Tordesilhas, a nova fronteira
512 anos após o descobrimento do Brasil, a linha imaginária separa um país rico de um que começa a realizar seu potencial de crescimento
MARCELO SOARES + SIMON DUCROQUET (SÃO PAULO)
O Brasil continua dividido pela linha de Tordesilhas, que estava em vigor quando Pedro Álvares Cabral aportou no país há 512 anos, data celebrada hoje.
Em vez de dividir terras portuguesas e espanholas, a linha de Tordesilhas do século 21 divide a riqueza a leste e o potencial a oeste.
Das 50 cidades que mais cresceram entre os censos de 2000 e 2010, 37 estão do lado espanhol de Tordesilhas.
A soja, segundo principal produto na pauta de exportações brasileiras, responde pela maior parte do crescimento. Além da sua própria colheita e beneficiamento, é o seu transporte que gera obras de infraestrutura, que atraem riquezas e trabalhadores.
"A população e a economia historicamente se concentraram numa faixa de até 100 km do litoral, o que facilitava as exportações", diz Antônio Nivaldo Hespanhol, diretor da Faculdade de Ciência e Tecnologia da Unesp em Ribeirão Preto - cidade localizada a 720 km do mar.
Com dois terços do território, o lado que foi da Espanha responde hoje por cerca de um quarto do PIB do país. Essa proporção já foi menor. Em 50 anos, o Centro-Oeste aumentou sua participação no PIB de 2% para 9,6%.
O Sul do Brasil desenvolveu-se mais cedo, por estar próximo ao mar, e Porto Alegre ainda hoje seria a capital mais rica do além-Tordesilhas. O geógrafo Marcos Aguiar, do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul, aponta uma diversificação recente no sul do Estado, tradicionalmente agropecuário.
MAIS TECNOLOGIA
Investimentos em portos e em tecnologia de produção são apostas de Aguiar para o crescimento da região.
O Centro-Oeste cresceu a partir da década de 1930, no governo de Getúlio Vargas, a partir da agricultura.
Com a construção de Brasília, a infraestrutura para levar a classe política até a nova capital fez surgirem novos polos urbanos.
A Embrapa também colaborou na ocupação do Centro-Oeste ao pesquisar como adaptar grãos ao cerrado.
Quando as commodities recuperaram valor no mercado internacional, a terra e o know-how estavam posicionados. "Hoje, agroindústrias como Bunge e Cargill investem diretamente na região que é a fonte dos grãos, o Centro-Oeste", afirma o professor da Unesp.
Para o futuro, ele aposta mais no desenvolvimento econômico do que no crescimento populacional do além-Tordesilhas. Grandes extensões de terra são necessárias para a agroindústria.
Embora o dinheiro do campo desenvolva a economia dos polos urbanos regionais, ainda faltam serviços atraentes a essas cidades.
Em Rondônia, sobra emprego, mas falta onde gastar dinheiro
Prazo para receber óculos com lentes antirreflexo: 15 dias. McDonald's fechado por alguns dias, logo após a inauguração, por falta de ingredientes. Uma corrida pelo ensino superior. Emprego farto, ao menos por enquanto.
"Hoje, só fica desempregado em Porto Velho [RO] quem quiser", diz a administradora Giovana Nor. "O problema é onde gastar dinheiro."
Com o contraste entre a disponibilidade financeira e a dificuldade logística, os estoques acabam rápido e demoram para ser repostos.
Há dois anos, a administradora deixou São Paulo. Morando a 500 metros do rio Madeira, presenciou a corrida de trabalhadores de todo o Brasil pelos empregos diretos e indiretos das hidrelétricas de Jirau e Santo Antônio. O setor de serviços cresceu.
Com um sistema de saúde ainda precário, muitos moradores de Rondônia precisam ir a São Paulo ou a Mato Grosso para obter tratamento. Segundo Nor, as usinas precisaram criar uma licença especial, de cinco dias, para os trabalhadores que viajam para visitar as famílias.
Qualquer espetáculo lota por quebrar a rotina de escassez de opções. Pode ser rock, frevo, teatro de rua ou música erudita, diz Nor.
(MS E SD)




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