de Sangue ou O Rubor Crepuscular no Oeste / Todos os Belos Cavalos / A Travessia / Cidades da Planície

Hugh Laurie - O Vendedor de Armas

Hervé Bourhis - O Pequeno Livro do Rock

Gay Talese - Fama e Anonimato

John Hersey - Hiroshima

Jon Krakauer - Na Natureza Selvagem / No Ar Rarefeito

Ryszard Kapuscinski - O Imperador

Helen Fielding - O Diário de Bridget Jones

Meu criado-mudo repleto de livros para as férias

Keith Richards (com James Fox) - Vida

Fernando Lichti Barros - Casé: como toca esse rapaz!

Jean-Claude Carrière e Milos Forman - Os Fantasmas de Goya

Lobão (com Claudio Tognoli) - 50 Anos a Mil

Dennis Lehane - Sobre Meninos e Lobos (Mystic River)

Truman Capote - A Sangue Frio

Sites do Ano



A música se chama Envelhecer e prova que o cara levou 30 anos pra aprender a compor igualzinho os Jonas Brothers

Thursday, December 30, 2010

1978. Eu estava na plateia. Você foi, também, Nei?


Dizzy & Benny na estação São Bento do Metrô.

Monday, December 27, 2010

VERISSIMO - O Estado de S.Paulo

O garoto me pediu um cavalo. Eu perguntei: "Um cavalinho de brinquedo?" Ele disse: "Não, um cavalo de verdade." Eu disse que ia ver, mas que seria difícil carregar um cavalo de verdade no meu saco.

Ele ficou me olhando. Depois disse:

- Você não é o Papai Noel de verdade, é?

- Claro que sou. Por que você pergunta?

- Porque no outro xópi tem um Papai Noel igual a você.

- E você pediu um cavalo pra ele?

- Pedi. E ele disse que ia me dar.

- Bom, talvez o saco dele seja maior do que o meu.

- Mas o Papai Noel de verdade é ele ou é você?

***

O que dizer para o garoto? É que nós temos o poder da ubiquidade, entende? Ubiquidade. A capacidade de estar em mais de um lugar ao mesmo tempo. Onipresença. Pergunte a sua mãe. Só existe um Papai Noel, mas ele está por toda parte. Está em todos os shoppings do mundo. Cada Papai Noel é a manifestação de uma mesma e única entidade superior. Só muda o nome e o tamanho do saco. Eu sei, é um conceito difícil de entender. Ainda mais na sua idade. Há anos, séculos, discute-se a natureza desta entidade multipartida. Existiu um Papai Noel histórico, que viveu e morreu, mas seu espírito perdurou, e perdura até hoje, porque a sua essência transcendia a sua materialidade. Sua sobre-existência supratemporal e a-histórica, como a definiria Kierkegaard, depende de uma predisposição da humanidade para ver na sua figura a idealização de um paradigma infantil de bom provedor, e a eternização da infância num "pai" amável que nunca morre, e volta, ciclicamente, todos os anos, ano após ano, na mesma data. No resto do ano ele reassume a sua imaterialidade mas mantém-se introjetado nos que acreditam nele, controlando suas ações e pensamentos, que serão premiados ou punidos quando da sua rematerialização anual, numa espécie Juízo Final parcelado. Eu, o Papai Noel do outro shopping e todos os milhares, milhões de papais noéis que surgem nesta época do ano somos apenas caras diferentes do mesmo ente reincidente que traz presente ou castigo, representando uma cosmogonia moral que rege o comportamento humano. Há quem diga que esta entidade que recompensa e pune não passa de um mito infantilizante que aprisiona a razão numa superstição obscurantista. Que Papai Noel não existe. Que eu sou uma fraude. Que o Papai Noel do outro shopping é uma fraude. Que todos os outros papais noéis do mundo são impostores, que por trás das suas barbas falsas há apenas pobres coitados tentando faturar alguns trocados sazonais com a crença alheia, e enganando criancinhas. Não é verdade. Pode puxar a minha barba. Eu existo, eu...

***

Nisso o garoto fez xixi no meu colo. Foi levado pela mãe, com pedidos de desculpa. Melhor assim, pensei. Minha explicação só iria assustá-lo. E eu só estaria tentando convencer a mim mesmo. Sou gordo, tenho uma barba naturalmente branca, sou quase um predestinado para ser Papai Noel de shopping. Mas todos os anos preciso combater minhas dúvidas. Como em qualquer caso envolvendo crença e fé, o pior são as dúvidas. Com o xixi eu nem me importo.

***

Mas veja como crer é importante. Em seguida sentou no meu colo um homem dos seus 40 anos. Não queria me pedir nada, só queria colo. Tinha estourado o limite do seu cartão de crédito nas compras de Natal e precisava que alguém o consolasse.

obs.: um Verissimo autêntico, sem as fajutagens que correm a internet, é um verdadeiro presente de Natal!

Saturday, December 25, 2010

"Mamãe, mamãe!... Quando eu morrer, eu gostaria de morrer como o vovô, tranquilamente, dormindo... E não gritando, histérico, vítima de pânico, como os passageiros do ônibus que ele dirigia"

lido no facebook

Friday, December 24, 2010

Bons meninos ganham presentes

Wednesday, December 22, 2010

Então é Natal...


Perguntaram ao Dalai Lama:
"O que mais te surpreende na Humanidade?"
E ele respondeu:
"Os homens...
Porque perdem a saúde para juntar dinheiro, depois perdem o dinheiro para recuperar a saúde...
Porque pensam ansiosamente no futuro e, por isso, esquecem-se do presente de tal forma que acabam por não viver nem o presente, nem o futuro...
E porque vivem como se nunca fossem morrer e morrem como se nunca tivessem vivido!"

Tirando o fato das frases antinômicas não soarem originais (parecem ditos populares), a ideia de que seres iluminados possam falar na... humanidade em terceira pessoa é tão despropositadamente antiga! Desculpem, não quero mais me sentir parte da ínfima população que se sente identificada com a mais ínfima parte da população que não faz parte da população. O nome do cara só podia ser lama...

Monday, December 20, 2010

1. O último filme-cabeça que fui ao cinema pra ver foi Fale com Ela, do Almodóvar. Saí da sessão com uma vontade enorme de ler o filme. Explico: o mood da história, os personagens, a linha da direção me convidavam a um tipo de introspecção que não consigo mais preservar tendo que enfrentar fila, compra de ingressos, barulho de pipoca. Mentem aqueles que dizem frequentar cinemas em que a plateia não mastiga sem parar, não atende o telefone sem parar, não põe o pé nas costas do seu assento. Eu sou capaz de aguentar isso tudo. Mas alguma coisa na tela precisa explodir. E não estou falando do final de Zabriskie Point. Já cumpri minha cota de filmes-com-mensagem. Aquele cara bacana que passava horas de sua juventude ouvindo línguas exóticas em montagens arrastadíssimas ainda vive dentro de mim. Mas, hoje em dia, ele lê.

Fale com Ela é um filme bonito? Sem dúvida. Tem momentos antologicamente duvidosos? Sem sombra de dúvida. Mas isso não é exclusivo do Almodóvar ou de Fale com Ela. Toda grande obra de arte padece dessa ambiguidade entre plenitude e carência. O que incomoda é a possibilidade de, quase sem esforço, a pessoa sair do cinema com a sensação garantida de que acabou de participar de uma experiência fundante, fundamental. E ainda sobrar espaço pra um jantarzinho, depois.

Tenho a impressão de que o Almodóvar é um romancista que não teve culhões pra escrever romance. Que encontrou naquela bizarrice de cores, humores e tipos sobre, ou sub humanos, um jeito mais cômodo de dar vazão a seu projeto de artista. Um processo semelhante ao de Caetano Veloso e Gilberto Gil. Cuidaram tanto do contexto em que estavam inseridos que acabaram deixando de lado o principal, o rigor na construção da obra, que é - sempre - pessoal e intransferível.

2. Ler filmes não significa o mesmo que uma outra experiência minha dos últimos meses: li O Vendedor de Armas, escrito por Hugh Laurie, o ator/criador do Doutor House da série de TV. Li, em seguida, O Diário de Bridget Jones.

Laurie escreveu um filme. A narrativa é devedora direta da narrativa clássica comercial de Hollywood. É, literalmente, um filme.

Não há nenhuma intenção reflexiva na escolha do estilo. O livro de Laurie é apenas um reflexo de nosso tempo. E não passa disso. Diferente do House, uma sacada de gênio.

Já o Diário de Bridget Jones, saído em 1996, é como ler, pior, um sitcom... brasileiro!

Ouço dizer que o filme é uma delícia. Que Renée Zellweger rouba a cena. Tomara. Lido, o Diário de Bridget Jones faz lembrar os piores momentos de Débora Bloch ou Fernanda Torres em seus sketchs didaticamente engraçados. Ou explica de quem as brasileiras andaram copiando.

3. Outras adaptações que vêm à lembrança: Na Natureza Selvagem e os toques moderninhos que Sean Penn quis dar à edição. O livro, jornalístico, abre mais portas para entender o moço que se "enterra" no Alaska selvagem; o filme escolhe menos recortes, é menos profundo, menos dialético. E é mais tocante. Talvez seja isso: quem quer ser tocado, vai ao cinema. Quem quer tocar a questão, lê o livro. As duas necessidades são humanas. Diferentes e complementares. Duro é o esforço de vencer trezentas páginas do humor espertinho de Helen Fielding e dar com os cornos em nada.

4. Onde Os Fracos Não Têm Vez. Espantoso ver o filme e ler o livro. O filme é o livro. Os Coen pegaram um filme pronto e, reverentemente, mexeram o mínimo. Dois socos no estômago é o que você leva quando se mete com eles. Mcarthy escreve filmes. Mas, há, em sua escolha, um propósito de estilo. Porque não é vantagem ser um homem de seu tempo. Qualquer trabalhador da construção civil que despenca do andaime é um homem do seu tempo.

Sunday, December 19, 2010

As Mentiras Que Os Homens Contam

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Tem uma goteira na cozinha, andar de baixo, quase ou mais que 20 passos.

Devo ou não devo?

Ela sobe pelas paredes, pelo ar, atravessa a sala, a porta a escada os degraus e chega aqui isolada de tudo alone absoluta e dona de nada mais que tudo. Ela é tão aleatória e doce! A gota pendura-se na torneira e salta para o infinito estrondo do inox da pia na mortalidade enêmera - ene vezes efêmera - que só gotas notívagas conquistam.

Devo ou não devo?

Os degraus friorentos do pequeno sobrado rangem ao me verem passar. Os degraus de madeira ainda sofrem ao me verem passar. Ainda. Devo.

Fecho a torneira uma volta, duas, três, arrebento o encanamento e me congelo no quintal esperando que o inverno não se esqueça nunca mais de mim.

Nada disso será ou é. Nada disso. Fico aqui ao lado do aquecedor simulando a salvação da minha neurastenia ou da minha total incapacidade de abandonar o conforto.

Devo. E vou. E acabou.

Nei kS / Hamamatsu shi, Shizuoka ken, Japan

http://www.flickr.com/photos/carlazavatieri/

Wednesday, December 15, 2010

Temer não admite que cadeira vazia do Nobel não tenha sido ocupada pelo PMDB

Sunday, December 12, 2010

Jornalismo Literário - Novembro / Dezembro

John Hersey - Hiroshima

Jon Krakauer - Na Natureza Selvagem / No Ar Rarefeito

Ryszard Kapuscinski - O Imperador

Como o que é tosco tem virado cult, SS tende a ser perdoado

RAUL JUSTE LORES - EDITOR DE MERCADO - FOLHA DE SÃO PAULO

A comoção popular à derrocada bilionária do banco PanAmericano mostra que, apesar de tudo, Silvio Santos é um empresário de sorte.

Apesar de sua conduta, ele obtém sucessivos perdões em uma cultura que adora desconfiar de outros empresários. Seu lugar garantido na memória afetiva de milhões de brasileiros o beneficia bastante.

"Que exemplo, ele colocou os próprios bens como garantia para pagar as dívidas", foi o elogio quase unânime. A atitude legal e esperada virou demonstração de correção e honestidade.

Colocar um parente, personal trainer, à frente do banco, foi tratado mais como excentricidade que como gestão pouco profissional.

Títulos de capitalização e carnês do Baú geraram fortuna em tempos de inflação galopante. Pessoas humildes depositavam suas economias e, desde que tivessem pago as mensalidades "em dia", poderiam trocar sua poupança um ano depois por panelas ou saboneteiras a preços inflacionados nas lojas do Baú.

Nem essa transferência de renda da base ao topo da pirâmide conseguiu manchar a admiração popular do dono do Baú. Em tempos de populismo e de jornalismo a favor de governos, o responsável pela "Semana do presidente", que bajulava militares sem culpa, acaba absolvido por default.

Mas aonde SS anda menos bem-sucedido é na plataforma onde era imbatível. O SBT é cada vez mais irrelevante. Dramalhões mexicanos importados ou adaptados aqui não repetem há anos o sucesso obtido por "Carrossel" ou "Maria do Bairro".

Gugu o trocou pela Record, Ratinho encolheu e a emergente classe C já consegue sair mais aos domingos, longe do aparelho da TV. Melhor uma economia pujante que a Porta da Esperança.

Mas, para quem arremessa dinheiro dobrado como aviãozinho à plateia para que mulheres simples se engalfinhem ou faz a menina Maísa chorar sob deboche, a admiração supera o ibope. A tendência atual de elevar ao status de cult o que é simplesmente tosco está a seu lado.

Friday, December 10, 2010

Deu na Folha. Mas o Lula falou antes.

09 / 12 / 2010

Em discurso no evento de balanço de quatro anos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva expressou solidariedade ao fundador do site WikiLeaks, o australiano Julian Assange. Lula se disse espantado por “não haver nenhuma manifestação” contra a prisão do australiano, acusado de agressão sexual a duas mulheres, e contra as retaliações que tem sofrido após a divulgação de documentos secretos de diplomatas americanos.

“Em vez de culpar quem divulgou, deve se culpar quem escreveu. Então eu presto minha solidariedade ao fundador do WikiLeaks”, afirmou Lula, que ainda criticou a imprensa por não defender o direito de livre expressão de Assange. “O rapaz do WikiLeaks foi preso e eu não estou vendo nenhum protesto contra a ameaça à liberdade de expressão”, disse.

Lula é o primeiro líder internacional a se manifestar de forma veemente contra a prisão de Assange. O presidente deu a entender que, apesar de Assange ser acusado de estupro na Suécia, sua prisão está relacionada à divulgação de dados sigilosos dos Estados Unidos. “Aí aparece o tal de WikiLeaks, desnuda a diplomacia que parecia inatingível, a mais certa do mundo, e começa uma busca. Eu não sei se não colocaram cartazes como no faroeste, de ‘Procura-se, vivo ou morto’, mas prenderam o rapaz”, afirmou.

Luciana Cobucci

editoriais@uol.com.br

Caça ao WikiLeaks 

Num ataque à liberdade de expressão, governos e empresas perseguem o site e seu fundador com o intuito de evitar novos vazamentos 

Está em curso uma cruzada de governos e empresas internacionais contra o WikiLeaks. O site, que existe desde 2007, ganhou fama em meados deste ano ao divulgar um vídeo que mostrava militares norte-americanos fuzilando iraquianos de um helicóptero.

No dia 28 de novembro, um domingo, sua página na internet iniciou a publicação de 251.288 despachos relativos a 274 representações diplomáticas dos EUA. Os "cables" revelam a opinião da diplomacia norte-americana sobre líderes mundiais e trazem à tona informações inéditas sobre a política internacional.

Entre outras revelações, soube-se que a secretária de Estado Hillary Clinton determinou a espionagem de membros da cúpula das Nações Unidas e que os Estados Unidos lançaram mísseis contra o que seriam alvos da Al Qaeda no Iêmen, provocando a morte de 200 civis e 40 terroristas.

Os vazamentos causaram fortes reações de governantes e deflagraram uma caçada ao australiano Julian Assange. Procurado pela Interpol, sob acusação de supostos crimes sexuais praticados na Suécia, o fundador do site entregou-se à Justiça britânica na terça.

A perseguição parece relacionada ao intuito de silenciar um novo meio de divulgar informações que ganhou uma inesperada projeção internacional e tornou-se um incômodo para governos de diversos países.

Espécie de caixa postal criada na rede mundial de computadores para receber e divulgar documentos secretos, o site WikiLeaks não é um órgão propriamente jornalístico, embora conte com profissionais da mídia para avaliar o material que recebe e mantenha acordos com veículos impressos - entre os quais o britânico "Guardian", o norte-americano "The New York Times" e esta Folha, que tem divulgado os "cables" relativos ao Brasil.

O caráter ambíguo do WikiLeaks, aliado à sua inexistente tradição -não há histórico consolidado de seus valores e comportamentos-, gera desconfiança sobre a possibilidade de o site vir a colocar em risco a segurança internacional e a vida de pessoas.

Essas incertezas possivelmente contribuem para as hesitações que se observam em setores que deveriam defender com vigor a liberdade de expressão e o direito da mídia, tradicional ou não, de divulgar informações reservadas.

Quanto a isso, há jurisprudência nos EUA, onde a Suprema Corte, em 1971, decidiu a favor do jornal "The New York Times" contra o governo de Richard Nixon, que determinara censura prévia para impedir a publicação dos chamados Papéis do Pentágono. O tribunal estabeleceu que o governo não pode obstar a publicação de notícias que considere lesivas à segurança ou aos objetivos nacionais.

Num mundo em que governos democráticos inventam mentiras para invadir países, vazamentos como os do WikiLeaks prestam um serviço ao esclarecimento e à verdade. Se a diplomacia exige sigilo, que seus responsáveis o mantenham com eficiência.

Sunday, December 05, 2010

Governador do Rio pretende sugerir a Dilma que leve a discussão sobre a legalização das drogas no mundo à ONU

O governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, afirmou que vai levar à presidente eleita, Dilma Rousseff, a ideia de defender em fóruns internacionais "uma discussão" a respeito da legalização das drogas leves. Ele disse a Kennedy Alencar que a repressão às drogas mata "inocentes". De acordo com Cabral, a legalização não poderia ser adotada de modo isolado pelo Brasil, mas por um conjunto de países.

FERNANDO HENRIQUE CARDOSO

O golaço carioca

O Rio marcou um gol, um golaço. E digo bem: foi a cidade do Rio de Janeiro e não apenas seu governo, a polícia ou as Forças Armadas. A César o que é de César: a articulação entre governo, polícias e Forças Armadas foi importante e deixa-nos a lição de que sem articulação entre os muitos setores envolvidos na luta contra o crime organizado e sem disposição de combatê-lo a batalha será perdida. Mas sem o apoio da sofrida população do Rio, dos cariocas e brasileiros que habitam a cidade, e muito particularmente sem o apoio da população que vive nas comunidades atingidas pelos males da droga e pela violência do tráfico, o êxito inicial não teria sido possível.

Estive no morro Santa Marta há pouco tempo, quando a Unidade da Policia Pacificadora já estava estabelecida e pude ver que efetivamente o medo e o constrangimento da população local haviam desaparecido. A droga ainda corre por lá, mas entre usuários e não nas mãos de traficantes locais. Sei que em São Paulo e em outras regiões do país também há tentativas bem sucedidas de devolver ao Estado sua função primordial: o controle do território e o monopólio do exercício da violência (sempre que nos marcos legais). Mas o caso do Rio é simbólico porque a simbiose entre favela e bairro, entre a cidade e a zona pretensamente excluída está entranhada em toda parte.

Há, portanto, o que comemorar. Faz pouco tempo eram quase 100 mil moradores de comunidades cariocas que se haviam libertado, graças à presença da Polícia Pacificadora, da sujeição ao terror do tráfico e das regras de “justiça pelas próprias mãos” ordenadas pelo chefões locais e cumpridas por seus esbirros. Com a entrada do Estado no Complexo do Alemão e na Vila Cruzeiro, há a possibilidade de incorporar mais gente às áreas restituídas à cidadania. Mas estas populações serão mesmo restituídas à vida normal em uma democracia? E neste passo começam as perguntas e preocupações. Sem que se restabeleçam as normas da lei, sem que a permanência da força policial, sem que a Justiça comum volte a imperar, sem que a escola deixe de ser um local onde se trafica, sem que os mercados locais sejam interconectados com os mercados formais da cidade e sem que a educação e o emprego devolvam esperança aos “aviões” (os jovens coagidos a serem sentinelas dos bandidos e portadores de droga para os usuários), a vitória inicial será de Pirro. Neste caso a não guerra em algumas comunidades pela fuga dos traficantes com parte de suas armas pode desdobrar-se adiante em um inferno a que serão submetidas populações de outras comunidades, seja por traficantes ou membros das milícias.

Não escrevo isso para diminuir a importância do que já se conseguiu. Pelo contrário, mas para chamar à responsabilidade todos nós, como cidadãos, como pais, avós, como partes da sociedade brasileira pelo que acontece no Rio e em quase todo o país. Fiquei muito impressionado com o que aprendi e vi ao integrar um grupo que está preparando um documentário sobre drogas. Estive em Vigário Geral em um encontro que José Junior do AfroReggae proporcionou para que eu pudesse entrevistar traficantes arrependidos e policiais envolvidos nas guerras locais. Entrevistei muitas mães de famílias, mulheres em presídios, jovens vitimados pelo tráfico (e quem sabe se não partes dele também). Eu havia estado na Palestina ocupada por forças de Israel e vi o constrangimento a que as populações locais são submetidas. Pois bem, no Rio de Janeiro, o constrangimento imposto pelo crime organizado e às vezes exacerbado pela violência policial, que por vezes se confundem, é pelo menos igual, senão maior, ao que vi na Palestina. A falta de liberdade de ir e vir que os bandidos de diferentes facções impõem a seus “súditos” forçados e o medo da “justiça direta” tornam as populações locais prisioneiras do terror do tráfico. E não adianta dar de ombros em outras partes do Brasil e pensar que “isso é lá no Rio”. Não, a presença do contrabando, do tráfico e da violência do crime organizado está em toda parte. E a ausência do Estado também, para não falar que sua presença é muitas vezes ameaçadora pela corrupção da polícia e suas práticas de violência indiscriminada.

Se agora no Rio de Janeiro as ações combinadas das autoridades políticas e militares abriram espaço para um avanço importante, é preciso consolidá-lo. Isso não será feito apenas com a presença militar, a da justiça e a do Estado. Este está começando a fazer o que lhe corresponde. Cabe à sociedade complementar o trabalho libertador. Enquanto houver incremento do consumo de drogas, enquanto os usuários forem tratados como criminosos e não como dependentes químicos ou propensos a isso, enquanto não forem atendidos pelos sistemas de saúde publica e, principalmente, enquanto a sociedade glamourizar a droga e anuir com seu uso secreto indiscriminadamente, ao invés de regulá-lo, será impossível eliminar o tráfico e sua coorte de violência. A diferença entre o custo da droga e o preço de venda induzirá os bandos de traficantes a tecer sempre novas teias de terror, violência e lucro.

Sem que o Estado, inclusive senão que principalmente no nível federal, continue a agir, a controlar melhor as fronteiras, a exigir que os países vizinhos fornecedores de drogas coíbam o contrabando, não haverá êxito estável no controle das organizações criminosas. Por outro lado, sem que a sociedade entenda que é preciso romper o tabu e veja que o inimigo pode morar em casa e não apenas nas favelas e se disponha a discutir as questões fundamentais da descriminalização e da regulação do uso das drogas, o Estado enxugará gelo. Ainda assim, só por liberar territórios nos quais habitam centenas de milhares de pessoas, o Rio de Janeiro enviou a todos os brasileiros um forte sinal de esperança.

Friday, December 03, 2010

Modernistas




Thursday, December 02, 2010

Como é que eu não tinha pensado nisso antes?
(ou, que puta ideia!)

ou, ainda: ovo de Colombo!