Sunday, January 29, 2012


Filme cult do Monty Python faz 30 anos com anúncio de novo longa

ANDRÉ BARCINSKI

Sexteto britânico influenciou geração de humoristas no Brasil

"Divido a humanidade entre quem gosta e quem não gosta de Monty Python", diz o humorista Marcelo Madureira, do "Casseta & Planeta".

"O Monty Python mostrou que qualquer tema, por mais polêmico que fosse, poderia ser tratado sem luvas de pelica", diz Allan Sieber, cartunista da Folha.

As frases dão uma ideia da influência que o grupo cômico inglês que fez cinco filmes para cinema e um programa na BBC, de 1969 a 1974, teve no humor brasileiro.

Formado por John Cleese, Graham Chapman, Eric Idle, Michael Palin, Terry Jones e Terry Gilliam, o Monty Python revolucionou o humor televisivo com seu estilo surrealista e nonsense.

Um dos filmes mais cultuados do grupo, Monty Python ao Vivo no Hollywood Bowl, gravação de um espetáculo do sexteto, está completando 30 anos.

O filme teve um grande impacto em humoristas brasileiros de várias gerações.

"Foi libertador ver aqueles caras interpretando as piadas em cima de um palco", afirma Madureira.

"O Monty Python foi uma mola que incentivou a transformar nosso humor, que era bidimensional, da palavra escrita, em um humor tridimensional, de palco", diz ele.

REVEZAMENTO

Allan Sieber fala que o humor politicamente incorreto do grupo, especialmente as piadas sobre religião, influenciaram diretamente seu curta Deus É Pai, vencedor de dois prêmios no Festival de Gramado de 1999.

"Acho que humor é como uma corrida de revezamento, em que o bastão é passado de geração para geração", diz Madureira. "É impossível não ser impactado pelo Monty Python. Eles são a pedra fundamental do humor de TV."

Madureira, um colecionador obsessivo, se lembra em detalhes da primeira vez que viu o Monty Python em ação. "Foi em 1978, quando fui ao cinema com o Beto [Silva, outro integrante do 'Casseta'], ver Monty Python e o Cálice Sagrado".

"Duas coisas me surpreenderam: a primeira foi que o Beto foi à sessão com uma mulher. A segunda foi a epifania criativa que o Monty Python me proporcionou. Foi como se eu tivesse descoberto um novo planeta."

Os fãs têm mais um motivo para comemorar: na semana passada, foi anunciado que os membros do Monty Python farão um novo filme, Absolutely Anything, com direção de Jones.

Saturday, January 28, 2012

Tuesday, January 17, 2012

O nascimento de Sean parecia amortecer, embora não de todo extinguir, o ímpeto criativo que não lhe dera paz desde [...] aquele sábado de verão de 1957 quando Paul McCartney entrou na sua vida e começaram os Beatles: o ciclo interminável da letra seguinte, da sequência de acordes seguinte, do single seguinte, do álbum seguinte, da esperança suprema seguinte e do grande desapontamento seguinte.

[...] Afastado das drogas e das encrencas, sumiram também o egoísmo adolescente, a dificuldade de concentração e a ojeriza às coisas práticas que a vida de um astro do rock pode legitimar para sempre. Embora uma babá fosse contratada para Sean, John sempre estava por perto, pronto para fazer qualquer coisa que fosse necessária, convencido de que só ele sabia como fazer aquilo direito. Até a troca de fraldas, aquele grande terror dos primeiros anos de Julian, não foi problema desta vez. A natureza tomava conta, fechando suas narinas, fazendo-o respirar instintivamente pela boca, transformando em ternura e alegria o que ele antecipava como nojo e ressentimento. Como muitos antes dele, percebeu que a cura para um vazio em nossa infância não está em ser cuidado, mas em cuidar de alguém; que tornar segura a vida de uma criança faz a nossa vida parecer mais segura.

Philip Norman - John Lennon: a vida

Monday, January 16, 2012


Silêncio Por Escrito

Sérgio Augusto

Para que tantos livros?, pergunto-me toda vez que entro numa livraria. Nas semanas que precedem o Natal, o assombro é ainda maior. As livrarias abarrotadas deveriam me encantar, mas elas, sinceramente, me assustam um pouco.

"Demasiados libros", queixou-se o poeta e ensaísta mexicano Gabriel Zaid, num ensaio de cento e poucas páginas que, inevitavelmente, materializou-se como livro, no início da década. Porcarias em demasia - deformo, pero no mucho, a tradução. Às vezes penso que a tão temida e discutida crise da indústria editorial talvez seja uma hipérbole, ou não haveria tanta gente escrevendo e publicando qualquer coisa para gratificar o ego e cevar a vaidade. E me lembro de Sócrates.

Sócrates não escreveu uma linha, e no entanto "inventou" a filosofia. Sem gastar tinta, Jayme Ovalle enriqueceu mais a vida cultural brasileira do que muitos escribas do passado e do presente. Graças apenas a quatro cartas contra a guerra, endereçadas a André Breton, Jean Vaché entrou para a história da literatura francesa da primeira metade do século passado.

O que me faz lembrar de todos aqueles autores e personagens literários que, por agudo senso de autocrítica, desencanto com o alcance das palavras, respeito ao próximo ou motivo mais nobre, optaram pelo silêncio, preferiram ser parcimoniosos ou mesmo ágrafos a entregar-se à grafomania. De Rimbaud, por exemplo, que aos 22 anos trocou em definitivo a poesia pela aventura. De Juan Rulfo, que ficou 30 anos em voluntário jejum literário. Do catalão Felipe Alfau, precursor do pós-modernismo, que passou em branco as últimas cinco décadas de sua vida. E de Monsieur Teste, alter ego de Paul Valéry, que não só desistiu de escrever como atirou sua biblioteca pela janela.

Adorno achava impossível escrever versos depois do Holocausto. Jay McInerney repetiu-lhe o exagero quando as torres gêmeas desabaram. Razões mais imponderáveis podem afetar ou mesmo esterilizar a criatividade de poetas e escritores. Por acreditar que "tudo já havia sido dito", La Bruyère não produziu mais que uma obra de textos curtos, embora essenciais para a compreensão dos costumes na França no século 17. Hugo von Hoffmanstahl projetou-se em pelo menos dois personagens, Lorde Chandos e Hans Bühl, para dar vazão à sua crescente descrença na linguagem, incapaz de "penetrar no âmago das coisas" e "expressar nossas emoções". Bühl, o desiludido protagonista da comédia Der Schwierige (O Difícil), chega mesmo a confessar que entende menos a si próprio quando fala do que quando está calado.

George Steiner, um dos primeiros teóricos da "poética do silêncio", deixou de escrever pelo menos sete livros por não ter suportado o desgaste emocional e a pressão psicológica que seus temas lhe impuseram. Os livros foram abortados, mas renderam um ótimo ensaio confessional de 209 páginas, editado há três anos com o título de My Unwritten Books. Os livros que afinal não escrevemos, diz Steiner, geram mais que um vazio, são uma "sombra ativa, irônica e angustiante", a nos lembrar sempre de vidas que deixamos de viver e caminhos que deixamos de trilhar. Mas eles nos dão a chance de "errar melhor", se soubermos aproveitá-la.

De um aforismo de La Bruyère - "A glória ou o mérito de certos homens consiste em escrever bem; o de outros, em nada escrever" - Enrique Vila-Matas pinçou a epígrafe perfeita para as fascinantes divagações sobre o que rotulou de "literatura do não", sobre romancistas e poetas que nada ou quase nada escreveram, contidas em Bartleby e Companhia, assunto de um debate que a Cosac Naify e a livraria Cultura programaram para o próximo dia 26.

Em Bartleby, o parabólico amanuense de Herman Melville, Vila-Matas identificou a origem de uma vertente fundamental da literatura contemporânea. Bartleby é um personagem kafkiano avant la lettre, símbolo e síntese do silêncio criativo ou da impossibilidade de escrever, que, para Kafka, é a premissa básica da literatura. Numa de suas parábolas, o silêncio das sereias afigurava-se mais ameaçador (e "inescapável") que seus cantos.

Quando as palavras se saturam de selvageria e mentiras, nada fala mais alto que um poema não escrito. Steiner desenvolveu essa tese num ensaio publicado há quase 50 anos, em boa parte articulado em torno do sentimento de impotência criativa de Hoffmanstahl e outros autores austríacos dos anos 1920 (destaque para o Hermann Broch de Os Sonâmbulos), todos ressabiados, em graus diversos, com a deterioração semântica da língua alemã e a instabilidade crônica da Europa Central. Um lamento sobre a "perda da palavra" concluía a ópera Moisés e Aron, que Arnold Schoenberg compôs em 1933, justamente no ano da ascensão do nazismo ao poder.

Steiner sugeriu que se fizesse um estudo entre as parábolas do silêncio de Kafka, Hoffmanstahl, Broch, Karl Wolfskehl, e o filósofo Wittgenstein. Para o autor do Tractatus Logico-Philosophicus, o mais expressivo de sua obra era o que não havia sido escrito.

Blaise Cendrars flertou um bocado com a ideia de uma bibliografia de obras jamais escritas. Marcel Bénabou foi além, publicando em 1986 um manifesto em favor da "literatura em potencial", intitulado Pourquoi Je n’ai pas Écrit Aucun de Mes Livres (Por Que não Escrevi Nenhum de Meus Livros). Já publicara meia dúzia, até aquela data, mas queria vender o peixe de que as obras que só ficaram na sua imaginação tinham lá seu valor e existiam virtualmente, em alguma biblioteca borgesiana de ficções fantasmagóricas. Com notas de rodapé que Vila-Matas confessadamente adoraria ter escrito.

Sunday, January 15, 2012

Irreconciliáveis

No início, Paul pretendia apenas processar Allen Klein. Mas o conselho de seus advogados foi de que, quando John, George e Ringo haviam contratado Klein contra a vontade de Paul, eles romperam o acordo de parceria como Beatles & Co. em abril de 1967, e que a melhor maneira de ele se proteger contra Klein no futuro seria encerrar juridicamente a sociedade. Como os outros três se opunham à ideia, não lhe restava outra saída senão processar a todos, assim como a Apple Corps, que possuía 80% da parceria.

O caso começou a ser julgado na Suprema Corte em 31 de dezembro de 1970, enquanto John ainda estava em Nova York. O advogado de Paul requereu a dissolução de Beatles & Co., solicitando a realização de uma contabilidade imparcial dos negócios e a indicação de um curador, ou árbitro financeiro independente, para supervisionar suas finanças a partir de então. O juiz, Edward Blanchard Stamp, recebera a informação de que a contabilidade da parceria havia sido "lamentável"; que apesar de uma renda entre 4 e 5 milhões de libras por ano, era possível que não houvesse condições de saldar débitos do imposto de renda e outras taxas; e, por fim, que Klein vinha pagando a si mesmo comissões às quais não tinha direito*.




[...] Depois de uma audiência de onze dias, o juiz Stamp propôs a nomeação de um curador que combinaria os papéis de gerente e síndico e por sua vez indicaria subgerentes - entre os quais Klein - para administrar os interesses financeiros dos Beatles e de Paul como entidades separadas. Como nenhuma das partes aceitou tal proposta, em 12 de março o juiz nomeou Douglas Spooner, sócio de uma firma de contabilidade da City de Londres, como "síndico e gerente de interesses comerciais do grupo, dependente do julgamento da ação principal".

Philip Norman - John Lennon: a vida

*Mesmo concluindo que a situação financeira deles era "confusa, incerta e inconclusiva", Stamp não encontrou indícios de que Klein tivesse colocado ou fosse colocar dinheiro da sociedade em seu bolso.

Monday, January 09, 2012

beatlesbible.com

Aquilo que hoje conhecemos como "cultura pop" ainda estava anos no futuro. O cenário para a fama inicial dos Beatles foi a escuridão vermelha aveludada de teatros e cinemas que, além dos filmes, ainda ofereciam aos seus frequentadores espetáculos de "variedades" ao vivo. Tanto quanto roqueiros, eles também eram menestréis que, apesar de seus rostos brancos e instrumentos eletrificados, teriam sido reconhecidos pelo avô homônimo de John. Uma das primeiras marcas do sucesso do grupo foi um espetáculo de Natal, o Beatles Christmas Show, organizado por Brian Epstein no cinema Astoria, no bairro londrino de Finsbury Park, no qual, além de seus sucessos, também interpretaram paródias de esquetes cômicos vitorianos. Participando de um programa de televisão com Morecambe e Wise, em 3 de dezembro, eles apareceram de blazers listrados e chapéus de palha de barqueiros, juntando-se ao duo de comediantes para uma versão de On Moonlight Bay. Antes de se tornarem a mais adorada banda de rock do mundo, os Beatles foram a última atração do teatro de variedades da Grã-Bretanha.

Philip Norman - John Lennon: a vida


Friday, January 06, 2012



Diz-nos Italo Calvino
nas suas Seis Propostas que
um dos ideais da poesia
é a Leveza - vista aí

no sentido que realce
o que subjaz, intrínseco,
ao aparente paradoxo
que há entre o que é leve e o que pesa -

e à guisa de argumento
usa a metáfora da Medusa
que petrifica a quem ousa
lançar-lhe um olhar direto

Ser um bloco de concreto
- face do peso da vida -
tem sua contrapartida
na natureza do objeto

que Perseu, não por acaso,
recebe das mãos das Musas:
um escudo que reluz a
tal ponto, que não só

protege como projeta
a hórrida imagem da Górgona.
Veja a vantagem de um cego:
escapa ao flerte enquanto luta

guiado pelo reflexo
e leva a termo a batalha
talhando o monstro, à navalha,
na altura do pescoço.

Redivivo em herói o moço
parte, retoma a jornada
- as alpercatas aladas -
leve, levando na bolsa o

crânio recém degolado
fardo arrancado do corpo
que lançará em torpor
pétreo, rígido, pesado

a quem olhos lhe ofereça
basta que se o erga do alforje.
A partir de agora rege
Perseu mais uma cabeça

Tuesday, January 03, 2012


VLADIMIR SAFATLE

Ideias e acontecimentos

Em Antropologia do Ponto de Vista Pragmático, o filósofo Immanuel Kant apresenta sua considerações a respeito do caráter dos povos. Lá encontramos páginas sobre os ingleses, alemães, franceses, espanhóis, turcos, entre outras nacionalidades.

Mas há nisso tudo um detalhe intrigante. Kant nunca saíra de sua cidade, Köninsberg (hoje, Kaliningrado). Não por outra razão, as tais páginas são um conjunto bisonho de lugares-comuns.

Esta pequena anedota diz muito a respeito de uma certa maneira de pensar que consiste em acreditar que a experiência nunca fornecerá nada capaz de reorientar uma ideia clara. O acesso à experiência acumulada em livros e relatos já forneceria o embate necessário para nos orientarmos no pensamento.

Qualquer coisa que eu, enquanto particularidade, experimente seria parcial, limitado e restrito a um contexto. Por essa razão, seu valor seria muito frágil.

Quase 200 anos depois, outro filósofo, Michel Foucault, resolveu fazer um caminho inverso. "Há muitos acontecimentos do mundo que forçam o pensamento a se reorientar", dirá Foucault. "Devemos ir lá onde tais acontecimentos estão."

E com tal ideia na cabeça, o filósofo francês foi ao Irã acompanhar de perto a revolução que acabou por levar o aiatolá Khomeini ao poder. Vários artigos seus sobre tal processo apareceram no jornal Corriere dela Sera.

As análises de Foucault não passaram à posteridade como o melhor exemplo de acuidade. De fato, ele compreendeu posteriormente os riscos nos quais a revolução tinha entrado, mas espera-se de um filósofo que ele consiga apreender os riscos antes deles estarem evidentes a todos.

Se a força da ideia, assim como a crença de que não há nada de novo sob o sol, pode nos cegar, o mesmo vale para o entusiasmo pelo acontecimento.

Entre estes dois polos, encontramos uma peculiar afirmação feita por um terceiro filósofo, Theodor Adorno. Logo após a audição de uma peça de John Cage, Concerto para Piano, Adorno volta para casa e escreve: "Eu não sei exatamente o que pensar".

Diante de um acontecimento tal como a obra de Cage, Adorno reconhecia que o melhor a fazer era dizer: "Eu não sei o que isto significa, só sei que precisarei de tempo para o pensamento voltar a se orientar". Abdicar deste tempo devido ao medo diante da angústia da indecisão seria o pior de todos os erros.

Este é o erro que cometemos com mais facilidade. Ele é o que mais fere. Às vezes, a indecisão prolongada é o tempo que o pensamento exige para se reconstruir diante dos acontecimentos.

Monday, January 02, 2012


MARCIO POCHMANN

Novos personagens?

O adicional de ocupados na base da nossa pirâmide social reforçou a classe trabalhadora, equivocadamente identificada como uma nova classe média

A centralidade do trabalho, conferida pelo impulso das políticas públicas em pleno ambiente de recuperação econômica dos últimos anos, foi responsável pelo fortalecimento do segmento situado na base da pirâmide social brasileira.

Na década de 2000, por exemplo, foram 21 milhões de novos postos de trabalho abertos, sendo 95% deles com remuneração de até 1,5 salário mínimo mensal, capazes de permitir a redução tanto do mar de pobreza existente como do patamar extremo da desigualdade no interior do rendimento do trabalho.

Na década de 1990, o Brasil das políticas neoliberais abriu somente 11 milhões de ocupações, sendo 62,5% delas sem remuneração.

O adicional de ocupados na base da pirâmide social reforçou o contingente da classe trabalhadora, equivocadamente identificada como uma nova classe média.

Talvez não seja bem um mero equívoco conceitual, mas expressão da disputa que se instala em torno da concepção e condução das políticas públicas atuais.

A interpretação de classe média (nova) resulta, em consequência, no apelo à reorientação das políticas públicas para a perspectiva fundamentalmente mercantil. Ou seja, o fortalecimento dos planos privados de saúde, educação, assistência e previdência, entre outros.

Nesse sentido, não se apresentaria isolada a simultânea ação propagandista desvalorizadora dos serviços públicos (o SUS, a educação e a previdência social).

A despolitizadora emergência de segmentos novos na base da pirâmide social resulta do despreparo de instituições democráticas atualmente existentes para envolver e canalizar ações de interesse para a classe trabalhadora ampliada. Ou seja, o escasso papel estratégico e renovado do sindicalismo, das associações estudantis e de bairros, das comunidades de base, dos partidos políticos, entre outros.

No final da década de 1970, estudos como o de Eder Sader (Quando Novos Personagens Entram em Cena) buscaram destacar que o crescimento econômico da ditadura militar culminou com o novo movimento de ascensão do grande contingente de brasileiros oriundos da transição do campo para cidades.

Aquela mobilidade na base da pirâmide social, que havia sido contaminada pela precariedade das cidades e dos serviços públicos, foi capturada pelo novo sindicalismo e por comunidades de base, o que impulsionou a luta pela transição democrática e pelo aparecimento das políticas sociais universalistas. Isto é, a chave do rompimento à longa fase da cidadania regulada predominante no Brasil, como descreveu Wanderley dos Santos (Cidadania e Justiça).

Ainda que no cenário derrotista das teses neoliberais vigente atualmente, elas parecem se renovar e ganhar impulso marqueteiro na agenda mercadológica do consumo. Isso torna a agenda das políticas públicas assentadas na centralidade do trabalho desafiada, posto que a força difusora de um conceito equivocado sobre alterações na estratificação social pode levar à dispersão e fragmentação da atuação do Estado.

O entendimento correto acerca do impulso ampliado da classe trabalhadora deveria ser acompanhado da transformação dos segmentos sociais emergentes em novos personagens pelas instituições democráticas atuais. Dessa forma, soergueriam os atores protagonistas da contínua luta pelas políticas públicas universais.

MARCIO POCHMANN, professor licenciado do Instituto de Economia e do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho da Universidade Estadual de Campinas, é presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).