Thursday, February 22, 2024

22 de fevereiro de 2020

O Golpe de 64 foi civil militar. Isso significa que as FFAA cumpriram seu papel, mas não estavam sozinhas. Trabalharam em parceria com as oligarquias.

O Golpe do Impeachment, nesse aspecto, foi idêntico, com alguma inversão de papéis entre militares e civis.

A ascensão de Bolsonaro ao Planalto, por fim, apenas repetiu o 'grande acordo nacional' forjado em 2016.

O Golpe de 64 foi civil militar. Isso significa que as FFAA cumpriram seu papel, mas não estavam sozinhas. Trabalharam em parceria com as oligarquias.

Se Bolsonaro tem intenção de fechar o regime por meio da força bruta de Exército, polícias e milicianos, das duas, uma: ou conta com o apoio das oligarquias, ou fracassará.

Caso venha a fracassar, não será sem derramamento de sangue. Mas estará restrito a uma aventura, coroamento da absoluta falta de perspectivas de um líder tão fisiológico que parece nem ter cérebro.

Se, no entanto, um endurecimento do regime fizer parte dos planos das elites brasileiras, empoderando polícias e milícias, o horizonte deixa de ter qualquer visibilidade.

Não há nenhum encadeamento lógico que leve à necessidade de instalar uma Ditadura no Brasil. O povo é dócil, as oposições estão enfraquecidas, as grandes lideranças sob impedimento, as classes médias cada vez mais ilhadas em suas fantasias de participação no jogo político. Tudo indica vitória do campo conservador este ano e em 2022.

Mas a lógica deixou de ser algo com que se possa contar nesse país. Um Narco-Estado miliciano, anômico, desigual e miserável é o cenário de distopias já vividas em países vizinhos de nuestra América. Boa parte desse cenário já é o que às periferias são submetidas há décadas. Mas não está na Constituição!

Institucionalizar a barbárie tem ares de pesadelo.

Sorte nossa parecer improvável.

Pena não ser, de jeito nenhum, impossível.

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Na imagem: This Oct. 17, 2019 photo shows clouds of smoke from burning cars mar the skyline of Culiacan, Mexico. The Mexican city lived under drug cartel terror for 12 hours as gang members forced the government to free a drug lord. (AP Photo/Hector Parra)

Friday, February 16, 2024

16 de fevereiro de 2019

ABSOLUTO ESTRANHO

Com certo esforço, a revolta pelo asfixiamento do rapaz durante o horário comercial de um supermercado vai ganhando força na bolha branca de classe média letrada do Facebook. Há o caso de uma menina de 11 anos morta com um tiro no peito que passa quase despercebido. E fica cada vez mais apagada da memória 'em rede' a chacina do Fallet.

Os 9 jovens encurralados na casa da ladeira Eliseu Visconti em Santa Tereza tiveram seus corpos, nessa ordem, atingidos nas pernas, dilacerados com facas e coronhadas, antes de receberem 'rajadas de misericórdia' e serem transportados na caçamba de uma picape até o hospital mais próximo, onde oficialmente foram dados como mortos.

60 mil pessoas são assassinadas anualmente no Brasil. 93% das vítimas são homens; 76% são negros, jovens, moradores das periferias urbanas e trabalham nos postos mais baixos dos mercados criminais.

Como os 15 do Fallet Fogueteiro e do Morro dos Prazeres.

É esse, e não outro, o genocídio da juventude periférica a que se refere o Movimento Negro. Essas são as vidas ceifadas que as estatísticas escondem e o 'silêncio sorridente' de que falavam Gil e Caetano faz desvanecer, mas parte - pequena - da sociedade insiste em prantear.

A grande maioria deles não morre pelas mãos do Bope, da ROTA, ROTAM, etc. embora tenhamos as mais altas taxas de letalidade policial do planeta. Matam-se por conta própria, numa estranha guerra entre 'fraternidades' do crime.

A intuição genocida da Direita não deixa por menos: são bandidos. E bandido bom é bandido morto. Que se matem!

Mas como classificar como 'bandidos', ou 'traficantes', um cara de 15, um de 17 e outro de 18 anos, os três primeiros corpos identificados na chacina do Fallet?

Como negar a eles seus nomes, Vitor, Roger e Enzo?

Como explicar às mães dos três que eles não pertencem, segundo as regras sociais brasileiras, à categoria 'passível de luto'?

Como impedi-las de sofrer?

Enquanto o Brasil se negar a dar atenção às causas profundas que levam milhões de jovens ao crime, à morte e ao encarceramento, estaremos dando um salvo-conduto velado ao 'guarda de esquina', aos vigias sem controle do supermercado, aos milicianos, aos justiceiros e, por extensão, a toda sorte de violência doméstica, de crime de ódio, no limite, a toda e qualquer perversidade dos 'homens de bem'.

Uma sociedade que vê morrer mais de 50 mil jovens por ano e 'deixa por isso mesmo', está comunicando que a 'vulnerabilidade' inerente à vida, aquilo que faz com que qualquer animal de rebanho, como nós, se mantenha unido em busca de proteção, é problema dos 'outros'.

"Todas as formas de racismo, intolerância étnica, religiosa ou nacional fundam-se na tentativa de fazer do semelhante um igual, ao preço de fazer do diferente um absoluto estranho", disse Maria Rita Kehl em seu 'Sobre Ética e Psicanálise'.

O 'absoluto estranho' expurgado da vida coletiva tem o dom de retornar. Tem o poder dos espectros. O feitio das sombras.

É a própria sociedade, silenciosa ou sorridente, quem paga, no 'acerto de contas', a fiança dos matadores.

https://ponte.org/artigo-isso-se-chama-genocidio/?fbclid=IwAR2UkYpcweGEVsaT1VxZFg8i7jgGarvoRFSsi1lMqdNokYgG2uoVvVQunBA

imagem: Natasha Neri para ponte.org

Tuesday, February 13, 2024

13 de fevereiro de 2020

Programa CASA DA MÃE JOANA MINHA VIDA

Guedes confirmado como ministro chefe da Casa Grande; Araújo continua fora da casinha.

Damares tem ideia fixa com acasalamento; Wajngarten só trabalha com venda casada.

Weintraub não faz o dever de casa; Olavo manda instruções do home office.

Salles finge que não sabe que a Terra é a única morada de que dispomos.

Caserna. Nem nos tempos da Ditadura tantos milicos habitaram o Executivo.

Flávio B. lava dinheiro comprando imóveis; Duda B. enxovalha a Casa do Povo; o B. sonha em morar no canil do Trump.

Adriano foi executado numa casinha de sítio na Bahia; Queiroz tem endereço fixo em SP; Carluxo estava no Vivendas da Barra enquanto Ronnie e Élcio se preparavam para sair e matar Marielle.

O Moro? É o capanga. O porteiro. O vigia.

Aqui tudo parece que é ainda construção e já é ruína.

💧

imagem: Lula Marques

Monday, February 12, 2024

Professor @SamuelBraun no X Twitter

12/02/2024 (Quando todos os olhos estão voltados para o Rio)

"Esse é o mapa de parte da cidade do Rio de Janeiro. Em contorno vermelho parte de Jacarepaguá, Guaratiba e toda a Barra da Tijuca, aproximadamente a área de Gaza (365km2).

Nessa área no Rio moram cerca de 900 mil pessoas. No mesmo espaço, em Gaza, 2,5 milhões.

Israel ordenou que a população de Gaza fosse evacuando todo território e sendo comprimida na fronteira sul, mais ou menos na faixa que pintei de vermelho.

No Rio essa área corresponde ao sub-bairro do Jardim Oceânico, na Barra da Tijuca, onde residem cerca de 30 mil pessoas.

Em Gaza, corresponde ao sul, onde está a fronteira de Rafah com o Egito, que tinha pouco menos de 100 mil habitantes, mas atualmente abriga 1 milhão e meio de refugiados - a maior densidade demográfica do planeta!

Hoje Israel começou bombardeio por terra, ar e água contra essa região. Não há saída. Genocídio brutal, em área concentrada inédita na história. Ao vivo".

Samuel Braun 🇧🇷🇷🇺🇮🇳🇨🇳🇿🇦

Prof. Politicas Públicas @UERJ_oficial

Sunday, February 11, 2024

Polícia no morro

 Transcrito de O GLOBO. 31/05/2022. Atualizado 05/08/2022.

O compositor Cartola no chão, diante de viatura, após ser agredido por policial — Foto: Eurico Dantas/Agência O GLOBO

Havia mais de 200 policiais na Ponte Osvaldo Cruz, perto da Ilha do Fundão, às 6h50 daquela sexta-feira, 20 de fevereiro de 1976. Todos achavam que participariam de alguma operação na Ilha do Governador, ali perto. Mas o ponto de encontro fora marcado naquele local da Zona Norte apenas para evitar vazamento de informações sobre a verdadeira missão a cumprir.

Por volta das 7h, a tropa recebeu ordens para tomar o rumo do Morro da Mangueira. O objetivo da chamada "operação arco-íris" era prender criminosos na favela vizinha ao bairro de São Cristóvão, mas a ação ficaria marcada por detenções sem justificativa e por agressões contra a família de Agenor de Oliveira, o compositor Cartola, que chegou a ser esbofeteado por um agente de segurança.

Antes de subir o morro, os policiais ouviram de delegados a orientação para tratar os moradores da favela "com a máxima urbanidade". Minutos mais tarde, começaram a efetuar prisões sem explicação. Eram tempos de ditadura militar. Todos que não tinham carteira de trabalho assinada no bolso eram logo amarrados uns aos outros, pelas mãos e o pescoço, e levados a camburões numa situação que lembrava o transporte de escravizados até o século XIX.

Moradores da Mangueira presos e amarrados pelo pescoço por não ter carteira de trabalho — Foto: Eurico Dantas/Agência O GLOBO

Filho de Cartola, Ronaldo Silva de Oliveira foi abordado e também estava sem carteira profissional. De nada adiantou dizer que era funcionário público. Alguém o apontara como motorista do assaltante Antonio Branco, bastante procurado na época. O filho do sambista até confirmou que havia dirigido para o bandido uma vez, mas só porque estava sob a ameaça de um revólver.

Rapidamente, moradores que acompanhavam a ação disseram que aquele era o filho do célebre compositor, algo que foi logo confirmado por Euzébia Silva de Oliveira, a Dona Zica, mulher do artista. Mas, em vez de ouvir a moradora, os policiais começaram a empurrá-la em direção ao camburão, com a intenção de levá-la junto.

Cartola foi chamado, mas o baluarte da Mangueira, então aos 69 anos, acabou levando uns tapas no rosto enquanto argumentava. A certa altura, um delegado tentou apaziguar os ânimos. O sambista, indignado com toda aquela situação, dizia que não podia admitir a agressão sob a justificativa de que "enganos acontecem".

Moradores amarrados pelo pescoço por não ter carteira de trabalho, na Mangueira — Foto: Eurico Dantas/Agência O GLOBO

Enquanto o compositor descia o morro em direção ao asfalto, para acompanhar o filho até a delegacia, alguns moradores cantarolaram versos da então recém-lançada canção Meninos da Mangueira (Sérgio Cabral e Rildo Hora), em que Cartola e Dona Zica são homenageados. O delegado recebeu o sambista em sua sala, na Delegacia de Vigilância Norte, cercado por curiosos. Horas mais tarde, Ronaldo Silva foi liberado sem nenhum pedido de desculpas a ele ou a ninguém da família.

De acordo com a reportagem d'O GLOBO publicada no dia 21 de fevereiro daquele ano, entre os 60 homens detidos durante a força-tarefa, apenas um tinha contra si uma condenação na Justiça. Os outros 59 presos se mostravam preocupados com a informação de que só seriam liberados depois do carnaval. Mas o diretor do Departamento Geral de Polícia Civil, Sérgio Rodrigues, que considerou a "operação arco-íris" um sucesso, garantiu que só ia ficar preso "quem estiver devendo".

Cartola conversando com delegado após operação abusiva na Mangueira — Foto: Eurico Dantas/Agência O GLOBO

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