Tuesday, August 15, 2023

15 de agosto de 2022


Há um psicanalista inglês, de quem os brasileiros gostavam muito nos anos 80 do século passado, W.R. Bion. Ele, se eu entendi bem as leituras que fiz na época, está inserido numa linhagem que tem a Melanie Klein como principal figura.

O Bion, escrevo de memória, explicava que o psiquismo se 'vincula' aos objetos de três maneiras: pelo Amor, pelo Ódio e pelo Conhecimento.

Como ele escreve em inglês, mesmo nas traduções, aparece assim: vínculo L, vínculo H, vínculo K. Love, hate e knowledge.

Então, nosso mundo interior constrói vínculos com os objetos da vida amando, odiando e conhecendo-os.

O Bion, logo em seguida, avisa que os vínculos L e H não existem separados. Ninguém ama ou odeia algo ou alguém. Eros e Thanatos moram juntos. A gente só amodeia ou odeiama.

Mas - e é aí que o Bion é kleiniano - o inconsciente quer porque quer desgrudar o amor do ódio e vice-versa. E, assim, como o Barthes contou nos Fragmentos de um Discurso Amoroso, outro sucesso oitentista, vem a experiência da cisão, da fantasia de 'amor incondicional', ou 'ódio total', apartados e, portanto, sob controle (a questão de fundo, inclusive, é essa, o controle onipotente que o ego tenta exercer sobre os vínculos).

O que permite ao psiquismo 'reparar' os estragos das inexoráveis decepções amorosas ou odientas pelas quais passa, é o vínculo K. Quando a gente se dedica a conhecer o objeto e a reconhecer o que nos leva à vinculação, L e H podem, e só aí, ser vividos como complementares. Tudo o que parecia excluir-se mutuamente encontra lugar nos esforços de compreensão do objeto.

O Bion ainda diz que um dos indicadores da saúde psíquica é a capacidade que a pessoa tem de suportar momentos de 'zona cinzenta' sobre os vínculos. As dúvidas, as re-edificações mentais, os refazimentos. Love e Hate podem surgir como num passe de mágica. O Knowledge é sempre construído, demanda processos.

Eu fico imaginando o Bion, lá no céu dos psicanalistas, olhando a gente bater cabeça todo dia nessa terra plana esquizo-paranoide das redes sociais. Me dá uma vergonha...

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