Relatividade da Democracia
A declaração do presidente Lula, sobre a relatividade da democracia, provocou urticárias entre liberais de direita e de esquerda.
Se fosse absoluta, a democracia seria um regime modelar. Ou seja, haveria um modelo padrão - a democracia ocidental e liberal - que serviria de métrica para todas as nações. Todos os sistemas políticos estranhos a esse modelo seriam, por óbvio, antidemocráticos.
Mas essa universalização do conceito de democracia é somente um aleijão histórico, situado entre o arsenal ideológico da hegemonia burguesa e a rendição teórica de setores da esquerda à pressão exercida pelo pensamento liberal.
Não se trata apenas de situar a democracia no terreno da luta de classes, o que pressupõe qualificá-la como burguesa ou socialista, para identificar a quais objetivos e interesses serve determinado regime político.
Tampouco é suficiente contextualizar os diferentes sistemas, para diferir os que estão integrados ao sistema imperialista, livres de ameaças e sanções externas, daqueles que estão submetidos a toda sorte de agressões e bloqueios.
O truque principal do discurso liberal é a confusão proposital entre democracia e liberdade, como se a essência da questão democrática estivesse nos direitos políticos formais.
Liberdade e democracia
Democracia é o poder do povo. Diz respeito às condições econômicas, sociais, educacionais e organizacionais para que a maioria possa governar uma nação. Quanto maiores as liberdades que esse sistema puder usufruir, melhor. Mas não é a dimensão da liberdade que determina a existência ou não de um regime substantivamente democrático.
Provavelmente não há país que goze de maiores liberdades formais que os Estados Unidos, a meca da democracia burguesa. Todo mundo, por exemplo, tem direito de formar partidos para disputar o governo ou de fundar meios de comunicação para influenciar a opinião pública. Mas não passa de uma garantia formal: apenas quem acumula enormes recursos financeiros é capaz de exercer efetivamente esse direito.
Embora ainda persista uma certa cultura comunitária, de participação social nas pequenas e médias cidades, a política norte-americana é essencialmente determinada pela plutocracia, isso é, a ditadura do dinheiro. Está circunscrita a instituições controladas pelo capital, como o parlamento e o Poder Executivo, com a imensa maioria da população excluída de qualquer processo decisório. A política é quase totalmente profissionalizada, com bilhões de dólares sendo necessários para realmente lutar pela direção do Estado.
Não é diferente a situação na Europa ou na América Latina, incluindo o Brasil. A democracia liberal oferece praticamente todos os direitos formais, em condições normais, mas apenas a burguesia pode integralmente acessá-los.
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Breno Altman, no Opera Mundi, 01 de julho de 2023
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