29 de outubro de 2016
Vira e mexe tem alguém disposto a "nadar contra a corrente" no Facebook. Não é apenas rematada tolice. É sistemicamente inviável. Pois, veja que simples, não há "correntes" na world wide web. A metáfora de "rede", ou "teia", para descrever a internet é muito precisa. Trata-se de uma malha dotada de (não) orientação horizontal. O famoso "rizoma". Todos os pontos se equivalem até que, a partir de um deles, seja gerado qualquer conteúdo que replicado por inúmeros outros produza uma "mancha". A Internet se parece mais com um enorme painel de luzes que podem assumir as cores umas das outras. Pela equivalência dos pontos é mais ou menos como se experienciássemos o que em linguagem comum é conhecido como "colocar-se no lugar do outro". Os cristãos deram a essa experiência fundante do processo de humanização o nome de "compaixão" (padecer, ou passar, junto). A psicologia fala em "empatia". Os estudiosos da internet chamam as manchas de "cluster". Os músicos têm muita familiaridade com o termo cluster. É, por exemplo, o borrão sonoro que se produz apertando ao mesmo tempo várias teclas do piano com as palmas das mãos. As notas envolvidas tornam-se, no cluster, indistintas, só valem como elemento da "mancha". Há uma série de sucesso, sense8, que trabalha com a ideia de "empatia". Os personagens de sense8 têm o poder de se transferir uns para os corpos dos outros. sense8 é criação da mesma dupla de irmãs que produziu e dirigiu a trilogia Matrix. Aquele mundo conduzido pelas técnicas de dominação continua, no novo projeto das Wachowski, a ser desafiado por indivíduos que se somam, que se misturam em formas de manchas, que se traduzem uns aos outros. Que acendem uns aos outros, nós de redes, formando grafos de compartilhamento, compaixão e empatia.
Grafos produzidos pelo Labic UFES |
1 comment:
Comentário feito por mim mesmo ao post, na época:
"Empatia" e "compaixão" traduzem experiências de fazer próximo o distante. A síntese da compaixão cristã é o "amai o próximo como a ti mesmo". Ou seja, transferir para o "outro" aquilo que a gente naturalmente sente (por nós mesmos, ou por nossos consanguíneos). A empatia na psicologia é, por exemplo, parte da técnica do analista que, observando suas próprias reações, "adivinha" o sentimento ainda não verbalizado pelo paciente. Quer dizer, são experiências de identificação na alteridade. O oposto de falar para os, de antemão, semelhantes.
Mas fiz uma lista dos verbos que eu usei no post e eles são: gerar (conteúdo), replicar, produzir; assumir; colocar-se; transferir; desafiar; misturar; traduzir; acender; formar. Referem-se todos a ações. E acho que é disso que procurei falar. As semelhanças, ou diferenças, dos "pontos" da rede, ou seja, dos indivíduos, permanecem com eles (conosco). São as nossas ações que nos aproximam ou distanciam (a depender do contexto). Acontece que, na rede, só quando muitos replicam a mesma ação (se reproduzem, copiam, uns aos outros) é que os clusters se formam. Em resumo, sim, só falamos aos iguais. Mas não estamos tratando dos indivíduos ( e suas identidades) e sim da somatória de suas ações. No caso, de seus cliques. Um "Fica Dilma" não produz uma mancha com um "Fora Dilma". No entanto, nos dois casos, a mancha só se forma mediante muitos cliques. Um ponto de rede é praticamente nada.
Conversas entre surdos acontecem o tempo todo. Mas essa descrença na efetividade do diálogo que a vida na internet suscita na gente, acho, vem mais de um pressuposto que creio equivocado. A ideia de convencimento pela racionalidade. Que é a encenação básica dos "diálogos" socráticos ou platônicos. Nesses diálogos, alguém sempre conhece a "verdade", enquanto o outro tem a compreensão toldada pelo encadeamento "defeituoso" do raciocínio. No entanto, não é a "verdade" que conduz o que as pessoas escolhem para suas vidas. E sim seus subjetivos e intransferíveis valores.
Igual e diferente são "estados". São identidades semoventes. A depender de nossas ações, somos parecidos ou estranhos. A rede materializou esse fato da condição humana.
Post a Comment