Wednesday, November 26, 2025

26 de novembro de 2019

O Guedes, pinochetista raiz, usa a sombra do AI-5 pra nos meter medo. Ele, como todos os partícipes do Golpe, sabe que a memória da classe média solta faíscas quando alguém menciona a Ditadura de 1964.

Porém, antes de precisar fechar o cerco autoritário, a 'Aliança' desgovernante sabe que o esquema de gestão policial do Estado já funciona a pleno vapor para cerca de 90% da população brasileira.

Mais do que um aparelho repressivo centralizado como antigamente, o que Moro, Guedes e Bolsonaro têm à mão é a possibilidade de deixar o país entregue à sua própria lei-do-cão.

Anomia é o 'nome do jogo'.

Uberização do mundo do trabalho. Segurança para o capital especulativo 'na nuvem' do financismo global. Bala de fuzil e Caveirão para o convívio em sociedade.

Lembra No Country for Old Men. Lembra Blade Runner.

Tempos sombrios.

26 de novembro de 2022

A ordem é a seguinte: o Reinaldo Azevedo, filho-da-puta avant la lettre, que inventou "apenas" o termo 'petralha', esse você perdoa. A Vera Magalhães, você defende quando é atacada e esquece a virulência dos ataques dela defendendo o 'Moro enxadrista'. O Frota, não. O Frota você detona, não deixa ele abrir as asinhas, tá pensando o quê? Expulsa o Frota do grupo de transição. E o Mantega, quando o povo da extrema-direita fizer o mesmo, você não pia. Deixa o Mantega se foder sozinho, que nem quando ele foi preso na sala de espera da oncologia do Einstein. O Neymar, esse merece nossos melhores pensamentos, apesar do apoio incondicional que ele prestou ao Mijair e das 700 mil e tantas mortes que esse desgoverno carrega nas costas. É simples e a regra é clara: essa porra toda é aleatória e você deve se comportar como um cachorro de rua que fica esperando passar uma moto. Se a matilha correr atrás, você corre junto e late, mas late com toda a força. Se o motoqueiro cair, ponto pra sua galera. Se ele escapar, sempre tem outro passando logo mais. Se a cachorrada não se mexer, fica de boa. O importante é farejar a oportunidade e agir de acordo com o momento. E o momento a Deus pertence. Ah! Deus é o nome que se usava antigamente pra 'algoritmo'. Who let the dogs out?

Friday, November 21, 2025

‘Carneiros gays’ são salvos do abate por projeto de estilista de famosas com coleção de tricô

Edição digital Mundo / Época

‘Carneiros gays’ são salvos do abate por projeto de estilista de famosas com coleção de tricô

Produtores esperam que animais sejam reprodutores, mas mudanças no comportamento freiam planos de criadores. Animais são resgatados de matadouros e fazendas e se transformam em fornecedores de lã para confecção de roupas

Por The New York Times, Vanessa Friedman 20/11/2025

Michael Schmidt, colaborador do Chrome Hearts e estilista de rock n' roll de divas como Cher, Shakira e Sabrina Carpenter, ficou chocado ao ouvir falar das "ovelhas gays".

Ou, para ser justo, ele não ficou surpreso ao saber que alguns carneiros são considerados gays, ou "orientados para o sexo masculino", o que significa que se recusam a acasalar com ovelhas, um padrão comportamental observado em aproximadamente 1 em cada 12 carneiros e que os cientistas estudam há décadas. Em vez disso, ele ficou chocado ao descobrir o que acontece com muitas dessas ovelhas que fazem parte de grandes rebanhos em fazendas de produção — o tipo de estabelecimento onde, segundo Scott Carmody, chefe de operações domésticas da Woolmark, a proporção usual é de um carneiro para cada 50 ovelhas, e a função do carneiro é a procriação.

Se o carneiro não cumprir seu dever, geralmente é enviado para o matadouro.

— (Essencialmente) As ovelhas são mortas por serem gays — disse Schmidt.

Schmidt pensou que talvez a moda pudesse mudar a situação. Então, embora geralmente passe seus dias trabalhando com cota de malha e cristais Swarovski, ele uniu forças com a Rainbow Wool, uma organização sem fins lucrativos alemã criada por um fazendeiro na Vestfália que resgata ovelhas que não conseguem acasalar e as cria para a produção de lã, e com o Grindr, o aplicativo de encontros LGBTQ que se autodenomina o "bairro gay do mundo", para dar vida à história por meio de uma coleção de 37 peças de tricô.

Na semana passada, as peças de tricô foram exibidas no primeiro desfile de moda Rainbow Wool — embora chamá-lo de "desfile" seja, segundo Schmidt, um termo impróprio.

— É uma história sobre direitos dos animais — disse ele. — E é uma história sobre direitos humanos.

Segundo Tristan Pineiro, vice-presidente sênior de marketing de marca e comunicações do Grindr, é também “uma metáfora de como as pessoas gays são tratadas em todo o mundo”.

— As ovelhas gays são descartadas, esquecidas, vistas como sem valor — disse Pineiro. — Mas por meio delas, duas pessoas que jamais teriam se conhecido de outra forma, um criador de ovelhas alemão e um designer de Los Angeles, se conectaram e juntos criaram algo belo.

Numa época em que o mundo empresarial em geral se afastou de temas potencialmente controversos, o desfile de moda Grindr x Rainbow Wool é uma anomalia. Mas, segundo Schmidt, é exatamente por isso que ele é importante. Principalmente porque se concentra num tema — ovelhas fofas e adoráveis ​​— que pessoas de qualquer espectro político podem abraçar.

— Não vejo isso exatamente como moda — disse Schmidt. — Vejo como um projeto artístico. Está vendendo uma ideia, mais do que uma coleção de roupas, e a ideia que está vendendo é que a homossexualidade não faz parte apenas da condição humana, mas também do mundo animal. Isso desmente a ideia de que ser gay é uma escolha. Faz parte da natureza.

Pineiro foi mais direto:

— Não se pode dizer que as ovelhas foram corrompidas pela cultura woke.

Salvando as Ovelhas

Michael Stücke, de 52 anos, cofundador da Rainbow Wool, não tem a aparência de um ativista. Tímido e de óculos, ele passa a maior parte do tempo vestindo um agasalho verde-escuro que combina com seus campos. Ele cresceu em uma fazenda de gado e porcos e foi criado com certas expectativas: ele assumiria a fazenda da família, casaria e teria sua própria família para ajudá-lo nessa tarefa.

— Havia muita pressão — disse ele, em pé em um de seus pastos, com ovelhas circulando ao redor de seus joelhos. — O setor agropecuário na Alemanha é bastante conservador. — Ele falava em sua própria fazenda, com pouco mais de 40 hectares de pastagens verdejantes e carvalhos em Löhne, onde cria mais de 500 ovelhas, 35 delas carneiros resgatados com tendência à reprodução, além de possuir sua própria cardadeira para tratar a lã e prepará-la para envio à fiação.

Stücke sabia que era gay desde jovem, mas só se assumiu para os pais aos 24 anos. Quando o fez, acabou saindo da fazenda da família e indo trabalhar em uma fábrica de papel. Eventualmente, o interesse pelo ambientalismo o levou a começar sua própria criação de ovelhas. (As ovelhas ajudam a manter a saúde do solo usado para o cultivo de grãos.) Suas aventuras na criação o levaram a descobrir o destino dos carneiros não reprodutores e, em 2021, uma conversa com uma amiga, Nadia Leytes, os levou a fundar a Rainbow Wool.

— Estávamos conversando sobre ser gay e o que isso significa — disse Leytes, que trabalha em relações públicas no grupo de agências de publicidade Serviceplan. — E eu perguntei a ele se existiam animais gays e, em caso afirmativo, o que acontecia com eles? — Logo eles estavam tentando encontrar alternativas ao matadouro.

Então Stücke teve uma revelação: os carneiros têm uma vantagem que as ovelhas fêmeas não têm.

— Quando as ovelhas fêmeas engravidam, a produção de lã para — disse Leytes. — Mas a dos machos nunca para. — Ela e Stücke pensaram que a lã deles poderia ser uma oportunidade de negócio. Mesmo que, no início, a comunidade agrícola tenha considerado a ideia “controversa”, disse Stücke, e tenha zombado delas.

Tudo começou com três ovelhas. Agora, elas têm um porta-voz — Bill Kaulitz, vocalista da banda Tokio Hotel e influenciador digital alemão —, uma rede de matadouros e fazendeiros dispostos a vender seus carneiros não reprodutores e uma parceria com uma fábrica espanhola que transforma a lã em fios. (Como o rebanho é composto por diversas raças de ovelhas, incluindo Brown Mountain, Coburg Fox e Shropshire, a lã precisou ser tratada por uma fábrica especializada.)

Eles também possuem uma loja virtual que vende patches e bonés, cuja renda é destinada a instituições de caridade LGBTQ+, além de oferecerem patrocínios para ovelhas.

— É uma vitória tripla — disse Leytes. — A comunidade ganha, as ovelhas ganham, a fazenda ganha.

O que a Rainbow Wool não tinha até a entrada do Grindr, no entanto, era alcance global. Foi por isso que, em meados de 2024, Leytes contatou Pineiro, contando-lhe sua história. (Naquele momento, Stücke nunca tinha ouvido falar do Grindr.)

— Imediatamente pensei que precisávamos nos envolver nisso — disse Pineiro. O Grindr recrutou Schmidt, que visitou Stücke e suas ovelhas este ano.

Os dois homens criaram um laço por compartilharem a vida na fazenda — Schmidt também cresceu em uma família de agricultores, embora no Meio-Oeste americano — e pelo isolamento que sentiam por ser um jovem gay. Quando Stücke fala sobre a visita, ele se emociona. Ele costuma se emocionar ao descrever o apoio que começou a receber depois de anos se sentindo ostracizado.

— Significa muito para mim que alguém tão distante, tão famoso e vindo de um mundo tão diferente esteja reservando um tempo para visitar as ovelhas e fazer algo com a nossa lã — disse ele, enxugando os olhos.

Gladiadores, professores de educação física e um garoto da piscina

O que exatamente Schmidt decidiu fazer com a lã — todas as 30 caixas de fios que chegaram da Alemanha — pode ter surpreendido Stücke.

— Eu realmente queria explorar a temática gay — disse.

Ele estava sentado em seu estúdio em Los Angeles, um galpão que parecia uma mistura de oficina de metaleiro com o departamento de figurinos do MGM Grand. Vestia uma camiseta desbotada do INXS e calça jeans preta, com várias pulseiras de prata cravejadas em cada pulso. Em uma parede, caixas de cristais; em outra, chaves inglesas e alicates de corte. Diversos pôsteres de seus clientes famosos usando suas criações estavam espalhados pelas paredes.

No andar de cima, há uma espécie de escritório estilo loft onde Schmidt guarda algumas de suas peças favoritas, como o look de fada techno que ele criou para Doja Cat usar em sua apresentação no encerramento da recente celebração da Vogue World, embora muitas estejam no museu da Swarovski na Áustria ou em museus de verdade. O Museu de Arte do Condado de Los Angeles, por exemplo, possui o vestido impresso em 3D que Schmidt criou para Dita Von Teese em 2013, que por acaso foi o primeiro vestido totalmente articulado impresso em 3D já feito.

Agora, ao lado dos vestidos de coquetel metálicos, havia um cabideiro com várias peças de tricô. Com carta branca para o desfile, Schmidt decidiu se concentrar nos arquétipos gays mais clichês: o garoto da piscina, o professor de educação física, o astro do rock. Cada peça, incluindo as sungas estilo Speedo nas cores vermelha, branca e azul, foi tricotada à mão por Schmidt e Suss Cousins ​​(autora de Hollywood Knits) ou, no caso de acessórios como uma espada de gladiador e uma pizza de entregador de pizza, feita em crochê. Se o Village People fizesse sua própria versão de “Magic Mike”, seria algo assim que eles usariam.

— As pessoas tendem a reparar em coisas que são sensuais — disse Schmidt. — Elas são atraídas por isso, especialmente se houver humor envolvido. Então eu pensei: 'Bem, essa é uma boa maneira de chamar a atenção, o que leva à história.

O conceito é exageradamente kitsch, mas se você deixar de lado a história e se concentrar apenas nas peças de roupa, o que você vê é essencialmente uma linha de polos de malha, shorts e roupões com um toque preppy. Uma linha com potencial comercial. As roupas funcionam tanto como figurino — Pineiro disse que o Grindr pode levar as peças originais em turnê no próximo ano — quanto como produto. Schmidt disse que estava considerando mostrar algumas peças aos compradores da Maxfield, a boutique de luxo de Los Angeles, e vender outras em seu próprio site de e-commerce, com a renda revertida para a fazenda. (Ele já patrocina um carneiro.)

— É uma lã muito boa e resistente — disse Schmidt. — Tem um toque agradável e luxuoso, e é muito macia ao toque.

No mínimo, Schmidt espera que, ao divulgar a informação, os agricultores de diferentes países se inspirem a adotar a abordagem de Stücke e a resgatar seus próprios rebanhos que, de outra forma, poderiam ser enviados para o matadouro.

— Este é o momento de defender os direitos humanos e os direitos dos animais — disse Schmidt. —Estamos vivendo um período realmente difícil.

E embora o próprio Stücke não esteja presente na apresentação da coleção (seu marido foi diagnosticado com câncer há alguns meses e ele precisa ficar com ele na Alemanha), o desfile praticamente transmite sua mensagem por si só. Seu título: “Eu sobreviverei”.

https://oglobo.globo.com/mundo/epoca/noticia/2025/11/20/carneiros-gays-sao-salvos-do-abate-por-projeto-de-estilista-de-famosas-com-colecao-de-trico.ghtml

Thursday, November 20, 2025

20 de novembro de 2016

O mundo, de maneira nenhuma, nem nunca, corresponde à binariedade do Facebook. Pão, pão, queijo, queijo, aquilo e não aquilo outro, macho, fêmea, claro, escuro, isso apenas não existe. Durante 3 anos, todos os dias, sem faltar um único sequer, li e postei procurando escolher uma perspectiva - e não duas - sobre as pautas que a rede apresentou. Não se tratou de "achatar" a realidade, ignorando os múltiplos planos que inevitavelmente a compõem. Foi o esforço de adotar um ponto de vista para ser visto. Em política, vale a posição que se assume. Não há espaço, na política, para o "que se tem em mente". A mente é lugar do incomunicável, do íntimo que não se acessa. A política, ao contrário, é das praças, do público. E só a posição que se assume traduz o íntimo do "actante" político. Todas as vezes que me meti a tirar chinfra de dialético, o Facebook trouxe, na mesma hora, alguém pra pegar um dos elementos da antítese proposta, eleger como o "meu equívoco" e, ato contínuo, abduzir o debate para um dos dois pólos e matar a análise. 'Dia' de dialética, é o mesmo 'dia' de diálogo e diabo. O amigo inconveniente, no entanto, é que estava certo. Política não é análise. Mas, divago.

Assumir a posição inegociável de "dilmista", que é o que eu vinha dizendo, tomei como principal atitude desde as Jornadas de Junho de 2013, foi o modo de comunicar que, entre todas as facetas do cubo mágico insolúvel da conjuntura Brasil, aquela - e não outra - era a que eu escolhi como a melhor. O lugar unívoco, não ambíguo, é o corolário da política. Pois a política é a invenção humana que institui a presença do outro. Fora da política, o outro é o bárbaro. É o invasor. A política, enquanto espaço de disputa, legitima a existência do outro. Instaura o respeito. Por tudo isso, desmisturar é fundamental para a prática política. O mundo permanece dialético. Contraditório. Irredutível ao "um". A política não muda o mundo. A política estabelece consensos transitórios. Tensos porque fugazes.

Houve, no entanto, uma mudança. Nosso mínimo arcabouço institucional voltou ao pó de onde viera. As pequenas conquistas derivadas do frágil pacto advindo da Constituição Cidadã de 1988 estão, Deus queira momentaneamente, suspensas. Aqui tudo parece que é ainda construção e já é ruína. Por isso, tudo que não seja o pasmo, hoje soa, a meus ouvidos, farsa. Hashtags me dão no saco. Previsões, mesmo as mais obviamente apocalípticas, parecem negacionismo. O que prever, diante do caos? Como assumir posição em terreno movediço? Como "tocar a bola pra frente", se as regras do jogo foram abolidas?

Poderia esticar esse textão até transformá-lo na diatribe mais inócua de todos os meus domingos ensolarados lá fora, mas não há mais nada que eu tenha a dizer a mais. Nenhuma "chave de ouro", frase bacana, conclusão, nem pós-vendas. É aqui, no lugar suspenso dos apalermados, que me encontro. Quer dizer, perdido.

Friday, November 14, 2025

14 de novembro de 2018

Não parece tão complicado. Nós fomos derrotados porque o terço dos eleitores que fica ao Centro com leve tendência à esquerda foi parcialmente capturado pelo bolsonarismo. O terço que fica ao Centro e se inclina à Direita, esse se voltou inteiramente para o bolsonarismo. Esses votos iam, em grande parte, para o PSDB. Com o desmanche dos tucanos a Centro-Direita adernou pro lado do atraso. O pedaço do espectro que se inclinaria pra esquerda não veio inteiro pro nosso lado, como nas eleições de 2002 a 2014, porque o Edir Macedo puxou pro polo oposto. Dilma e Lula se desdobravam para conseguir votos evangélicos porque tinham plena consciência de que parte decisiva da população brasileira está cada vez mais conectada aos cultos neopentecostais. Sem eles, Lula e Dilma sabiam muito bem, ninguém ganha eleição no Brasil. A guerra híbrida via WhatsApp teve papel decisivo, mas o que está na base do resultado é um fato aritmético: o campo democrático, ou progressista, padece da falta de eleitores. Somos poucos. O 'lulismo' atacava a questão de frente: é preciso aglutinar forças. 'Edir Macedo' é, aqui no texto, linguagem figurada. O todo pela parte. Conseguir voto no Brasil é convencer os pobres a comparecerem às urnas. Quem está mais perto dessas populações tem mais chances de convencê-las. E as igrejas evangélicas estão. Lula e Dilma sabiam disso. Por isso pactuavam. Para em seguida agir como anteparos à voracidade de eventuais vendilhões do templo. Fala-se muito em retorno às bases, mas deixa-se de lado que o PT só ganhou eleições para presidente quando trouxe para si os votos de milhões de brasileiros que não se interessam por trabalhos políticos de qualquer natureza. A igreja tem papel decisivo neste estado de coisas. Estamos falando de um país com mais de 200 milhões de habitantes. O eleitor que pode ser classificado 'de esquerda', é provável, não alcança a casa das dezenas de milhões. Uma piada dos anos 80 dizia que caberíamos todos em duas, ou três kombis.

14 de novembro de 2018

A defesa do 'retorno' do PT às bases precisa necessariamente explicitar a que 'bases' se refere.

Em 1989 o partido tinha como eleitor 'padrão' o trabalhador especializado dos grandes centros urbanos. Metalúrgicos e bancários, por exemplo. CUT e MST, tinham, respectivamente, 6 e 5 anos de existência, eram recém-nascidos. Existiam e atuavam, também, na época as Comunidades Eclesiais de Base, que não eram petistas em sentido estrito. Acrescente-se aí as juventudes estudantis e os intelectuais formadores de opinião. Era esse perfil complexo que puxava os proverbiais 30% de fidelizados cada vez que se abriam as urnas.

Na virada do século XXI os Fóruns Mundiais acrescentaram ao PT marcas importantes que associariam sua imagem à dos chamados movimentos populares que ganharam força a partir da Constituição de 1988 e da chegada do Terceiro Setor. Claro que essa configuração fez crescer ainda mais o PT, que também teve tempo para ganhar e administrar importantes capitais. Ao mesmo tempo, CUT e MST evoluíam a passos largos.

Todos esses grupos de militância estiveram presentes na fabulosa festa da posse de Lula em janeiro de 2003. Mas, antes disso, o PT havia sido derrotado por Fernando Collor e duas vezes por Fernando Henrique Cardoso (em primeiro turno).

Foi preciso a 'Carta aos Brasileiros' para que o projeto dito 'de esquerda' durante duas décadas fosse aceito majoritariamente pelos brasileiros em disputas presidenciais. Antes disso, estava claro, as bases não eram suficientes para levar Lula, nem o PT, ao Planalto.

Lula, como se sabe, foi reeleito com certa folga e saiu da presidência com mais de 80% de aprovação. Seu 'poste', Dilma Rousseff, nadou de braçada todo o primeiro mandato. Na crista de uma onda benfazeja na economia? Sem dúvida. Mas também operacionalizando um largo arco de alianças que, fundamentalmente, consistia em garantir os votos do eleitorado conservador liberal, o chamado 'centro' do espectro. A conta é simples. 30% dos eleitores são fiéis ao PT, 30% querem ver o PT e todos os petistas pendurados pelo pescoço e 30% formam um grupo a ser permanentemente disputado.

Não há trabalho de base a ser feito em relação a esse último pedaço do eleitorado. Trata-se de cidadãos de perfil conservador e que já têm seus referenciais políticos e sociais definidos. Esse grupo vai à Igreja. Mas não necessariamente 'obedece' ao pastor. Pode votar no PT, mas se identifica mais com o PSDB. Ao articular alianças de amplo alcance, Lula tirou votos dos tucanos que, vendo-se em queda acelerada, abraçaram a Direita. O resultado é que foram tragados por ela ao pretenderem dirigir um golpe para o qual não tiveram coragem de dar o rosto.

Se, 'voltar às bases' significa fortalecer os movimentos sociais e implementar ações que remetem às Comunidades Eclesiais de Base para atuar num campo de oposição que entende a disputa democrática para além das eleições (como propõe, por exemplo, o professor Luiz Felipe Miguel), a ideia de 'retorno' se aplica e pode ser muito oportuna.

Se o assunto for ganhar a presidência em 2022, estaremos falando de uma base que sempre deu consistência ao projeto do partido, mas que não decide eleição. A articulação que levou Lula e Dilma quatro vezes sucessivas ao governo dava prioridade a concorrer em condições de vitória e, para isso, precisava se congregar com forças sociais e eleitorais que podem ser, e muitas vezes são, estranhas à ideologia do PT.

O que há, e isso parece ainda não estar claro nas análises pós-tsunami bolsonarista, é uma nova base, essa sim, eleitoral, e não ideológica, surgida nos estados beneficiados pelas políticas de valorização dos salários, distribuição de renda e investimentos no setor produtivo e na infra-estrutura. Não se trata de 'retornar' e sim de consolidar essa base. E também não tem nada a ver com 'educação política'. A vida dessas populações se transformou no período Lula e Dilma. Essa transformação já resultou em vitórias acachapantes dos candidatos do campo democrático e popular. O assunto, no caso, é: o que será preciso fazer para que esse ciclo virtuoso não se interrompa? Ou em outras palavras, quem, eleito, pode se colocar a favor dessa nova realidade que o reacionarismo brasileiro quer destruir?

Wednesday, November 12, 2025

12 de novembro de 2018

Se o general Viddas Boas tá falando em público sobre esse tal de 'limite' da intervenção, imagine os papo que rola nas internas!

Eu sou um dos caras mais zé ruelas que eu conheci na vida. Sem dinheiro no bolso, sem parentes importantes, blá-blá-blá e sem condições psíquicas de entender como é que se produzem conspirações, tráfico de influência, bem-bolados, acordos, negócios e outras mumunhas mais. Resultado: sou uma desautoridade desconstituída. Nem o cachorro do vizinho dá atenção pras minhas ordens. 

Por exemplo: eu não consigo me interessar por entender como o PT se divide em facções, digo, tendências. Eu sei que elas existem. Que são fundamentais para a vida do partido. Sei mais ou menos quem, entre os mais famosos, anda com quem. Mas é até aí que eu vou. Senso prático: aprendi, durante o impeachment, a não contar com o Rui Falcão. Não vi necessidade de saber nada sobre as disputas internas do PT para perceber que dali não sairia coisa alguma.

Diferente eu vejo a Gleisi Hoffman agora. Daqui daonde observo ela é a representação cristalina de um grupo que pegou pra si a tarefa que, salvo engano, é a mais necessária para o campo democrático no Brasil atual: garantir a integridade física e política do presidente Lula e lutar por sua liberdade. Que não é nada menos do que lutar pela integridade da República. 

Lula é o maior líder popular da história do Brasil. Talvez o mais importante da América Latina. Sem dúvida um dos maiores do mundo. Lula está preso. De modo inequivocamente injusto e partidarizado. Gleisi, sempre que aparece, está, de alguma forma, noticiando que segue em vigília, dedicando-se em tempo integral à integridade do Lula.

Pode ser que, nas internas, Gleisi não seja nada disso e defenda interesses escusos, talvez o próprio Lula seja o oposto do que pensamos. Para o que estou dizendo, isso é indiferente. Os números da eleição não deixam dúvida sobre a importância de Lula para o Brasil. E a presença de Gleisi tampouco. Ela, goste-se ou não, é quem não deixa esmorecer o entusiasmo. É imperativo tirar Lula da cadeia e provar sua inocência.

Me pergunto sempre por que foi que as lideranças do campo democrático não foram até as últimas consequências no momento de impedir o ataque à democracia e à República que foi o processo de impeachment de Dilma Rousseff. Declarações como a do general Viddas Boas ajudam a pensar melhor o problema. Se em público ele admite que o Exército poderia intervir para que um habeas corpus não desse a Lula a liberdade, imagina o que esses caras não falaram por telefone, ou mandaram dizer através de emissários!

Inside information é pra quem pode, não é pra quem quer. Eu não posso e nem quero. Mas admiro quem tem. É quase obrigatório munir-se de boas e sigilosas fontes para desenvolver certos trabalhos jornalísticos. Quem é da lida partidária também não pode viver sem elas. Diferentes são os oráculos de Facebook, adivinhando o passado em bolas de cristal que ninguém sabe onde guardam. Transformando grandes arcos históricos em tiaras coloridinhas do varejo de notícias dessa enorme rua 25 de Março que são as redes sociais.

Do meu ponto de vista zé ruela, a luta pelo #LULALIVRE tem uma cara. Multiconstruída, não há dúvida. Mas, nela, os traços da Gleisi Hoffman aparecem inconfundíveis.

Monday, November 10, 2025

10 de novembro de 2016

Sendo melhor, igual ou pior que a Hillary Clinton, Donald Trump é um representante da chamada "Extrema Direita". Fenômeno com o qual ainda não tivemos que lidar para além do histrionismo de figuras que se fantasiam com roupas do exército brasileiro, saem em passeatas de meia dúzia, ou postam vídeos caseiros constrangedores. O que NÃO quer dizer que NÃO estejam em ascensão pelo mundo afora. A França, por exemplo, tem a Marine Le Pen. Se alguém não notou, ela foi a primeira a faturar na mídia comemorando a vitória do alaranjado maluco. Aqui foi o Bolsonaro quem sacou de imediato o potencial que o "alinhamento" à gestão Trump tem para alavancar seus planos eleitorais. O brasileiro, para os EUA, agora, mais que nunca, é apenas um "porco latino" a mais? Of course, my horse. Mas quem disse que a turma do Bolsonaro sonha em ir pra Miami lavar pratos? A Extrema Direita é nacionalista. O barato dessa gente (diferentemente do coxa-creme Ralph Lauren que sonha em viver na gringa) é permanecer no lugar de origem, só que dando as ordens. Ou melhor, dando porrada em quem "subverter" a ordem. Xenofobia, racismo, misoginia, sexismo, ódio de classe, homofobia, violência, tudo isso que compõe a base das sociedades patriarcais do Ocidente e que tem permanecido sob relativo controle desde os pactos universalizantes do pós-Grandes Guerras, lateja a cada dia com mais força, querendo vir à luz. Diferentemente do mero conservadorismo, a Extrema Direita substitui o regramento institucional pela ordem da horda. Não à toa, Bolsonaro é um clã. Assim como os Le Pen. Os Bush do Texas, os Clinton do Arkansas, os Neves de Minas Gerais, ou os Dória da Bahia, formam famílias também, mas nenhum pode ser rigorosamente classificado sob o rótulo "Extrema Direita". É uma completa perda de tempo, nessa discussão, elencar os prejuízos que Bushs, Clintons, Neves ou Dórias causam ao mundo. Disso ninguém duvida. Bobagem igual é imaginar que o Brasil sob Temer terá qualquer relevância no xadrez geopolítico planetário. No limite, é verdade, pra nós não muda nada, se Trump, ou Hillary. A novidade é que, desde ontem, os vermes que infestam as caixas de comentários dos portais da internet all over the world têm um presidente americano pra chamar de seu. Empoderaram o lúmpem. Daí não pode vir nada bom. No país da "cordialidade", do "patrimonialismo", do controle social genocida, o que menos precisamos é de Bolsonaros a mais. Já os temos de sobra. E, no entanto, eles estão se multiplicando. "Give me a break". Não há nenhuma justificativa para minimizar esse enorme problema.

Sunday, November 02, 2025

2 de novembro de 2018

Mudando o mood, saindo um pouco do deboche, é evidente que a eleição do Bolsonaro acendeu em todo mundo o temor da tomada do poder pelo Exército brasileiro (em algum tipo de combinação mais ou menos explícita entre FFAA e setores da sociedade civil). Pois eu tenho um palpite. O Exército, em sentido estrito, vai permanecer 'na dele'. Uma, porque nada indica que teremos ações de resistência que venham a justificar o chamamento de soldados; outra porque já temos tudo o que é necessário para viver em estado de exceção, próximos à experiência de uma Ditadura. E se chama Polícia. Aliás, nos períodos mais tenebrosos de Hitler e Stalin (e regimes totalitários posteriores), a rotina da repressão sempre esteve a cargo da polícia, não do exército. Hannah Arendt se refere constantemente a um 'Estado Policial': a autoridade que tem poder para gerenciar, quarteirão a quarteirão, as delações, as propinas, a vigilância, os enquadramentos, o uso seletivo da violência. Nas periferias essa é a lei vigente desde a invenção da Polícia Militar. Recomendo a leitura de O Crime pelo Avesso: gestão dos ilegalismos na cidade de São Paulo, da professora Alessandra Teixeira. É aterrador, mas muito instrutivo. Aquilo que para as populações pobres do Brasil é claro como a luz do dia, pode estar chegando ao centro do poder político de uma maneira para a qual a esquerda, fenômeno de classe média, não está preparada. Neste contexto, claramente autoritário, os bate-paus por excelência dos governos são as polícias. E se no Exército Bolsonaro será eternamente um oficial de baixa patente e, portanto, passível de, a qualquer momento, ser rejeitado, entre as polícias, tem ficado nítido, ele é ídolo. Com a figura de um Ministro da Justiça 'justiceiro', temos a 'tempestade perfeita' se armando sobre a frágil democracia brasileira.